JUSTIÇA

Polícia indicia homem não indígena por estupro e feminicídio de adolescente Kaingang

Daiane Sales, 14 anos, foi aliciada em uma festa na qual menores tiveram acesso a álcool e drogas e assassinada na madrugada de 1º de agosto. Exames de DNA e testemunhas revelaram autoria do crime
Por Gilson Camargo / Publicado em 15 de setembro de 2021

Foto: Divulgação/ Polícia Civil RS

Delegados Vilmar Schaefer e Cristiane Braucks e o promotor Miguel Podanosche detalharam a investigação em coletiva: agressor agiu com extremo menosprezo à condição étnica, racial, de gênero, à menoridade e à incapacidade de negociação ou defesa por parte da vítima

Foto: Divulgação/ Polícia Civil RS

A Polícia Civil do Rio Grande do Sul deve concluir e encaminhar ao Ministério Público (MPRS) na próxima quinta-feira, 16, o inquérito com a conclusão da autoria sobre o assassinato da adolescente indígena da etnia Kaingang, Daiane Griá Sales, de 14 anos, ocorrida na madrugada de 1º de agosto deste ano na Terra Indígena da Guarita, município de Redentora, a 425 quilômetros de Porto Alegre.

Foto: Redes Sociais/ Reprodução

Daiane Sales, 14 anos

Foto: Redes Sociais/ Reprodução

O autor do crime não teve a identidade revelada. Ele foi identificado por exame de DNA e reconhecido por testemunhas. O homem, maior de idade, não indígena, já estava preso temporariamente na penitenciária estadual de Três Passos e teve a prisão preventiva decretada. Em entrevista coletiva na manhã desta quarta-feira, 15, na sede da delegacia regional em Três Passos, o delegado Vilmar Schaefer, que conduziu a investigação em Redentora, afirmou que ele foi indiciado por estupro de vulnerável e homicídio qualificado – feminicídio.

A polícia interrogou 88 pessoas durante 40 dias de investigações. No inquérito de mais de mil laudas, os policiais apontam que Daiane foi aliciada em uma festa realizada na rua, na vila São João, perto da reserva.

O encontro reunia jovens indígenas e de fora da reserva em torno de carros com som alto e consumo de bebidas alcoólicas e drogas. Testemunhas ouvidas pela polícia disseram que Daiane foi uma das jovens abordadas pelo suspeito durante a festa e aceitou uma carona em seu carro entre 2h e 3h de 1º de agosto. Ela foi levada para um local de difícil acesso na região, distante 12 quilômetros do local.

O corpo só foi encontrado na tarde de 4 de agosto por um agricultor. No local, os policiais encontraram um moleton que a menina vestia e que pertencia a um segundo suspeito. Ele chegou a ser preso, mas os policiais constataram que ele apenas teria emprestado a vestimenta à jovem durante a festa.

Agressões

A perícia indicou que a adolescente sofreu asfixia e violência sexual antes de ser morta. Um sulco no pescoço chamou a atenção dos peritos para o emprego de uma corda pelo agressor para imobilizar a vítima. O objeto não foi encontrado, mas os peritos concluíram que a lesão foi feita enquanto ela ainda estava viva.

Abandonado em meio a uma lavoura, o corpo foi dilacerado por animais nos dias que se seguiram, mas a perícia conseguiu isolar dos restos mortais e das roupas da menina amostras de material genético compatível com o DNA do suspeito que já estava preso. Devido a pressões e à repercussão do caso, a polícia conduziu a investigação sob sigilo judicial.

“Houve um grande clamor popular. Foi indignação popular que tomou conta (de todos) por conta da gravidade dos fatos praticados. E a indignação de ver a vítima naquela situação. Uma situação de extrema covardia. Porque, embora comprovado que aquilo não foi ação humana, as partes dilaceradas, todos compreendem que aquilo só aconteceu porque alguém abandonou o corpo ali. Posso dizer que em 31 anos de carreira policial, foi o pior (caso) até o momento. Foi uma extrema covardia”, afirmou o delegado.

Violação de direitos

Uma nova investigação foi anunciada pelo promotor Miguel Germano Podanosche para apurar a venda de bebidas alcoólicas e drogas aos menores que participaram da festa. Ele classificou o crime como grave violação dos direitos humanos. “Dos direitos da mulher, dos indígenas e de todo e qualquer ser humano”, disse.

O agressor, frisou Podanosche, agiu com extremo menosprezo à condição étnica, racial, de gênero, à menoridade e à incapacidade de negociação ou defesa por parte da vítima.

O exame realizado no sangue da menina constatou que o nível de álcool era três vezes superior ao limite permitido pela lei de trânsito. “Isso mostra que estava em vulnerabilidade absoluta. O que ocorreu foi um estupro de vulnerável, um crime hediondo”, concluiu.

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