Povos indígenas protestam em Brasília contra avanço da mineração em seus territórios
Foto: Tiago Miotto/ Cimi
Indígenas dos povos Xerente, Krahô, Krahô Takaywra, Xokleng, Kaingang, Terena, Guarani e Kaiowá, Kinikinau, Munduruku, Tupinambá e Arapium estão em Brasília e realizam um ato na manhã desta segunda-feira, 19 de abril, Dia do Índio, em defesa de seus territórios e direitos constitucionais.
Os povos manifestam-se contra a proposta do governo federal de legalizar a mineração em Terras Indígenas (TIs) e contra o Projeto de Lei (PL) 191/2020, apresentado ao Congresso pelo governo de Jair Bolsonaro.
O PL do garimpo altera os artigos 176 e 231 da Constituição para estabelecer as condições específicas para a realização da pesquisa e da lavra de recursos minerais e hidrocarbonetos e para o aproveitamento de recursos hídricos para geração de energia elétrica em terras indígenas e institui a indenização pela restrição do usufruto de terras indígenas.
Foto: Fábio Nascimento /MNI
Foto: Fábio Nascimento /MNI
As lideranças também se posicionam contra o Marco Temporal, que pretende impor restrições ao direito a terras pelos povos originários a partir do julgamento no STF do Recurso Extraordinário 1.017.365 relativo a um processo contra uma parcela da demarcação da terra Lá Klaño, do povo Xokleng, de Santa Catarina.
A mobilização, realizada no Dia dos Povos Indígenas, reúne cerca de 130 indígenas de seis estados: Tocantins, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Mato Grosso do Sul e Pará. Adotando as medidas de proteção sanitária, o grupo se encontra na Praça dos Três Poderes para realizar um ato com distanciamento social.
Com o aumento das invasões nos territórios e as investidas do governo de Jair Bolsonaro em favor dos interesses de grandes empresas e investidores da mineração e do agronegócio, os indígenas viram-se obrigados a viajar até a capital federal, marcando posição contra os projetos de exploração das terras indígenas e em apoio às decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) que determinaram a retirada dos invasores de suas terras.
Foto: Tiago Miotto/Cimi/Divulgação
As informações de que garimpeiros e entidades de fazendeiros, aliadas ao governo federal, estariam arquitetando atos nesta semana em Brasília para pressionar o Congresso pela aprovação do PL 191 e atacar o STF, em função das recentes decisões favoráveis aos povos indígenas, também serviram de motivação para a mobilização emergencial.
Os indígenas denunciam, ainda, a tentativa destes grupos políticos e econômicos interessados na exploração de suas terras de constranger os ministros do STF a aderir à tese ruralista do marco temporal no processo de repercussão geral sobre direitos indígenas.
Foto: Tiago Miotto/Cimi/ DIvulgação
Além do PL 191, os indígenas manifestam-se contra propostas que pretendem impedir ou limitar o direito constitucional à demarcação de suas terras tradicionais, como o PL 490/07 e a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215/00.
Para baixar o documento divulgado pelos povos que participam da mobilização.
Medidas Sanitárias
Ao decidir pela vinda a Brasília, as delegações indígenas estabeleceram uma série de protocolos sanitários de prevenção à covid-19, como o uso de máscaras, cuidados de higiene e distanciamento social. Todos os integrantes das delegações já tomaram duas doses da vacina e não apresentam doenças pré-existentes.
Ao retornar aos seus territórios, os indígenas irão cumprir quarentena de isolamento para evitar uma possível contaminação.
Pressão sobre as terras indígenas
Há poucos dias, conforme noticiado pela imprensa, alguns indígenas teriam sido instigados pelo próprio Presidente da República a pressionar autoridades, instituições e Poderes da República a favor do agronegócio e da mineração.
