JUSTIÇA

STF está corrigindo um erro com a imposição de outro na contribuição sindical, afirma jurista

Paralisada por pedido de vistas de Alexandre de Moraes, decisão sobre contribuição sindical por acordos negociados já tem votos favoráveis de cinco ministros
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 27 de abril de 2023

Foto: Memorial da Democracia/ Reprodução

Metalúrgicos do ABC aprovam em assembleia no Estádio de Vila Euclides, em São Bernardo do Campo, uma das maiores greves gerais da categoria, em 30 de março de 1980 contribuição sindical

Foto: Memorial da Democracia/ Reprodução

O julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o retorno da contribuição assistencial de trabalhadores não sindicalizados caminha para uma decisão favorável que tira o movimento sindical de um processo de asfixia financeira iniciado em 2017 no governo Michel Temer, com a aprovação da reforma trabalhista.

Para o advogado Luís Carlos Moro, apesar do processo ser para “consertar um erro notório”, a solução apontada cria um instituto de direito que não existe.

Outro ato, na opinião do jurista, no histórico da jurisdição da Corte sobre o sindicalismo que “é o de uma interpretação sucessiva desconstitucionalizante do movimento”, afirma.

Secretário-geral da Associação Americana de Juristas (AAJ) e presidente da delegação brasileira da Associação Luso-brasileira de Juristas do Trabalho (Jutra) Moro sustenta que o voto do ministro Luís Roberto Barroso é contraditório.

Ele entende que o chamado “direito de oposição”, que estabelece que o trabalhador decide se quer pagar ou não a contribuição sindical, conflita com o conceito de sindicato que é o de um ente coletivo

Direito de voto, não de veto 

Foto: Arquivo Pessoal

Luís Carlos Moro: “firmam uma jurisprudência que parte de verdadeiros preconceitos contra a atividade sindical”

Foto: Arquivo Pessoal

“Não é admitido um veto a uma decisão coletiva; você quer se opor, vá na assembleia”

“O problema da estruturação lógica do voto é que se atribui ao indivíduo um poder de vetar uma deliberação que é coletiva. Vamos transportar isso para outro ente coletivo. Sobre uma deliberação de um condomínio, por exemplo. Se define uma taxa e vem um condômino e diz que quer exercer o seu direito de oposição. O que que acontece com os condomínios?”, indaga Moro.

De acordo com o jurista, isso não pode ocorrer simplesmente porque “entes coletivos se expressam coletivamente”.

“Não tem como alguém dizer que vai se beneficiar de tudo o que tem de bom de uma negociação feita por seu sindicato e não querer pagar a contribuição social ou assistencial. Aí se quebra o conceito de coletividade. Você fratura o sindicato”, alerta.

O jurista é taxativo: “Não é admitido um veto a uma decisão coletiva; você quer se opor, vá na assembleia e vote contra. Você tem o direito de votar e ser votado. O direito é de voto, não de veto. Estão dando direito de veto”, reclama.

Visão preconceituosa contribuição sindical

“A contribuição patronal que está no artigo 580 da CLT continua com a redação de 1976”

Moro destaca um ponto que revela o grau de hipocrisia dessa discussão. “Ninguém sequer pensa em atribuir às empresas o direito de veto das deliberações tomadas nas assembleias patronais. Se tivermos, por exemplo, também o direito de oposição nas representações patronais, você vai ver o tamanho da encrenca que pode ser criada no sistema S”, adverte.

Para ele, o movimento trabalhista no Brasil é ainda visto com o preconceito do século 19 e o ministro Barroso tem “severas dificuldades de compreensão do fenômeno sindicato”.

Um exemplo crasso é que, se a Lei 13467/2017 destruiu os princípios de contribuição para as entidades dos trabalhadores, “com relação à contribuição patronal que está no artigo 580 da CLT a gente continua com a redação de 1976”, aponta o jurista.

A lógica dos defensores da reforma trabalhista de Temer é a que todos os “males estavam concentrados exclusivamente na representação dos trabalhadores”, interpreta.

Patronal não é sindicato

“O sindicalismo patronal, por si uma excrecência que não existe em lugar nenhum, se manteve com alíquotas ampliadas”, registra o jurista ao explicar que para o direito internacional a palavra sindicato tem um viés e no direito brasileiro, outro.

“Quando a Organização Internacional do Trabalho (OIT) fala de sindicato, fala de trabalhadores; quando fala de representação patronal, usa o termo organização. Não estou negando o direito de associação patronal, só estou dizendo que associação patronal é tudo, menos sindicato”, expõe.

Constituição distorcida

“Estão acabando com as liberdades sindicais, com a ideia de unicidade que bem ou mal é aquela que está assentada na Constituição”

A Constituição brasileira determina que o país se rege pelo princípio da Autonomia Sindical de uma forma muito clara, lembra Moro.

Ele ressalta que a Carta assegura a liberdade sindical ao estabelecer que a assembleia geral é responsável por fixar a contribuição (inciso 4° do artigo 8°) que deverá ser descontada em folha para o custeio do sistema confederativo de representação dos trabalhadores, independente da contribuição prevista em lei.

“A Constituição assegura pelo menos duas contribuições e o Supremo as matou. A confederativa e a assistencial”, lamenta.

Enfático, o jurista afirma que “na tentativa de consertar males sociais ou sociológicos que existem mesmo como uma tradição no sindicalismo brasileiro”, o STF distorce o conteúdo literal das normas constitucionais.

“Aos pouquinhos, firmam uma jurisprudência que parte de verdadeiros preconceitos contra a atividade sindical. Estão acabando com as liberdades sindicais, com a ideia de unicidade que bem ou mal é aquela que está assentada na Constituição. Ao acabar com a noção de que, dentro da liberdade sindical, cabe ao sindicato fazer ou deixar de fazer, estão destruindo a autoridade das assembleias gerais”, conclui.

Votos contribuição sindical

Foto: Nelson Jr./SCO/STF

Moraes pediu prazo para decidir voto, mas pode acompanhar posição favorável de Barroso

Foto: Nelson Jr./SCO/STF

Na última sexta-feira, o julgamento no plenário virtual do STF foi suspenso porque o ministro Alexandre de Moraes pediu mais tempo para analisar a matéria. Ele terá 90 dias para devolver o processo.

Além de Moraes, seis ministros ainda não votaram.

Até agora, votaram a favor da contribuição sindical por acordos negociados o relator, ministro Gilmar Mendes, que mudou o voto e acompanhou a posição de Luís Roberto Barroso; Cármen Lúcia, Edson Fachin e Dias Toffoli acompanharam o relator.

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