À espera de um transplante, morre Rochelle Benites
Foto: Igor Sperotto
Morreu no início da tarde desta quinta-feira, 19, Rochelle Fraga Benites, 42 anos, uma das 2.172 pessoas na lista de espera por transplante no Rio Grande do Sul e uma das 45.664 do país. Tinha Histiocitose X, uma doença autoimune que atacou seus dois pulmões e a levou à lista de transplante duplo há três anos. Rochelle deixa três filhos, Júlia, 11 anos, Murilo, 15, e Mateus, 17.
Entusiasta dos esportes, jogava futebol e andava de skate, Rochelle Benites passou a depender 24 horas de um cilindro de oxigênio a espera do transplante.
Ao descobrir na pele as dificuldades enfrentadas pelos pré-transplantados, da negativa familiar para a doação à falhas no processo médico-hospitalar, assumiu a militância da causa, dando visibilidade à realidade de milhares de pessoas na lista de espera no Brasil. Fez um curso de extensão na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) para aprender mais sobre o tema, criou o projeto Vida em Jogo, que levou para estádios de futebol pacientes e médicos para sensibilizar as torcidas para A doação de órgãos, se engajou com a Frente Parlamentar de Doação de Órgãos e passou a fazer lives regulares nas redes sociais com a participação de autoridades no assunto.
Foto: Igor Sperotto
“Conheci a Rochelle no ano passado quando ela me convidou para fazer uma live sobre transplante de pulmão. Uma mulher muito determinada. Ela criou um grupo, buscou instigar e motivar o transplante mesmo num ano e em um momento super difícil para todos que foi o da pandemia. Eu a conheci e passei admirar e festejar esse lado dela. Com a perda da Rochelle perdemos uma paciente e uma amiga, que tentou melhorar o processo do transplante e nos transformar em pessoas melhores. Que nos sirva de motivação para avançarmos”, declara o médico Spencer Camargo, cirurgião torácico do Hospital Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre.
Rochelle foi uma guerreira do coletivo. Lutou pelo atendimento prioritário aos pré-transplantados nos hospitais, emergências, nos bancos, para que não faltasse medicação na farmácia do estado e, fundamentalmente, para um melhor planejamento e organização da Central de Transplantes do Rio Grande do Sul na captação de órgãos e no treinamento de médicos e enfermeiros, considerado por especialistas da área como um dos maiores problemas do processo da doação ao transplante.
Em entrevista ao Extra Classe no ano passado sobre a suspensão dos transplantes no Rio Grande do Sul em função da pandemia revelou sua apreensão: “Tem muito despreparo em alguns hospitais para lidar com as pessoas que precisam de oxigênio. A gente não tem prioridade no atendimento. A sociedade não está pronta para acolher o paciente em risco. E 1% da população é transplantada”.
“Uma mulher corajosa, uma guerreira, braba, destemida, frágil, amava a vida, a Júlia, o Murilo, o Mateus e o mar”, expõe Glaci Borges, coordenadora do Cultura Doadora da Fundação Ecarta, projeto do qual Rochelle era parceira. “Por ela, estaria aqui com a gente, dando depoimentos, fazendo lives, forte, potente, bonita. Mas não deu. Ela descansou. Estava exausta. Vai fazer muita falta. A causa perde uma militante e eu uma amiga”.