JUSTIÇA

MPF denuncia José Serra por lavagem de dinheiro

Senador do PSDB favoreceu cartel da Odebrecht quando era governador de São Paulo em troca de R$ 4,5 milhões de propina depositados em paraíso fiscal
Por Gilson Camargo* / Publicado em 3 de julho de 2020
Cacique do PSDB, Serra é apontado na Lava Jato por esquema de lavagem de dinheiro na construção do Rodoanel

Foto: Beto Barata/ Agência Senado

Cacique do PSDB, Serra é apontado na Lava Jato por esquema de lavagem de dinheiro na construção do Rodoanel

Foto: Beto Barata/ Agência Senado

O Ministério Público Federal (MPF) ofereceu denúncia nesta sexta-feira, 3, contra o senador José Serra (PSDB-SP) por lavagem de dinheiro entre 2006 e 2007, quando era governador de São Paulo. A filha do parlamentar, Verônica Allende Serra, também foi denunciada.

Oito mandados de busca e apreensão estão em andamento pela Polícia Federal para aprofundar as investigações sobre o esquema em endereços em São Paulo e no Rio de Janeiro. Segundo a denúncia da força-tarefa da Operação Lava Jato, em 2006 e 2007 Serra recebeu vários pagamentos da empreiteira Odebrecht em contas no exterior, que totalizam de R$ 4,5 milhões. De acordo com o MPF, o dinheiro seria usado para pagamento de despesas das campanhas eleitorais do então governador.

Serra, que foi ministro do Planejamento e da Saúde nos governos de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e de Relações Exteriores de Temer, governou São Paulo de janeiro de 2007 a abril de 2010. No cargo, favoreceu um cartel de empreiteiras em troca de propina.

O dinheiro arrecadado no superfaturamento das obras mantinha a Odebrecht e outras empresas livres com a anuência do governo para combinar preços das obras para a construção do trecho sul do Rodoanel, complexo de rodovias que circunda a região central da Grande São Paulo.

“No caso da Odebrecht, essa atuação servia para se atingir a meta de lucro real estabelecida para sua participação nas obras do Rodoanel Sul, pelo superintendente Benedicto Júnior, de 12% sobre o valor do contrato, o qual só foi possível de atingir diante da inexistência de competição no certame licitatório, em razão da formação prévia de um cartel”, afirmam os procuradores na denúncia.

A força-tarefa aponta que o cartel ampliou seus lucros ao operar sem concorrência. “Em outras palavras, o cartel, que veio a ser efetivamente estabelecido, prestou-se a maximizar os lucros desta empreiteira, do que defluiu não apenas um ganho econômico, como também maior disponibilidade de recursos ilícitos (decorrentes de contratação conquistada em ambiente de ausência de competitividade) para que ela, então, pudesse realizar pagamentos de propina que foram sendo ajustados com os agentes públicos no curso das obras”, enfatiza o texto ao explicitar o funcionamento do esquema.

A investigação mostra, a partir de documentos obtidos em cooperação com autoridades internacionais, que foram feitos diversos pagamentos usando uma rede de contas offshore (em locais com menor tributação). De acordo com os procuradores, eram feitas várias movimentações financeiras no exterior para dificultar o rastreio dos recursos.

Os contatos entre Serra e a Odebrecht eram, segundo o MPF, feitos por Pedro Augusto Ribeiro Novis, que foi vizinho do senador. O executivo assinou um acordo de colaboração com a Justiça.  O nome do senador apareceu nas investigações da Lava Jato em 2017, quando o executivo Fabio Gandolfo, um dos delatores da Odebrecht, afirmou que o tucano recebera R$ 4,67 milhões em 2004 sobre obras da Linha 2-Verde do Metrô de São Paulo.  O valor, repassado sob os codinomes “vizinho” e “careca”, era parte de um “compromisso” de 3% do contrato do transporte paulista. “O vizinho eu consegui detectar só R$ 4,67 milhões”, afirmou o delator. “Esse codinome vizinho, estou falando de 2004, 2006, ele ficou meio conhecido dentro da empresa nas pessoas que tinham atividade complementar, de fazer programação. O vizinho ficou meio conhecido como Serra. A gente sabia”, afirmou Gandolfo à Lava Jato.

“Em razão dessa proximidade, cabia sempre a Pedro, em nome da Odebrecht, receber de José Serra, em encontros realizados tanto em sua residência quanto em seu escritório político, demandas de pagamentos, em troca de “auxílios” diversos à empreiteira, como os relativos a contratos de obras de infraestrutura e a concessões de transporte e saneamento de seu interesse”, denunciam os procuradores. O MPF acusa ainda Verônica Serra de, seguindo as ordens do pai, ter ajudado a movimentar os recursos no exterior.

Além dos mandados de busca e apreensão, o MPF informou que obteve autorização judicial para bloquear R$ 40 milhões em uma conta do ex-governador na Suíça. De acordo com a denúncia, Serra teria recebido da Odebrecht mais R$ 23,3 milhões em 2009 e 2010 para liberar R$ 191,6 milhões em pagamentos da estatal estadual Desenvolvimento Rodoviário S.A. (Dersa) à empreiteira.

Segundo a assessoria do senador, Serra só tomou conhecimento da denúncia nesta sexta-feira e ainda está analisando o processo antes de se pronunciar. Em nota, Serra afirma que os fatos que motivaram as ações de hoje são “antigos e prescritos”. Ele afirma ainda que “causa estranheza” que os mandados sejam cumpridos em meio à pandemia de Covid-19. “Em movimento ilegal que busca constranger e expor um senador da República”, reclama.

*Com informações do MPF e da Agência Brasil.

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