MOVIMENTO

Mulheres indígenas e camponesas ocupam Brasília

Começaram a chegar em Brasília nesta sexta-feira, 9, as participantes da 1ª Marcha de Mulheres Indígenas, que tem como tema “Território: nosso corpo, nosso espírito”
Por Cristina Ávila / Publicado em 9 de agosto de 2019
Saúde, alimentação e proteção são pautas destacadas pelo movimento

Foto: Andressa Zumpano| CPT-MA

Saúde, alimentação e proteção são pautas destacadas pelo movimento

Foto: Andressa Zumpano| CPT-MA

A mobilização deverá trazer 2 mil indígenas de 100 povos, de todas as regiões do país, garantiu a comissão organizadora, em coletiva na manhã desta sexta. Na próxima quarta-feira, 14, elas se juntam à 6ª Marcha das Margaridas, organizada por camponesas, e deverão somar pelo menos 25 mil manifestantes, que se unem contra a política de extinção de direitos constitucionais implementada pelo Executivo e Legislativo.

“Submissão não é cultura. Estamos aqui para desmistificar a ideia de que nós mulheres indígenas não participamos desta luta, e mostrar que estamos preparadas para assumir qualquer espaço”, exclamou Sônia Guajajara, que concorreu com Guilherme Boulos à presidência da República pelo PSol. “Não é à toa que fizemos parte desta composição no ano passado, e que temos uma representante na Câmara dos Deputados e uma mulher na coordenação geral da Coiab”, citou ela.

Sônia Guajajara se referia à Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira. Essa é a maior organização indígena do Brasil, criada em 1989, representando 160 povos, e que tem como coordenadora geral Francinara Soares Baré, a Nara Baré, a primeira a assumir essa liderança. Também se referiu à advogada Joenia Wapichana (Rede), a primeira mulher indígena a ocupar uma vaga na Câmara dos Deputados e também a primeira a se formar em direito no país. Ela foi ainda a primeira advogada indígena a se pronunciar no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), no processo de definição dos limites da Reserva Raposa Terra do Sol (RR), em 2008.

Junto com Sônia Guajajara (MA), Cristiane Julião Pankararu (PE) e Célia Xakriabá (MG), a representante da região Sul, Nyg Kiutá Kaingang, da Terra Indígena Apucaraninha (PR), compôs a mesa da coletiva à imprensa.

Foto: Cristina Ávila

Junto com Sônia Guajajara (MA), Cristiane Julião Pankararu (PE) e Célia Xakriabá (MG), a representante da região Sul, Nyg Kiutá Kaingang, da Terra Indígena Apucaraninha (PR), compôs a mesa da coletiva à imprensa.

Foto: Cristina Ávila

O MACHISMO NO SUL – “O machismo nas aldeias é mais uma das epidemias trazidos pelos europeus para nossos povos. Principalmente no Sul, foi a partir do SPI (Serviço de Proteção ao Índio, órgão do governo federal que antecedeu a Fundação Nacional do Índio/Funai) que se quebrou a complementaridade de homens e mulheres”, o que significa a parceria de ambos em todos os aspectos da vida.

Nyg Kiutá afirma que o machismo surgiu por imposição externa. “Mulheres, homens e crianças kaingang foram escravizados em grandes lavouras por chefes de postos e capitães do SPI, configurações que até hoje estão em algumas organizações indígenas do Sul. Homens eram colocados como fiscais ou carrascos do próprio povo. Aí é que surge essa quebra da complementaridade entre homens e mulheres. Sempre foram elas que gerenciaram as políticas de territórios e a própria construção de lideranças, inclusive pela força da espiritualidade e da nossa cosmopolítica. A quebra disso é uma imposição do SPI, um órgão militar de cunho patriarcal branco”, enfatizou.

“O momento é de protagonismo feminino, nos vestimos com a garra da força da natureza, mas nosso inimigo é o Estado que não nos reconhece como povos originários e nos impõe uma arma que agora não é um (revólver calibre) 38, mas um 17”, afirma Célia Xakriabá, liderança da Terra Indígena Xakriabá, de Minas Gerais.

Ela refere-se ao presidente Jair Bolsonaro, antiindígena declarado, que ameaça os povos indígenas com “nenhum centímetro de terra”, fazendo manobras político-administrativas para impedir a demarcação de territórios tradicionais, promovendo cortes fundamentais para o desmantelamento de toda a estrutura estatal de proteção aos direitos indígenas e inclusive promovendo discursos que tem levado à uma crescente invasão de territórios, exploração de recursos naturais das áreas indígenas e mortes, tanto por conflitos como por doenças.

PROGRAMAÇÃO – As mulheres acabaram de fechar negociações com o Governo do Distrito Federal para a localização do acampamento, que será fixado em frente à Fundação Nacional de Artes (Funarte), no Eixo Monumental, região central de Brasília. Na manhã hoje, além da coletiva foi feita uma cerimônia de comemoração ao Dia Mundial dos Povos Indígenas, e algumas mulheres acompanharam um ato e audiência pública que aconteceu no Congresso sobre mineração. A programação não está totalmente fechada, mas haverá momentos culturais e de debates políticos.

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