Estatuto da Igualdade Racial completa 10 anos
Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado
Nesta segunda-feira, 20, o Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12288/2010) completa 10 anos. Devido à pandemia do novo coronavírus, o autor do projeto que deu origem à legislação, senador Paulo Renato Paim (PT-RS), pediu que a celebração da data ocorra em Sessão Especial no próximo dia 20 de novembro caso os trabalhos do Congresso Nacional voltarem a ser presenciais.
Para o parlamentar, no entanto, o adiamento da comemoração não é a única consequência da Covid-19. A enfermidade que já infectou mais de 2 milhões de brasileiros e matou cerca de 80 mil evidenciou ainda mais as desigualdades sociais e raciais que persistem no Brasil.
“Mesmo diante de dados subnotificados, sabemos que os pobres e os negros são as maiores vítimas da pandemia que está aí”, aponta Paim. Para dar ainda mais solidez a essa informação que muitas vezes é citada de forma empírica, o senador gaúcho apresentou uma proposta para obrigar que os hospitais realizem o cadastro da raça, idade, gênero, existência de deficiências físicas e a localização de todos os pacientes do coronavírus.
Para Paim, esse cadastro vai medir o impacto e o alcance da doença em todos os grupos que compõem a sociedade brasileira e permitir que o poder público dê respostas mais rápidas para os pacientes.
Um avanço a se consolidar
Paim ressalta que, apesar da necessidade de aperfeiçoamentos, o Estatuto da Igualdade Racial foi um grande marco e ainda é uma das leis sobre igualdade mais avançadas do mundo. “O Estatuto é um conjunto de ações afirmativas reparatórias, compensatórias que garante o direito à saúde, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer; o direito à liberdade de consciência de crença e à moradia, o direito ao trabalho, aos meios de comunicação”, elenca.
Ele entende que é a norma jurídica mais completa para a promoção da igualdade racial, mas que precisa ser “implantada por todos e todas”.
O senador provoca: “A cada 23 minutos um jovem negro é morto; em 24 horas, 13 mulheres são mortas e a maioria são negras. Com 56% da população brasileira negra, quase não temos representação no parlamento. Quem está nos subempregos? Quem está no trabalho escravo? Quem recebe os piores salários? São negros! Podemos e vamos encarar o racismo”.
Para atuar na complementação do Estatuto, ainda aguardam análise outras três propostas do senador. Uma insere na Lei o direito à propriedade definitiva das terras ocupadas por quilombolas, outra permite que doações para fundos para direitos indígenas, de igualdade racial e assistência social sejam deduzidas no Imposto de Renda; e a terceira estabelece o Fundo Nacional de Promoção da Igualdade Racial.
DIFICULDADES – Mário Theodoro, ex-secretário executivo da Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (2011-2013) entende que o Estatuto é um marco legal fundamental. “É uma boa referência. É uma peça a ser utilizada numa política de igualdade racial”, diz.
No entanto, para Theodoro, poucas melhorias reais aconteceram para a população negra, mesmo depois da promulgação do Estatuto. Em sua opinião, isso ocorre devido ao racismo velado da sociedade. “A questão do racismo ainda é muito mal resolvida no Brasil”, aponta. Doutor em Economia e autor de diversas publicações sobre desigualdade racial no país, Theodoro avalia que a sociedade brasileira ainda não está disposta a admitir o preconceito existente e combatê-lo.
RESISTÊNCIAS ÀS COTAS RACIAIS – Um dos artigos do Estatuto que trouxe resultados de fato foi o que estabelece a adoção de ações afirmativas para acesso ao ensino superior e ao trabalho. Números do IBGE revelam que a presença de negros nas universidades dobrou entre 2011 e 2019, passando de 9% para 18%.
Mesmo assim, lembra Theodoro, de forma diferente das cotas sociais, as cotas raciais enfrentaram grande resistência entre os brasileiros. Na realidade, ainda enfrentam. Para o ex-secretário, é o racismo mais uma vez se manifestando. “O problema é que a cota veio para mudar a cor da elite”, conclui.