Silas Malafaia apela para fake news gospel contra o papa e é desmentido
O pastor Silas Malafaia está sendo acusado por teólogos de espalhar fake news sobre o Evangelho em suas redes sociais na cruzada que está promovendo contra o Papa Francisco.
“Ele está completamente errado”, afirma o pastor Hermes Fernandes, da Igreja Reina, quando analisa a recente afirmação do líder da Igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo de que “O Deus que é amor vai colocar a gente no Inferno”.
Indignado com a autorização dada por Francisco para que sacerdotes católicos possam abençoar casais em situação considerada “irregular”, incluindo a população LGBTQIA+, Malafaia chegou a afirmar que o evangelista Mateus fala mais sobre o Inferno (condenação) do que sobre o Céu (salvação).
Além de pastor, Fernandes é psicólogo, escritor e teólogo com doutorado em Ciências da Religião. Segundo ele, a afirmação de Malafaia é inversa. Ou seja, Jesus fala mais de salvação do que de condenação.
Ele registra que ao considerar a incidência da palavra Inferno na tradução da Bíblia para o português, na verdade, Mateus a usa nove vezes. Em contrapartida, Céu, figura em 33 momentos no texto do evangelista.
Concretamente, aponta Fernandes, Inferno aparece somente 15 vezes diante de 102 citações sobre o Céu ao somar todos os quatro Evangelhos (Mateus, Marcos, Lucas e João).
Fernandes afirma que o que tem sido dito por Malafaia é repetido em púlpitos ao redor do Brasil o tempo todo.
“São Pastores dizendo que Jesus falou mais do Inferno do que do Céu. E uma outra coisa que eles falam muito – o Malafaia mesmo fala muito. É que o assunto de que Jesus mais falou foi dinheiro. Se você fizer uma pesquisa rápida, você vai ver que não é verdade”, conclui Fernandes.
Palavras fora do contexto
Malafaia apesar de berço pentecostal, hoje representa o forte segmento do neopentecostalismo que se baseia na teologia da prosperidade.
Essa corrente, além de defender que a bênção financeira é desejo de Deus para cristãos que o “temem”, usa com frequência argumentos morais que agem como forma de amedrontar seus fiéis.
Fernandes ainda registra a importância de se fazer uma distinção com respeito aos textos originais em grego que são usados no Novo Testamento.
Há pelo menos três palavras que são traduzidas por Inferno que não têm o mesmo sentido. Assim, conforme o teólogo, outros números são encontrados.
“Porque algumas vezes Jesus usou Geena; outras vezes, ele usou Hades. Vamos encontrar também o Tartarus. Não dito por Jesus, mas pelo apóstolo Pedro, por exemplo. Então, são conceitos um pouco diferentes”, considera.
Se Hades seria o equivalente a Sheol no hebraico, seria como os antigos hebreus se referiam à sepultura. “Então, não é Inferno; é sepultura”, considera Fernandes.
Para ele, no processo de helenização em que a cultura judaica da época foi submetida, Hades também significava o mundo dos mortos. “Então tem a ver com a mitologia grega”, entende.
Os descartados
Já, Geena, “que foi o que mais Jesus usou”, era uma referência a uma espécie de lixão que havia do lado de fora de Jerusalém.
Lá, todos os dejetos que eram descartados eram acumulados. Por conta do mau cheiro, “as pessoas mantinham sempre uma chama acesa para consumir o lixo, evitar um pouco o mau cheiro e abrir espaço para mais lixo. Como qualquer outro lixão, estava sempre muito cheio”, explica Fernandes.
No entendimento do pastor, Jesus usa a figura do Geena que é traduzido na Bíblia em português como Inferno, para uma alusão a um estilo de vida descartável.
“Uma vida que não vale a pena, que está destinada a ser consumida, a perder seu prazo de validade”.
Qualquer semelhança com a pregação de Francisco contra os descartados da sociedade, assim, não é uma mera coincidência.
Confira as vezes em que aparece as palavras Céu e Inferno no Evangelho, segundo Fernandes:
Mateus – Céu: 33 vezes | Inferno: 9 vezes
Marcos – Céu: 16 vezes | Inferno: 3 vezes
Lucas – Céu: 36 vezes | Inferno: 3 vezes
João – Céu: 17 vezes | Inferno: 0
Total dos Evangelhos – Céu: 102 vezes | Inferno: 15 vezes