JUSTIÇA

TRT-4 reconhece demissão discriminatória de professor de Uruguaiana

Professor foi demitido em 2022 por pressão de pessoas ligadas ao agronegócio do Rio Grande do Sul, na esteira de uma campanha de ódio, difamação e ameaças nas redes sociais
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 20 de junho de 2024

Foto: Arquivo Pessoal

Atualmente, Ronan leciona ciências na rede municipal de educação de Uruguaiana

Foto: Arquivo Pessoal

O Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-4) concluiu, na tarde desta quarta-feira, 19, que o professor Ronan Moura Franco foi efetivamente demitido de forma discriminatória pelo Colégio Marista Sant’Ana, de Uruguaiana, Rio Grande do Sul.

Ele foi desligado no início do ano letivo de 2022, após fazer postagem em sua conta pessoal no Twitter criticando o racionamento de água em Uruguaiana só para a população urbana.

No texto, Franco falava sobre o uso intensivo de água por grandes produtores em uma das regiões mais castigadas pela seca no Sul do país na ocasião. A partir desta postagem, o professor passou a ser vítima de difamações e ameaças promovidas por pessoas ligadas ao agronegócio.

Foi de forma unânime que a 11ª Turma Recursal do TRT-4 acatou o voto do relator, o desembargador Luis Carlos Pinto Gastal, que dobrou a indenização por danos morais definida na 1ª instância em R$ 30 mil e acatou o recurso do professor para que fosse declarado a demissão como discriminatória.

Em agosto de 2022, a comarca de Uruguaiana não reconheceu discriminação, mas entendeu que houve represália contra a livre manifestação do professor.

Agora, com a decisão do TRF-4, o professor também terá direito a uma indenização pela dispensa motivada por preconceito. O montante ainda será calculado, mas a estimativa é que possa girar em torno de R$ 150 mil.

Vitória reconfortante para o professor

“Eu até confesso que, diante de tudo que eu sofri, esses valores não representam nada. Eu digo que a condenação de instituições que têm esse tipo de atitude contra os educadores vale mais do que qualquer valor. E eu fico feliz por não ter desistido nunca, por ter enfrentado tudo isso”, afirma Franco.

Ele ainda espera que o ocorrido dê visibilidade para que outras pessoas que tenham passado por situações semelhantes também tenham chance de ter justiça, de ter os seus direitos reconhecidos.

“Eu penso que não é só uma vitória minha; junto, eu arrasto muita gente que foi silenciada”, desabafa.

O caso do ex-professor do Colégio Marista Sant’Ana é considerado um dos mais graves entre os denunciados ao Núcleo de Apoio ao Professor Contra a Violência (NAP), do Sindicato dos Professores do Ensino Privado do Rio Grande do Sul (Sinpro/RS)

O NAP foi criada para fazer frente, entre outras coisas, à série de ataques que os professores do ensino privado têm recebido nos últimos anos. Entre elas, acusações de doutrinação feitas por apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que fomentam o movimento Escola Sem Partido.

Para a diretora do Sinpro/RS e coordenadora do NAP, Cecília Farias, a decisão judicial foi “muito reconfortante”, prevalecendo o bom senso e a ciência.

“O professor não disse nenhum absurdo. Ele falou de coisas que têm a ver com a realidade e foi demitido por uma escola que não soube contornar o conflito com uma parte da sociedade muito conservadora. Esse professor sofreu muito, muito”, lamenta.

A dirigente do Sinpro/RS lembra que o Sindicato buscou de todas as formas que o colégio e sua mantenedora tivessem outra posição, “mas eles foram irredutíveis”, conclui.

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