Parlamentares recorrem à OMS para que velhice não conste na CID
Foto: Diogo Moreira/MCW/Governo de São Paulo/Reprodução/Agência Câmara de Notícias
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Nesta quinta-feira, 15, parlamentares e especialistas protestaram contra a inclusão da velhice pela Organização Mundial da Saúde (OMS) na mais recente atualização da Classificação Internacional de Doenças (CID), que entra em vigor no ano que vem. A avaliação é que o novo item pode relacionar velhice a doença, impedir o registro correto das causas de mortes e aumentar a discriminação contra a população em idade mais avançada. O protesto ocorreu durante audiência da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa e da Comissão Externa da Câmara dos Deputados, que examina políticas públicas para o envelhecimento saudável. Os debatedores pediram que a OMS reveja essa modificação.
A Classificação Internacional de Doenças, um conjunto de 55 mil códigos utilizados por profissionais de saúde, pesquisadores e formuladores de políticas públicas, passa pela décima primeira atualização. A proposta é substituir o termo senilidade (código R-54) por “old age” (código MG2A), que significa velhice.
Representante da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), braço da OMS para as Américas, Juan Escalante esclareceu que a CID não classificou velhice como doença, mas fez a inclusão porque a classificação agrupa fatores que influenciam a saúde. A intenção, segundo ele, foi substituir “senilidade” por um termo mais neutro, a partir da sugestão de especialistas.
“A CID 11 contém categorias que vão além das doenças e incluem lesões, achados de exames e motivos de contatos com o sistema de saúde. A CID 11 também fornece categorias e padrões para registrar situações em que não é possível um diagnóstico claro”, observou.
Políticas públicas
Foto: Gustavo Sales/Câmara dos Deputados
Mesmo com as explicações do representante da Opas, a inclusão foi criticada. Representante da Coordenação de Saúde do Idoso do Ministério da Saúde, Maria Cristina Hoffmann aponta que a alteração pode levar a registros nos atestados de óbito sem a garantia de investigar a causa real das mortes, o que prejudicaria a elaboração de políticas públicas.
“A confusão que pode causar ou a indução, mesmo sem ser este o objetivo, de profissionais em sociedades especialmente em que ainda predominam o estigma e o preconceito em relação às pessoas idosas não nos parece ser a melhor escolha”.
Vânia Herédia, da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), alertou para a possibilidade de perda de dados sobre a população idosa por falta de detalhamento, uma contradição frente aos avanços das políticas de envelhecimento ativo e à Década do Envelhecimento Saudável estabelecida pela própria Organização Mundial da Saúde.
Representante da Associação Médica Brasileira (AMB), a geriatra Ivete Berkenbrock destacou o cuidado que o médico deve ter ao acrescentar um código novo na Classificação Internacional de Doenças.
“A nossa responsabilidade como médico ao colocar um CID é a mesma ao colocar uma assinatura num atestado, numa receita, numa prescrição, porque nós estamos codificando aquela pessoa para ser encaminhada para um tratamento, para uma licença de trabalho, para um afastamento, para uma incapacidade para o seu trabalho ou não”.
Resistência do Brasil
Foto: Gustavo Sales/Câmara dos Deputados
Presidente da Comissão do Idoso, o deputado Dr. Frederico (Patriota-MG) anunciou que o colegiado vai formalizar o pedido para que a Organização Mundial da Saúde reveja a inclusão da velhice na CID. O representante da Opas, Juan Escalante, ressaltou que a agência está aberta à discussão do tema. A deputada Leandre (PV-PR), que pediu a realização da audiência, resumiu a opinião dos debatedores.
“Tenho certeza que o senhor levará daqui muitos subsídios mostrando a contrariedade do Brasil, que não tem dúvidas da boa fé dessa revisão da CID, porém, essa inovação, trazendo a velhice dentro de suas classificações, aqui no Brasil terá uma grande e forte resistência”.
O geriatra Alexandre Kalache sugeriu a formação de um comitê, com a participação do governo e da sociedade civil, para discutir a mudança. Ele lembrou que a morte recente do príncipe Philip, da Inglaterra, aos 99 anos, foi registrada como velhice no atestado de óbito.