JUSTIÇA

Quatro argentinos resgatados em São Marcos no dia de combate ao trabalho escravo

Os trabalhadores foram foram trazidos ao Brasil via Santa Catarina para trabalhar na colheita de uva da região serrana gaúcha
Por César Fraga / Publicado em 30 de janeiro de 2025

Quatro argentinos resgatados em São Marcos no dia de combate ao trabalho escravo

Foto: MTE-MPTRS-PF/Divulgação

Foto: MTE-MPTRS-PF/Divulgação

Quatro trabalhadores argentinos  foram resgatados de trabalho escravo (condições análogas à escravidão) em em São Marcos, na região serrana do Rio Grande do Sul, em operação coordenada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), com acompanhamento do Ministério Público do Trabalho (MPT-RS) e participação da Polícia Federal (PF).

Os trabalhadores haviam sido trazidos para o Rio Grande do Sul para trabalharem na colheita da uva.  Os resgatados são todos homens, com idades entre 19 e 38 anos, oriundos da província de Misiones, e ingressaram no Brasil via Dionísio Cerqueira (SC). Estavam alojados em uma casa de madeira, bastante velha, com dois quartos que, segundo o depoimento dos trabalhadores, chegaram a abrigar 11 homens ao todo. As condições de habitação eram precárias: os trabalhadores dormiam em colchões no chão, não tinham armários ou quaisquer outros móveis para guardar seus pertences, a fiação elétrica estava exposta e em desacordo com as Normas Regulamentadoras.

Um dos principais problemas era o acesso a água potável. A água que abastecia as torneiras era captada de um pequeno açude junto à casa, e toda água usada no banho e na descarga das instalações sanitárias era devolvida para o pátio, junto ao açude, formando um esgoto a céu aberto na entrada do imóvel e contaminando a água do açude que seria usada para o consumo dos trabalhadores. A fiscalização constatou que a água apresentava cor amarelada e odor fétido. Trabalhadores relataram sofrer com alergias cutâneas e diarreia.

Os trabalhadores argentinos relataram ter sido agenciados por um conterrâneo, o qual buscava trabalhadores na Argentina e os encaminhava a uma arregimentadora de serviços em São Marcos. Esta, por sua vez, havia prometido um trabalho bem remunerado, incluindo moradia. Ao chegar no local, os trabalhadores se depararam com a precariedade do alojamento e, ao final de uma semana de trabalho, quando deveriam receber pelos serviços prestados, foram abandonados à própria sorte, sendo desconhecido o atual paradeiro da arregimentadora. Segundo relatos do produtor rural, identificado como o tomador dos serviços durante a semana, este já havia efetuado o pagamento da remuneração correspondente, a qual não foi repassada aos trabalhadores.

Quatro argentinos resgatados em São Marcos no dia de combate ao trabalho escravo

Foto: MTE-MPTRS-PF/Divulgação

Foto: MTE-MPTRS-PF/Divulgação

Combate ao trabalho escravo

O resgate dos argentinos foi realizado na terça-feira, 28, Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, como parte de uma operação mais ampla de fiscalização da colheita da uva. Em fevereiro do ano passado, uma operação semelhante encontrou 22 trabalhadores argentinos também em condições análogas à escravidão em São Marcos. Com a operação desta semana, já são oito trabalhadores resgatados no RS em 2025.

Na quarta-feira, 29, foi firmado um Termo de Ajuste de Conjunta com o produtor rural que contratou os serviços dos quatro trabalhadores resgatados nesta operação, garantindo o pagamento das verbas trabalhistas e rescisórias devidas pela rescisão indireta dos contratos de trabalho. O Ministério do Trabalho e Emprego emitiu o seguro-desemprego para trabalhador resgatado, assegurando aos imigrantes argentinos o pagamento de três parcelas de um salário-mínimo.

A assistência social do município de São Marcos, por sua vez, providenciou estadia e disponibilizou passagens para deslocamento dos trabalhadores, que não desejaram retornar à Argentina.

A DATA – O Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo foi criado em homenagem aos auditores-fiscais do Trabalho Nélson José da Silva, João Batista Soares Lage e Eratóstenes de Almeida Gonçalves, além do motorista Aílton Pereira de Oliveira, que foram assassinados em Unaí (MG), no dia 28 de janeiro de 2004, quando investigavam denúncias de trabalho escravo em uma fazenda.

Região dos vales do Rio Pardo e do Rio Taquari

Quatro argentinos resgatados em São Marcos no dia de combate ao trabalho escravo

Foto: MTE-MPTRS-PF/Divulgação

Foto: MTE-MPTRS-PF/Divulgação

A força-tarefa coordenada pelo MTE, juntamente com MPT e PF, já havia realizado uma operação conjunta entre os dias 20 e 23 de janeiro, para apuração de denúncias sobre possíveis situações de trabalho em condições análogas às de escravo. Ao longo de três dias de ação foram vistoriados estabelecimentos em cinco municípios. Não houve resgates, mas foram encontradas irregularidades.

Durante a operação, foram inspecionados nove estabelecimentos nos municípios de Segredo, Vale do Sol, Rio Pardo, Santa Cruz do Sul e Venâncio Aires, que desenvolviam atividades urbanas e rurais. Os agentes da força-tarefa dedicaram-se a identificar situações de trabalho informal e degradante, com o objetivo de garantir a proteção dos direitos dos trabalhadores.

Além de trabalhadores sem carteira de trabalho assinada e da não observância do salário mínimo regional, foram constatadas irregularidades envolvendo locais de habitação fornecidos pelos empregadores, bem como quanto às normas de saúde e segurança no trabalho. Não foram encontrados trabalhadores submetidos a condições análogas à de escravizados.

A ação conjunta entre MTE, MPT e PF segue o previsto no Fluxo Nacional de Atendimento às Vítimas de Trabalho Escravo no Brasil, instituído pela Portaria nº 3.484, de 06 de outubro de 2021. A partir do recebimento de denúncias através do Sistema IPE (https://ipe.sit.trabalho.gov.br/), o Ministério do Trabalho e Emprego, através da Inspeção do Trabalho, articula com as demais instituições a execução de operativo para verificação dos fatos e o resgate de trabalhadores quando encontrados submetidos a condições análogas às de escravo.

Comentários

Siga-nos