Produtores gaúchos pedem suspensão do herbicida 2,4-D
Foto: Igor Sperotto
Cerca de 50 produtores do setor da fruticultura, de diversos municípios gaúchos, pediram nesta terça-feira, 23, ao secretário da Agricultura, Covatti Filho, que determine a suspensão imediata do uso do herbicida 2,4-D nas lavouras de soja no Rio Grande do Sul.
O encontro ocorreu à tarde, durante audiência no Ministério Público Estadual, a convite do promotor de Justiça do Meio Ambiente de Porto Alegre, Alexandre Saltz, que conduz um inquérito civil para apurar os prejuízos causados pela aplicação do pesticida em outras culturas. “É uma questão de sobrevivência para nós, porque se o governo não suspender o uso do 2,4-D pelo menos por um ano, será decretada a falência da fruticultura no Estado”, alerta Valter José Peterson, produtor em Dom Pedrito.
Abalados pelas perdas milionárias nas últimas safras em razão da deriva do produto para suas plantações de uvas, principalmente, os produtores rebateram ponto a ponto as oito proposições elaboradas pelo Departamento de Defesa Agropecuária (DDA) e apresentadas pelo secretário Covatti como medidas mitigadoras dos prejuízos causados pela contaminação do químico, já comprovada em 69 de 86 amostras de produtos coletados em 22 municípios.
Foto: Igor Sperotto
O titular da pasta da Agricultura é contra a restrição e defende ações para tentar solucionar os problemas em regiões consideradas sensíveis. Assim como os produtores de soja, o secretário não cogita suspender a utilização do herbicida. “Ao invés de proibir, temos que aproveitar a situação para aprimorar nossa Legislação e criar mecanismos de controle”, argumentou. Entre as propostas estão a regulamentação para aplicação terrestre, treinamento e cadastro dos aplicadores e a criação de um fundo de indenização.
O engenheiro agrônomo Norton Sampaio, produtor de uvas e professor de Viticultura da Universidade Federal do Pampa (Unipampa), em Bagé, discorda. Para ele, se faz urgente a proibição do 2,4-D e de outros herbicidas hormonais, com poder de deriva muito forte, atingindo distâncias de até 15 quilômetros, a partir do local onde foi aplicado, devido à volatilidade. “Existem várias alternativas ao 2,4-D que não causam esse problema tão sério que não se restringe às uvas, mas também atinge as oliveiras, macieiras, citros, erva-mate. Por safra, sofremos prejuízos de mais de R$ 100 milhões, envolvendo toda a cadeia produtiva”, observa Sampaio.
“Precisamos chegar a um consenso porque hoje as nossas uvas e oliveiras estão sendo dizimadas e os prejuízos já atingem 60% dos cultivos”, acrescenta Clori Peruzzo, presidente da Associação dos Produtores de Vinhos Finos da Campanha Gaúcha.
Na metade de janeiro deste ano, os sojicultores, reunidos na Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), não chegaram a um acordo com os viticultores em relação à suspensão do uso do químico. O presidente da Farsul, Gedeão Pereira, disse ser contrário à “proibição de qualquer princípio ativo” e entende que o “2,4-D é um produto de altíssima qualidade e absolutamente seguro”.
Pesticida extremamente perigoso
O engenheiro agrônomo Leonardo Melgarejo é um estudioso do assunto. Coordenador adjunto do Fórum Gaúcho de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos, vice-presidente regional Sul da Associação Brasileira de Agroecologia e conselheiro da Agapan, Melgarejo explica que o herbicida 2,4-D é um desfolhante específico para plantas de folhas largas, extremamente perigoso.
“Costuma apresentar como impurezas alguns dos produtos mais tóxicos gerados pela humanidade. As dioxinas. Associa-se o herbicida a alterações metabólicas importantes, mais graves no período de formação. Abortos, malformação fetal e alterações genéticas são os casos mais graves”, afirma.
O agrônomo garante que não é possível evitar plenamente a deriva do 2,4-D, devido às condições ambientais – variações climáticas envolvendo alterações na umidade relativa do ar, na velocidade e direção dos ventos – eventos incontroláveis que estarão sempre interferindo e as moléculas flutuarão no ar, sem controle dos aplicadores. “A única saída é proibir o uso em todo território nacional. Como paliativo, pode-se criar barreiras, cortinas verdes, culpar o trabalhador que aplicou, e assim por diante. Mas o problema real só será evitado com a suspensão do uso”, completa.