Nova polêmica em torno do tabaco
Ficou para o segundo semestre a definição das novas restrições para o comércio dos derivados do fumo no Brasil, encaminhadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) através de duas consultas públicas, que tratam da restrição da forma de venda de cigarro e a proibição da adição de ingredientes que modifiquem o sabor do produto. As mais de 220 manifestações, contrárias às mudanças encaminhadas pela Câmara Setorial do Tabaco, órgão que congrega diferentes ministérios, suscitou polêmica dentro e fora da Câmara.
Alegando diminuição dos postos de trabalho, que atualmente chegam a 2.5 milhões, o presidente do SindiTabaco, Iro Schünke, defende que a implantação das propostas “deve gerar gravíssimos impactos sociais e econômicos em toda a cadeia produtiva do tabaco. Representa um perda de renda no campo para mais de 222 mil pequenos produtores de tabaco (foram R$ 4,6 bilhões em 2010), afetando mais de 1.048 milhão de pessoas no meio rural do Brasil”.
“Trata-se de uma ameaça real à liderança brasileira no mercado mundial de tabaco, como maior exportador – o que gerou em 2010 divisas da ordem de US$ 2,7 bilhões – e segundo maior produtor,” continua o sindicalista. Ele destaca ainda o perigo da redução de divisas na exportação; a redução na arrecadação atual de R$ 8,5 bilhões em impostos. Na avaliação do presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Candelária, Juares Cândido da Rosa, as duas consultas da Anvisa afetariam a cadeia produtiva, assim como as anteriores já têm repercutido negativamente junto ao produtor. Mas ele assegura que a Anvisa já assumiu o compromisso de suspender e reanalisar a questão: “Até porque o setor não foi chamado para discutir antes das consultas”, critica.
Foto: Igor Sperotto
O dirigente reconhece que essa mudança de atitude por parte do governo e da própria Anvisa só ocorreu pela forte pressão por parte das entidades, dos prefeitos, vereadores e deputados, apresentando justificativas de fundo econômico e social. “Para a nossa região – ilustra Juares – é uma questão social que envolve muitas famílias que hoje não teriam como viabilizar outras alternativas, até porque implica custos altos. O poder público teria que investir muito para viabilizar essas alternativas”.
Juares, entretanto, afirma que a Fetag concorda com algumas restrições previstas nas consultas como a adição de produtos que não são do próprio fumo com o objetivo de torná-lo mais atraente: “A Fetag não defende as demais misturas que a indústria venha a pôr no produto para torná-lo mais atrativo ao fumante”. Por outro lado, a federação é favorável à reposição do açúcar no fumo burlei, por avaliar que ao fazer isso o produtor só está recuperando uma substância que a planta já teria naturalmente, mas que perde em função do sistema de secagem.
Foto: Igor Sperotto Foto: Igor Sperotto
De acordo com a secretária, a Conferência das Partes, ocorrida em novembro do ano passado, na qual compareceram representantes dos países que adotaram a Convenção-Quadro, uma das diretrizes mais debatidas foi a necessidade de proibir aditivos nos cigarros, para reduzir a sedução dos primeiros fumantes: “Os próprios documentos das indústrias mostram como eles pesquisam os sabores mais atraentes para crianças e adolescentes”.
Foto: Igor Sperotto
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Por outro lado, Xavier considera que tanto o Inca como os demais segmentos envolvidos na discussão do fumo, não podem desconsiderar quaisquer encaminhamentos à consulta da Agência, “ainda que estejam visivelmente ligadas ao setor produtivo, eles se constituem em manifestações públicas”, explica, “mas terão que ser relativizadas”, adverte.
Destaque Mundial
O Brasil é líder mundial na exportação de fumo em folha, só perdendo para a China. Em 2008, a cadeia produtiva do fumo gerou 8 bilhões e meio de tributos para o país. No cenário nacional, a Região Sul concentra a produção brasileira, onde o Rio Grande do Sul é responsável por 50%, Santa Catarina por 30% e o Paraná por 15% dessa produção. Exclusivamente caracterizada pela agricultura familiar, a cultura gaúcha do fumo compreende cerca de 100 mil famílias de um total nacional de 223 mil famílias, o que corresponde a 800 mil pessoas envolvidas com o plantio do fumo no estado.
Nos últimos 25 anos, o consumo de fumo no Brasil está relativamente estável, algo em torno de 4 a 5 bilhões de maços/ano. A produção do cigarro corresponde à terceira etapa no ciclo do tabaco, e no Brasil ela está concentrada nos estados do Rio Grande do Sul, Paraná e Rio de Janeiro, onde há mais de cem anos encontra-se a sede da Souza Cruz no país. Líder no mercado mundial, a Souza Cruz é subsidiária da British American Tobacco, empresa britânica que na primeira metade do século 20 começou um processo de expansão de fronteiras, quando compra a Souza Cruz no início da década de 20.
De acordo com Tânia Cavalcante, existe um programa do Ministério da Agricultura, “infelizmente pouco divulgado”, que propõe a diversificação de produção em áreas cultivadas com tabaco. Os Estados Unidos, conforme Xavier, é exemplo neste sentido, pois já desenvolveu programa nacional de apoio aos produtores de fumo para que eles mudassem sua fonte de renda.
Questão de Saúde
O hábito do fumo é modernamente diagnosticado como doença pediátrica porque 90% dos fumantes começa a fumar antes dos 19 anos, e a idade média de iniciação é de 15 anos. De acordo com dados do Inca (Instituto Nacional do Câncer) dos cerca de 1,25 bilhão de fumantes no mundo, mais de 30 milhões são brasileiros. Conforme Tânia Cavalcante, o cigarro é responsável por 90% dos casos de câncer de pulmão e dos seis tipos de câncer com maior índice de mortalidade no Brasil, metade (pulmão, colo de útero e esôfago) tem o cigarro como um de seus fatores de risco.
O Ministério da Saúde, entretanto, divulgou no dia 18 de abril os resultados de pesquisas recentes que comprovam que, nos últimos cinco anos, a proporção de fumantes na população geral caiu de 16,2% para 15,1%, sendo que a redução mais expressiva ocorreu entre os homens. O estudo foi realizado no período de 2006 a 2010. Em 1989, quando o número começou a ser pesquisado, a quantidade de fumantes era equivalente a 34,8% na população.
Deborah Malta, coordenadora-geral do Departamento de Análise da Situação da Saúde do Ministério da Saúde, menciona algumas das medidas que explicam essa redução: “Em 12 anos nós reduzimos isso e atribuímos muito a uma política do governo federal e também da sociedade civil tanto regulando quanto proibindo a propaganda, o que desestimulou muito o fumo junto aos estudantes, como também estabelecendo programas por exemplo de ambientes livres de cigarro, colocando figuras nos maços de cigarro que desestimulam a população. Com isso nossos jovens têm fumado menos”. Para Tânia Cavalcante, entretanto, ainda há muito que ser feito.