Fórum Social Mundial 2021 termina neste domingo
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No encerramento da programação serão definidas ações concretas e as diretrizes para o FSM 2022, no México
Foto: Maude Touchette/ Arquivo
A vigésima edição do Fórum Social Mundial, movimento de demarcação de ideias e articulação política entre organizações e movimentos sociais e palco de propostas para a transformação das condições de vida no planeta, termina neste domingo, 31, após uma semana de atividades virtuais envolvendo mais de 10 mil participantes e 1.280 organizações de 144 países.
O Fórum Social Mundial 2021 começou oficialmente em 23 de janeiro de 2021, reafirmando a proposta original de que “um outro mundo é possível, urgente e necessário”. O lançamento virtual devido à pandemia de covid-19 foi marcado por uma Marcha Virtual Global, evento político e cultural que precedeu uma programação sob as bandeiras da justiça social, democracia e direitos fundamentais.
A conjuntura mundial de ascensão da extrema-direita e enfraquecimento dos movimentos sociais esvaziaram o evento, na avaliação do sociólogo português Boaventura de Sousa Santos, um dos convidados desta edição. “O Fórum Social Mundial está moribundo”, disse, referindo-se à falta de representação de muitos países. “É muito pouco para um fórum mundial que mais da metade (dos participantes) são de um mesmo país. É bom que tenha o Brasil, mas o Fórum tem dificuldade de trabalhar”, disse em entrevista ao programa Revista Brasil TVT, na segunda-feira, 25.
“Um dos principais desafios é como fazer do FSM não apenas um evento. Como transcender a ação e a articulação entre os diversos movimentos globais, e que eles realmente influam em nossa realidade”, afirmou a mexicana Rosy Zúñiga, secretária geral do Conselho de Educação Popular da América Latina e Caribe. Ao alertar que vivemos “uma situação terrível de desaparecimento de mulheres, indígenas, estupro de crianças”, destacou que as mortes e perseguições de defensores dos direitos humanos no México, Colômbia, Paraguai e Brasil mostram que proteger seus territórios ‘com corpo e palavra’ se tornou muito perigoso.
Programação multidisciplinar e intersetorial
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Foto: Maude Touchette/ Arquivo
Os diálogos foram estruturados em torno dos Espaços Temáticos: Guerra e Paz; Justiça Econômica; Educação, Comunicação e Cultura; e Feminismos, Sociedade e Diversidade. Os grandes painéis seguiram com os temas dos Povos Indígenas e Ancestrais; Democracia, Justiça Social e Clima, Ecologia e Meio Ambiente.
Violência de gênero
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Meral Çiçek relatou que lideranças femininas vêm sendo perseguidas e assassinadas na Turquia de Erdogan
Foto: Reprodução
Na quarta-feira, 27, ativistas pela igualdade de gênero de países como Índia, Curdistão, Estados Unidos, Saara Ocidental, Peru denunciaram a “aliança perversa entre capitalismo, patriarcado e colonial idade” sobre os corpos das mulheres em todo o mundo, independente das diferenças culturais.
“A lógica patriarcal, colonialista e invasora, que utiliza o Marrocos e seus aliados, e também a União Europeia, o estado da França, da Espanha e dos Estados Unidos, estão silenciando as mulheres saraus. Eles as intimidam, as violam para silenciar as ativistas”, ressaltou a doutoranda em Estudos Feministas Cheja Addallahi no painel “Feminismos revolucionários para outros mundos possíveis e necessários”.
Meral Çiçek, responsável pelo Gabinete de Relações das Mulheres Curdas (Repak), relatou que lideranças femininas vêm sendo perseguidas e assassinadas na Turquia controlada pelo ultradireitista Recep Erdogan.
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Rose Brewer lembrou os assassinatos de George Floyd e Marielle Franco
Foto: Gavin Schuster/CLAgency student/ UMN/ Divulgação
O Estado exerce a violência contra aqueles que considera cidadão com menos direitos, assinalou Rose Brewer, professora e pesquisadora da desigualdade racial da Universidade de Minnesota (EUA) e ativista do movimento Black Lives Matter.
Ela citou o assassinato de George Floyd, executado pela polícia de Minnesota em maio de 2020, e de Marielle Franco, executada por milicianos no Rio de Janeiro, em março de 2018.
O encerramento da programação faz um movimento em direção à articulação comprometida entre causas sociais e práticas políticas. O esforço de convergência das organizações e movimentos participantes do FSM foi pauta das assembleias dos movimentos no penúltimo dia do FSM2021.
Neste domingo, a Ágora dos Futuros oferecerá um espaço para os portadores de iniciativas que alimentarão um Calendário de ações concretas e conjuntas para todo o ano. Finalmente, o evento de encerramento lançará o processo que levará à próxima edição planetária do FSM, a ser realizada no México em janeiro de 2022.
Aprendizados do primeiro FSM on-line
Embora esta edição tenha enfrentado as limitações do modo virtual, os organizadores do FSM apostaram na superação desse desafio e de aproveitar a experiência sem precedentes para explorar novas formas de compartilhamento. Um exemplo é a abordagem das novas tecnologias e formas de participação internacional.
O exercício de aprendizagem sobre modos de organização e reuniões virtuais deve ser utilizado em futuras edições do FSM. A proposta é garantir o acesso inclusivo e equitativo aos processos e diálogos, sejam on-line ou presenciais, e otimizar a visibilidade e convergência das ações e iniciativas de resistência e transformação realizadas pelos participantes.
Espaço de articulação para a resistência
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Marcha da primeira edição do FSM, em Porto Alegre, que em 2001 despontava como referência em experiências sociais, políticas e de governos no contrafluxo das políticas neoliberais
Foto: FSM Memória
Criado em 2001, num contraponto ao Fórum Econômico de Davos, o Fórum Social Mundial se firmou desde a primeira edição como espaço de articulação dos movimentos e organizações sociais em busca de resistências e alternativas ao modelo da globalização neoliberal.
Na sua Carta de Princípios, o primeiro FSM define a sua vocação como “espaço internacional para a reflexão e organização de todos os que se contrapõem à globalização neoliberal e estão construindo alternativas para favorecer o desenvolvimento humano e buscar a superação da dominação dos mercados em cada país e nas relações internacionais”.
A primeira edição foi realizada em Porto Alegre, que em janeiro de 2001 despontava para o mundo como referência em experiências sociais, políticas e de governos que estavam no contrafluxo das políticas neoliberais.
De 1989 a 2005, a capital gaúcha foi governada de forma alternada por prefeitos do Partido dos Trabalhadores – Olívio Dutra, Tarso Genro, Raul Pont e João Verle –, que criou o Orçamento Participativo, sistema de gestão popular até hoje replicado em diversas partes do mundo.
Porto Alegre também foi palco da segunda, terceira e quinta edição do Fórum, em 2002 e 2003. Em 2004, o evento foi realizado em Mumbai (Índia).
Em 2006, o FSM adotou a forma policêntrica em Bamako (Mali), Karachi (Paquistão) e Caracas (Venezuela). O continente africano recebeu o FSM pela primeira vez em 2007, na cidade de Nairobi, Quênia. A oitava edição foi marcada em 2008 pelas Jornadas Mundiais de Mobilização em todo o planeta com o objetivo de disseminar e descentralizar o FSM – formato que vigorou até 2020. A edição virtual adotada neste ano devido à pandemia deverá forjar um modelo híbrido para o FSM 2022, a ser realizado no México.