JUSTIÇA

Violência contra a mulher é subnotificada em até 98,5%

O Brasil é o quinto país no ranking mundial de homicídios de mulheres. Aqui, a violência doméstica contra elas é praticada com requintes de crueldade e vitima principalmente as jovens e negras
Por Gilson Camargo / Publicado em 20 de novembro de 2023
Violência contra a mulher é subnotificada em até 98,5%

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Mobilização de mulheres no Dia Internacional da Mulher – 8M, no Rio de Janeiro. No Brasil, quase 90% dos casos de violência física não são notificados

Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

A violência psicológica contra a mulher é subnotificada em até 98,5% em todo o país. É o que revela uma pesquisa realizada pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em parceria com a University of Washington e a Universidade Federal de Pelotas (UFPel). O estudo também verificou que os índices de subnotificação das violências física e sexual são de 75,9% e 89,4%, respectivamente.

O Brasil é o quinto país no ranking mundial de homicídios de mulheres. Aqui, a violência doméstica contra elas é praticada com requintes de crueldade e vitima principalmente as jovens e negras (61,8%). Em uma década, o número de homicídios de mulheres negras aumentou acima de 50%. Apesar de todos os avanços, como a Lei Maria da Penha, há no país uma cultura arraigada de violência contra mulheres com a naturalização de “tapinhas” que não doem e “tapas e beijos” nas relações afetivas. Em 2022, o número de feminicídios no Brasil aumentou 6,1% em comparação ao ano anterior: foram 1.437 mulheres assassinadas. Ainda de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023, houve crescimento de todas as formas de violência contra a mulher.

No Rio Grande do Sul, o Tribunal de Justiça expede, desde 2021, mais de 330 medidas protetivas por dia, ou 14 por hora. Mesmo assim, 90% das mulheres que morreram vítimas de feminicídio não tinham medida protetiva.

Em 2020, ocorreram 221 homicídios contra mulheres e, desses, 80 foram feminicídios. O RS foi o quarto estado em números de feminicídios apenas no primeiro semestre daquele ano. Em 2019, foram 255 assassinatos de mulheres, dos quais 97 foram feminicídios (38%).

“São números relevantes e desconsiderados pelo poder público, porque não há ação efetiva. O que vemos é as autoridades dizerem ‘Denunciem’, mas as mulheres não estão morrendo porque não denunciam”, afirma a advogada, especialista em Direitos Humanos e violência política de gênero Ariane Leitão.

Nos primeiros nove meses do ano, o estado de São Paulo registrou 166 casos de feminicídio, conforme a Secretaria da Segurança Pública (SSP) paulista. Esse foi o maior número de casos desde 2018, quando a classificação passou a constar nos registros de boletins de ocorrência. E, também, representa uma alta de 25,7% em relação ao mesmo período do ano passado, que teve 132 feminicídios.

Órfãos do feminicídio I

Por iniciativa de deputadas federais de sete estados e do DF, crianças e adolescentes de baixa renda filhos e dependentes de vítimas de feminicídio passaram a ter direito a uma pensão especial no valor de um salário mínimo. O projeto de lei de autoria das parlamentares do Partido dos Trabalhadores Maria do Rosário (RS), Rejane Dias (PI), Professora Rosa Neide (MT), Gleisi Hoffmann (PR), Natália Bonavides (RN), Luizianne Lins (CE), Benedita da Silva (RJ) e Erika Kokay (DF) foi aprovado no Senado e sancionado pelo governo federal no dia 31 de outubro.

Órfãos do feminicídio II

O PL 976/2022, que deu origem à Lei Ordinária 14717/2023, prevê que a pensão pode ser paga antes da conclusão do julgamento do crime. Caso a Justiça não considere que houve feminicídio, o pagamento é suspenso, sendo que os beneficiários não serão obrigados a devolver os valores recebidos, desde que não seja comprovada má-fé. O texto também impede que o suspeito de cometer feminicídio ou de coautoria do crime receba ou administre a pensão em nome dos filhos. Outra proibição prevista é acumular a pensão com demais benefícios da Previdência Social.

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