Amazon censura troca de mensagens entre funcionários
Foto: Visualhunt
A multinacional de tecnologia norte-americana Amazon anunciou que passará a bloquear e sinalizar postagens de funcionários em um aplicativo de mensagens interno contenham palavras-chave pertencentes a sindicatos, de acordo com documentos internos da empresa.
De acordo com reportagem assinada por Ken Klippenstein no portal The Intercept nos EUA, um monitor automático de palavras também bloquearia uma variedade de termos que poderiam representar críticas potenciais às condições de trabalho da Amazon, como “trabalho escravo”, “prisão” e “plantação”, bem como “banheiros”. Este último termo remete a relatos sobre funcionários da empresa obrigados a urinar em garrafas para cumprir cotas punitivas.
“Nossas equipes estão sempre pensando em novas maneiras de ajudar os funcionários a interagirem uns com os outros”, disse a porta-voz da multinacional Barbara Agrait. “Este programa em particular ainda não foi aprovado e pode mudar significativamente ou até mesmo nunca ser lançado”, desconversou.
De acordo com o Intercept, em novembro do ano passado a empresa convocou uma reunião de alto nível na qual seus principais executivos discutiram planos para criar um programa interno de mídia social que permitiria aos funcionários reconhecer o desempenho dos colegas de trabalho com postagens chamadas “Shout-Outs”.
O principal objetivo do programa, segundo o chefe de negócios de consumo mundial da Amazon, Dave Clark, era reduzir o atrito dos funcionários, “promovendo a felicidade” entre os trabalhadores e para aumentar a produtividade. Os Shout-Outs seriam parte de um sistema de recompensas gamificado no qual os funcionários recebem estrelas virtuais e distintivos por atividades que “agregam valor comercial direto”, segundo documentos obtidos pela reportagem. Na reunião, Clark comentou que “algumas pessoas são colecionadores de estrelas insanos”.
Mídias sombrias
Internamente, os funcionários da Amazon emitiram um alerta para o que chamam de “lado sombrio das mídias sociais” e passaram a monitorar ativamente as postagens para garantir uma “comunidade positiva”.
Na reunião do alto escalão da empresa, Clark sugeriu que o programa se assemelhasse a um aplicativo de namoro on-line como o Bumble, que permite que os usuários se envolvam um a um, em vez de uma plataforma mais parecida com um fórum como o Facebook.
Segundo o Intercept, após a reunião, foi criado um “monitor automático de palavrões”, uma “lista negra” que sinalizaria e bloquearia automaticamente os funcionários de enviar uma mensagem que contenha palavras-chave “profanas” ou inadequadas.
Além de palavrões, no entanto, os termos incluem muitos relevantes para o trabalho organizado, incluindo “sindicato”, “reclamação”, “aumento salarial” e “compensação”. Outros termos proibidos são “ética”, “injusto”, “escravo”, “mestre”, “liberdade”, “diversidade”, “injustiça” e “justiça”. Até mesmo frases como “Isso é preocupante” seriam banidas. De acordo com o documento que resume o programa, o texto livre representa um risco de as pessoas escreverem mensagens de alerta que poderiam gerar sentimentos negativos entre os espectadores e os receptores. “Queremos nos inclinar a ser restritivos no conteúdo que pode ser postado para evitar uma experiência negativa do associado”, admite a empresa no texto.
Além do sistema automatizado, os gerentes terão autoridade para sinalizar ou suprimir quaisquer Shout-Outs que considerem inadequados. O programa-piloto seria lançado em abril.
Essa não é a primeira vez que a Amazon usa uma mídia social como ferramenta de controle interno. Em 2018, a empresa lançou um programa-piloto que selecionou funcionários “com destacado senso de humos” para formar um “exército” no Twitter e defender a sua imagem.
Sindicalização
No dia 1º, os trabalhadores de um centro de distribuição da Amazon em Staten Island, Nova York, surpreenderam a empresa ao tornarem-se os primeiros funcionários sindicalizados da multinacional. Eles se filiaram a uma entidade independente, o Sindicato dos Trabalhadores da Amazônia, que opera com um orçamento de US$ 120 mil. A Amazon, que tem valor de mercado calculado em US$ 1,5 trilhão gastou US$ 4,3 milhões em consultores antisíndicas somente no ano de 2021. A entidade é presidida pelo ex-rapper, Christian Smalls, de 33 anos, que foi demitido da empresa após liderar uma paralisação por segurança no local de trabalho em virtude da covid-19 no ano de 2020. Em uma reunião com o CEO Jeff Bezos, executivos da Amazon qualificaram o sindicalista em um memorando como “não inteligente ou articulado”. Smalls é negro. O memorando da reunião foi vazado pela Vice News.