Mantida condenação de PM que matou sem terra
Foto: Maiara Rauber/ MST Divulgação
Os três magistrados integrantes da 1ª Câmara Criminal do TJRS decidiram por unanimidade, na tarde desta quarta-feira, 26, que o policial militar Alexandre Curto dos Santos, agora aposentado, deve começar a cumprir a pena de 12 anos de reclusão à qual foi condenado pelo Tribunal do Júri em setembro de 2017.
A apelação do réu foi negada por unanimidade. O relator do Acórdão, juiz convocado Mauro Borba, além de determinar a imediata prisão do réu, decidiu enviar ao Procurador-Geral de Justiça uma cópia do relatório apresentado pelo advogado da família da vítima, no qual haveria indícios de violação de direitos humanos durante a ação da Brigada Militar. “As práticas, se verdadeiras, não podem ser admitidas”, declarou o magistrado ao se referir ao relatório elaborado pelo Procurador do Estado Carlos César D´Elia, que na época do crime pertencia à Comissão Estadual contra Tortura e pela advogada Patrícia Lucy Machado Couto, integrante da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa no mesmo período. Os desembargadores Manuel José Martinez Lucas e Jayme Weingartner Neto acompanharam o voto do relator.
A decisão valida o entendimento do STF de execução provisória da pena a partir da decisão de segunda instância, negando assim o direito de recorrer em liberdade. O PM foi condenado pelo assassinato do sem terra Elton Brum da Silva em 21 de agosto de 2009, com um disparo de espingarda calibre 12 pelas costas. O crime ocorreu durante violenta reintegração de posse efetivada pela Brigada Militar na Fazenda Southall, em São Gabriel, na Fronteira Oeste gaúcha, onde famílias reivindicavam terras para assentamentos.
Foto: Maiara Rauber/ MST Divulgação
Durante o processo, Santos assumiu a autoria do crime. Oito anos depois, em júri popular no Foro Central I da Comarca de Porto Alegre, ele foi condenado por homicídio qualificado, ou seja, por impossibilitar a defesa da vítima. Sua pena foi de 12 anos de prisão em regime fechado, perda de cargo e prisão imediata.
No julgamento desta quarta-feira, o TJRS manifestou-se sobre o recurso de apelação movido pelos advogados de defesa de Santos, com pedido para que o tribunal revisse a sentença de primeira instância. Na sessão, os desembargadores ouviram o Ministério Público Estadual, os advogados da família da vítima (assistência da acusação) e os advogados de defesa do policial.
“Há nove anos o Massacre de São Gabriel, onde dezenas de pessoas foram feridas, inúmeras mulheres e crianças, atos análogos à tortura foram praticados e Elton Brum da Silva foi assassinado, estava impune. A decisão de hoje faz justiça, mesmo que tardia e mostra para a sociedade gaúcha e para a Brigada Militar que as forças policiais não podem atirar em mulheres e crianças, bem como em protestos, manifestações, greves e passeatas. Queremos apenas que massacres como o de Eldorado de Carajás, Pau D’arco e São Gabriel não se repitam, nunca mais. O julgamento faz um pouco de justiça a Roseli Nunes e Mariele Franco, e ao sindicalista Jair Antônio da Costa, cujos responsáveis estão impunes até hoje”, explica Leandro Scalabrin, advogado da família.
Violência no campo
A Comissão Pastoral da Terra (CPT) organiza dados referentes aos conflitos no campo desde 1985. Até o ano passado registrou 1.438 casos de conflitos em que ocorreram assassinatos, com 1.904 vítimas. Desse total, somente 113 foram julgados (8%) em que 31 mandantes dos assassinatos e 94 executores foram condenados.
Segundo o relatório Conflitos no Campo Brasil, publicado anualmente pela entidade, 2017 registrou o maior número de assassinatos no campo desde 2003. Foram assassinados 71 trabalhadores rurais, sendo que 31 casos ocorreram em cinco massacres, o que corresponde a 44% do total. Já as tentativas de assassinatos subiram 63% e ameaças de morte 13%.
Os assassinatos de trabalhadores rurais Sem Terra, indígenas, quilombolas, posseiros, pescadores, assentados, entre outros, tiveram um crescimento brusco a partir de 2015. O estado do Pará lidera o ranking de 2017 com 21 pessoas assassinadas (10 no Massacre de Pau D’Arco); seguido pelo estado de Rondônia, com 17; e pela Bahia, com 10.
*Com informações do TJRS e MST.