MOVIMENTO

Projeto de mineração não cabe no Rio Grande do Sul

O coordenador do Movimento pela Soberania Popular na Mineração destaca que a mineração no Brasil se dá na forma de saque. As empresas vêm, exaurem a mina e vão embora. O IDH nas regiões é baixíssimo
Por Gilson Camargo / Publicado em 12 de junho de 2019
Zonta: "Cinco milhões de pessoas entrarão em colapso, porque ou vão tomar água com mercúrio e dióxido de carbono ou vão comer comida envenenada"

Foto: Igor Sperotto

Zonta: “Cinco milhões de pessoas entrarão em colapso, porque ou vão tomar água com mercúrio e dióxido de carbono ou vão comer comida envenenada”

Foto: Igor Sperotto

O coordenador do Movimento pela Soberania Popular na Mineração, Márcio Zonta explica que 70% da atividade mineradora no estado gaúcho são controladas pelo capital internacional e que com o colapso da indústria carbonífera, EUA e China estão investindo na África e na América Latina como novos polos produtores de carvão. Isso, segundo Márcio Zonta, revela o porquê da proliferação de projetos de mineração para o Rio Grande do Sul, resultado também da saturação de outras áreas de mineração no território brasileiro. “Aqui nós temos incidência de ouro, cobre, zinco, titânio, fosfato, carvão, e como algumas áreas de mineração no Brasil entraram em colapso, as mineradoras começaram a migrar para outras regiões. E miraram agora o RS. Por essa potencialidade mineral”, afirma nesta entrevista.

Extra Classe – Isso transforma o estado em uma nova fronteira mineral?
Márcio Zonta – O serviço geológico brasileiro tem feito um trabalho específico no subsolo do RS com o objetivo de abrir uma nova fronteira mineral, para que o capital mineral continue acumulando e se expandindo. Essa região específica seria uma tentativa de criar um outro polo minerador do Brasil (além de Minas Gerais), com bastante intensidade. E aqui no RS é importante porque a parte logística está pronta. O projeto aqui é muito mais barato.

EC – Quem lidera esse processo?
Zonta – Esse é um projeto internacional de incidência norte-americana e chinesa. Eles estão discutindo com esse projeto o colapso ou as guerras que nós tivemos por energia nos últimos tempos, EUA agora com a Venezuela, Irã e Afeganistão. Em meio a essa guerra pelo petróleo, que é o grande gerador de energia, surgem outras alternativas de fontes: gás e carvão. Essas três matrizes detêm 90% da geração de energia mundial. Se há uma guerra pelo petróleo, há especialistas dizendo que nós vamos inaugurar agora a guerra pelo carvão. Essas potências mundiais que não vão baixar sua produtividade e o seu nível de consumo de energia sairão pelo mundo e aí vamos ter África e América Latina para essas minas de carvão.

EC – Mesmo o carvão de baixa qualidade que predomina no estado?
Zonta – É de baixa qualidade, mas fornece energia. China e Estados Unidos comprariam essa energia. A extração do carvão, no caso, está associada a um polo carboquímico, de expansão e fornecimento de energia. Então eles comprariam, porque estão fechando parte do processo poluidor deles da indústria do carvão.

EC – Por que o estado não comporta os impactos da Mina Guaíba?
Zonta – Como a mineração no Brasil se dá na forma de saque, as mineradoras vêm, exaurem a mina e vão embora. Os Índices de desenvolvimento Humano (IDH) dessas regiões são baixíssimos. Isso porque as empresas não pagam o ICMS que é o principal imposto pela exportação. É uma transferência da renda pública para o capital mineral. Essa região do RS é específica, uma região produtora de alimentos para a sociedade gaúcha e para outras partes do país. Nós estamos afirmando que esse projeto é incompatível com a agricultura camponesa, familiar e orgânica. Quem vai produzir comida para o RS? Quem vai produzir comida para Porto Alegre? Então, não se trata somente da disputa pelo território. Essa região deve comportar 5 milhões de pessoas, então são 5 milhões de pessoas que entrarão em colapso, porque ou vão tomar água com mercúrio e dióxido de carbono ou vão comer comida envenenada. O nível de câncer da cidade e da região passa a ser um dos maiores, isso aconteceu em Catalão (GO) com o processo neuroquímico do fosfato. É incompatível. Pega o Delta do Jacuí, um projeto de mineração que fura o lençol freático e começa a contaminar toda a água da região. Pelas características da Bacia Geográfica do Delta do Jacuí, essa contaminação vai longe.

EC – Um agravante à contaminação por agrotóxico que já começa a inviabilizar a produção de alimentos em várias regiões.
Zonta – Isso mesmo. Somado ao agrotóxico da porção Norte do estado. Se o agronegócio da região que não produz alimento para a nação e nem para o RS fosse pagar o ICMS isento na Lei Kandir de 1996, ele passaria aos cofres públicos R$ 40 bilhões. A mineradora, até agora, parece que ofereceu R$ 4 bilhões, números que a gente nem sabe se existem, para gerar 2 mil empregos. Como é que vai desestabilizar uma área com 4,5 milhões e meio de pessoas pra arrumar 2 mil empregos. Então, é um projeto que não cabe, nem ambientalmente, nem socialmente para essa região.

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