Na semana passada, o superintendente da Polícia Federal no Amazonas, Alexandre Saraiva, enviou à Suprema Corte uma notícia-crime contra o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, na qual aponta possibilidades de ocorrência de organização criminosa e o crime de dificultar a ação fiscalizadora do Poder Público em questões ambientais.
Em 2020, após sua presença em Jacareacanga (PA), que interrompeu uma operação de retirada de invasores da Terra Indígena Munduruku, alguns garimpeiros e indígenas foram transportados à Brasília em avião da Força Aérea Brasileira (FAB) para reuniões com o governo.
Em nota divulgada na semana passada, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) alerta para a possibilidade de garimpeiros e alguns indígenas pressionarem o Supremo. A Corte determinou recentemente, no âmbito da ADPF 709, apresentada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), que o Executivo cumpra a Constituição Brasileira e retire os invasores de ao menos sete Terras Indígenas: Yanomami (RR), Karipuna (RO), Uru-Eu-Wau-Wau (RO), Kayapó (PA), Trincheira Bacajá (PA), Munduruku (PA) e Araribóia (MA).
Dia para celebrar a resistência dos povos originários
Foto: Ricardo Stuckert
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e suas organizações regionais realizam atividades especiais em celebração ao Dia dos Povos Indígenas. A programação começou com ato simbólico no gramado da Esplanada dos Ministérios, em Brasília, e se estende até o fim da noite com várias atividades. A data é o início da semana Emergência Indígena do Acampamento Terra Livre – cuja programação segue até o dia 30 de abril.
O Dia do Índio foi uma data alusiva criada no Brasil por meio de um decreto do presidente Getúlio Vargas, em 1943. A adoção de 19 de abril como dia para celebrar a cultura dos povos indígenas do Brasil foi resultado de debates realizados no Primeiro Congresso Indigenista Interamericano em 1940, no México.
No entanto, de acordo com Dinamam Tuxá, coordenador executivo da Apib, o termo ‘índio’ remonta estereótipos sobre indígenas e, portanto, carrega racismo: “Ou seja, uma data com esse nome não alcança a diversidade dos 305 povos indígenas do Brasil e, ao romantizar a figura do indígena, invisibiliza os povos originários”, alerta.
O dia 19 de abril é celebrado pelos povos originários como o Dia dos Povos Indígenas. Nesta data, indígenas se organizam para demarcar politicamente na história nacional a trajetória de resistência desde a colonização, denunciando as violências sofridas diariamente, mas também fortalecendo a luta pela garantia de direitos fundamentais previstos na Constituição de 1988 e em tratados internacionais.
Não por acaso, 19 de abril é também o aniversário da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), organização que completa 32 anos e abrange nove estados da região a partir de uma rede que agrega associações indígenas de mulheres, juventude, professores, entre outros grupos. A Coiab é resultado de um processo de articulação política dos povos originários iniciado após a homologação da Constituição de 1988, com intuito de fortalecer a organização social dos povos indígenas da Amazônia.
Acampamento Terra Livre
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Tradicionalmente realizado no mês de abril para marcar o Dia dos Povos Indígenas, o Acampamento Terra Livre (ATL) chega à sua décima sétima edição – a segunda em formato online em decorrência da pandemia de Covid-19. Integrando as pautas e agendas de luta dos povos indígenas de todo o país, o ATL 2021 é marcado por uma mensagem sobre a força e celebração da ancestralidade.
Uma mobilização sobre a resistência indígena para movimentar as redes sociais, o lançamento da campanha “Quem matou Ari?” que busca justiça para o líder do povo Uru Eu Wau Wau assassinado há um ano, a segunda edição do Festival Arandu e o lançamento do livro Vukápanavo – O despertar do Povo Terena para os seus direitos: movimento indígena e confronto político de Eloy Terena (coordenador jurídico da Apib) são alguns dos eventos promovidos neste 19 de abril. Toda a programação é transmitida ao vivo pelas plataformas on-line da Apib e das organizações envolvidas.
*Com informações do Cimi e Apib.