Defesa da educação encerra Greve Geral em Porto Alegre
Foto: Igor Sperotto
Depois de uma manhã de bombas de gás lacrimogênio e spray de pimenta empregados pela tropa de choque da Brigada Militar na tentativa de desmobilizar os piquetes nas garagens de ônibus, a tarde desta sexta-feira, 14, dia de Greve Geral em todo o país, começou com o trânsito diminuto em Porto Alegre. Na Zona Sul, as lojas que abriram nas principais avenidas permaneceram vazias, algumas funcionando com luzes apagadas e quase sem funcionários. “Acho que as pessoas anteciparam para ontem o que tinham pra fazer hoje. O movimento está atípico para uma sexta-feira”, reparou o motorista de Uber, Carlos Rodrigues. “Hoje de manhã tive meia dúzia de chamadas, e à tarde continua devagar. Pensei que fosse só comigo, mas falei com meu grupo no whatsapp e estão todos neste ritmo”, completou. Em Porto Alegre e em mais de 150 municípios do interior, atos, concentrações e caminhadas marcaram o encerramento da mobilização contra a reforma da Previdência. De acordo com o presidente da CUT-RS, Claudir Nespolo, a estimativa das centrais sindicais é de que o ato em Porto Alegre mobilizou 50 mil pessoas. Em todo o país, o #14J foram 45 milhões de manifestantes mobilizados em 360 cidades, conforme avaliação do presidente nacional da Central, Vagner Freitas.
Foto: Igor Sperotto
Por volta das 15h, estudantes e trabalhadores da educação começaram a chegar ao ponto em que iniciaram as manifestações da tarde, na avenida Osvaldo Aranha, em frente ao Instituto de Educação, um dos principais símbolos do ensino estadual público da capital gaúcha, e inclusive da formação de professores. Dali, uma passeata com aproximadamente 300 pessoas seguiu em direção à Faculdade de Educação (Faced) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), entre a Osvaldo Aranha, rua Sarmento Leite e o Parque da Redenção.
“A escolha do roteiro não foi à toa”, relata a deputada estadual Sofia Cavedon (PT), presidente da Comissão de Educação da Assembleia Legislativa. O Instituto de Educação está há pelo menos quatro anos sem telhado, desativado, com cerca de mil alunos espalhados em quatro outras escolas estaduais públicas em Porto Alegre. “O governo Tarso deixou o plano de restauração desta escola totalmente pronto e com o financiamento captado para ser executado. O ex-governador Sartori levou quatro anos para licitar”, exclamou a deputada. De acordo com Sofia, as obras somente foram retomadas no último mês do governo Sartori, e estão passo a passo sendo acompanhadas pela comissão que ela preside no parlamento.
Foto: Igor Sperotto
A caminhada até a Faced também foi simbólica devido aos agressivos ataques que o governo federal tem desferido contra as universidades federais, com cortes nos orçamentos que chegam a 30%, algumas inclusive com ameaças de fechamento, explicou. As políticas de cortes na educação do governo Jair Bolsonaro também se refletem na educação básica no Rio Grande do Sul. “A União promoveu reduções em todos os programas estaduais e municipais. O Mais Educação, criado em 2007, para ampliação da agenda de educação integral, com maior jornada escolar nas escolas públicas, por exemplo, beneficiava no estado cerca de 2 mil escolas. Hoje o programa está reduzido a 90. “São cortes brutais”, enfatiza.
No transcorrer da tarde, o movimento dos ônibus aumentou na Osvaldo Aranha, mas alguns circulavam vazios. O trânsito foi retomando aos poucos o movimento do meio para o final da tarde. “Depois de enfrentarmos bombas que tentavam impedir a Greve Geral, os empresários do transporte provavelmente perceberam que muita gente na cidade aderiu à greve ou não foi trabalhar por outros motivos e devem ter reduzido a frota nas ruas”, estima o diretor do Sinpro/RS e secretário adjunto da CUT-RS, Amarildo Cenci.
Foto: Igor Sperotto
Grande parte dos manifestantes eram estudantes e professores, preocupados com a crise nacional, com as cruéis expectativas em relação à reforma da Previdência e a dilapidação do ensino público, a exemplo da professora da Universidade de Brasília (UnB) Elizângela Carrijo, que aproveitou uma folga para participar dos protestos. Nesta sexta-feira foi o último dia do 28º encontro anual da Associação Nacional dos Programas de Pós-graduação em Comunicação (Compós), realizado em Porto Alegre. “Tem muita gente neste Brasil fazendo pesquisas maravilhosas nas universidades. Apesar de tudo o que estamos vivendo, tem muita coisa boa acontecendo. Eu participei dessa “balbúrdia” do Compós e volto pra casa muito feliz com a riqueza deste encontro”, avalia Elizângela, ironizando o termo utilizado pelo governo na tentativa de desqualificar a produção acadêmica das federais. A professora diz que anualmente são selecionadas dez pesquisas de todo o país, profundamente debatidas nesse congresso, que serve como uma troca de experiências e de informações sobre o que está sendo feito na academia brasileira. “Estou acostumada com congressos e volto realmente muito impressionada com os resultados”, avaliou em meio às manifestações.
Uma marcha saiu por volta das 17h da Faced, pela Sarmento Leite, Fernando Machado e Borges de Medeiros até a Esquina Democrática, onde já havia um grupo de manifestantes concentrado. Segundo o cálculo de alguns fotógrafos que trabalhavam no local, às 18h cerca de 20 mil pessoas se reuniram no local. No trajeto, o trânsito foi interrompido, mas muitos ocupantes de veículos e pedestres que passavam pelo viaduto da Borges aplaudiam ou buzinavam, manifestando apoio aos manifestantes.
A tarde terminou com uma grande concentração de estudantes que, portando faixas de seus diretórios, gritavam palavras de ordem, especialmente contra Bolsonaro. Não faltaram também falas exaltando o trabalho do The Intercept, site de jornalismo independente do norte-americano Glenn Greenwald, que expôs mensagens secretas trocadas entre o ex-juiz e atual ministro da Justiça, Sérgio Moro, e o chefe da Lava Jato, Deltan Dallagnol, nas quais tramam estratégias para impedir a eleição de Luís Inácio Lula da Silva.
Foto: Divulgação
A Greve Geral mobilizou milhares de trabalhadores das mais diversas categorias em cidades do interior do Rio Grande do Sul, a exemplo de Santa Rosa, que promoveu uma Caminhada Luminosa no início da noite. Confira na galeria de imagens abaixo como foi a mobilização nas principais cidades gaúchas.