Dez direitos ameaçados e outros tantos
Foto: Cléia Viana /Câmara dos Deputados
Na última quinta-feira, 12, o presidente da Câmara dos Deputados Arthur Lira (PP-AL) e os deputados da base aliada do governo Jair Bolsonaro (ex-PSL) uniram forças para aprovar a Medida Provisória (MP) 1045, que propõe a retirada de direitos trabalhistas como férias e 13º salário. Até mesmo salários serão trocados por “bolsas”, conforme a medida. A matéria seguiu para avaliação no Senado.
“A desculpa é a de sempre: é preciso criar empregos para os jovens. A verdade é que a proposta é a volta do regime escravo no Brasil”, assegura a Central Única dos Trabalhadores (CUT) em seu site.
A proposta governista, se aprovada também pelos senadores, criará novos tipos de contratos de trabalho que autorizam ampla desproteção aos trabalhadores e o chamado trabalhador de segunda classe.
Sindicatos apostam na pressão
Sindicalistas agora lutam para sensibilizar os senadores para que não aprovem essa MP, que suspende direitos garantidos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), como a garantia de salário e carteira assinada, que justamente precisam de uma Proposta de Emenda à Constituição para serem alterados.
A realidade do atual Congresso é que para aprovar uma MP na Câmara, com ou sem jabutis que prejudicam os trabalhadores, como foi o caso da MP 1045, basta uma única votação, com maioria simples dos votos (257 deputados) a favor. O mesmo acontece no Senado, onde são necessários apenas 47 votos.
Já para aprovar uma PEC, é preciso votar duas vezes a proposta na Câmara e outras duas vezes no Senado. Em ambos os casos são necessários três quintos dos votos: 308 na Câmara e 49 no Senado.
Vale refeição esteve na mira das reformas
É justamente neste tempo que o movimento sindical está apostando para ocupar as ruas, as redes sociais e sensibilizar parlamentares. Essa pressão deu certo mediante a tentativa de retirada dos incentivos às empresas previstos no Programa de Amparo ao Trabalhador (PAT), que estava previsto no PL 2337/21, do Executivo.
No final de julho, depois de muita articulação da CUT, demais centrais, sindicatos e protestos dos trabalhadores, com a ajuda de parlamentares da oposição, Celso Sabino (PSDB-PA), relator da reforma do IR (Reforma Tributária), em tramitação na Câmara voltou atrás e disse que o incentivo ao vale-alimentação seria mantido e que a mudança sairia do texto.
Em meio a essas ações de pressão aos parlamentares, a CUT elaborou uma espécie de cartilha com os 10 principais ataques aos direitos dos trabalhadores que tramitam no Congresso em forma de PL, MP e PEC.
10 direitos dos trabalhadores sob ameaça
1 – Salário mínimo – O salário mínimo foi instituído em 1936 durante o governo de Getúlio Vargas. O objetivo era garantir um valor mínimo que cobrisse despesas básicas e a sobrevivência dos trabalhadores. Ao longo do tempo o valor ficou defasado e somente durante os governos do ex-presidente Lula e Dilma Rousseff é que foi implementada a Política de Valorização do Salário Mínimo proposta pela CUT, que Bolsonaro exterminou. Agora, quem ganha o mínimo tem, no máximo, reposição da inflação.
2 – 13° salário – O salário extra pago no fim de todos os anos foi uma conquista do movimento sindical que começou a valer na década de 1960, mas a luta já vinha de outros tempos. Já era pauta, por exemplo, da greve dos 300 mil, em 1953, que agitou São Paulo contra o aumento da inflação que vinha, durante os anos anteriores, penalizando os trabalhadores e acabando com o poder de compra dos salários.
3 – Férias – Também fruto da luta sindical, o direito ao descanso foi pauta da greve de 1917, deflagrada após o assassinato de um trabalhador pela polícia. A primeira lei de férias é de 1925 e garantia 15 dias de descanso remunerado. Em 1943, ao ser aprovada a CLT, veio a regulamentação das férias, estendendo o direito aos trabalhadores rurais. Em 1972 o direito foi ampliado aos trabalhadores domésticos. O período foi expandido para 20 dias em 1949. Somente em 1977, um decreto-lei do então presidente Ernesto Geisel, é que foi instituído o período 30 dias.
4 – Jornada de 8 horas por dia – De acordo com a CLT, o limite atual de tempo a ser trabalhado formalmente é 44 horas semanais, em jornadas de 8 horas por dia. A Constituição de 1934 fixou as jornadas desta forma e é assim desde então. O limite é de 48 horas semanais. O descanso semanal remunerado foi conquistado em 1949.
5 – Repouso semanal remunerado – As convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT) 14 e 106, ratificadas pelo Brasil, determinam de que a folga dos trabalhadores deve ser concedida, no máximo, no transcurso do período de sete dias. Após a reforma Trabalhista, aprovada em 2017 durante o governo Michel Temer (MDB-SP), foi regulamentada a jornada 12 x 36, em que o trabalhador pode trabalhar 12 horas e descansar nas 36 horas seguinte. Portanto, ficou autorizada a supressão do descanso intrajornada com a nova redação da CLT alterada pela Lei da Reforma Trabalhista. Por ser constitucionalmente garantido o descanso intrajornada, ainda há muita discussão a respeito da supressão deste intervalo nas jornadas 12×36.
6 – Seguro desemprego – Criado em 1986, o seguro-desemprego foi inspirado em um modelo europeu. Trabalhadores que forem demitidos sem justa causa e não estiverem recebendo benefícios (exceto a pensão por morte ou auxílio-acidente) têm direito ao seguro.
7 – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) – Foi criado em setembro de 1966 e passou a valer a partir de 1° de janeiro de 1967. O objetivo é proteger o trabalhador demitido sem justa causa, garantindo uma renda até ele conseguir recolocação profissional. Para o fundo, as empresas devem depositar 8% do salário do trabalhador, todos os meses, em uma conta especial, que poderá ser movimentada quando o trabalhador for demitido sem justa causa. Nesse caso, há ainda uma multa de 40% sobre o saldo do FGTS, que deve ser paga junto com a rescisão de contrato.
8 – Aposentadoria e pensões – Até meados da década de 1920, somente os trabalhadores ferroviários e alguns servidores públicos tinham direito a esse benefício. Naquela época era preciso ter 50 anos e 30 anos de serviço para conseguir a aposentadoria. Na década de 1930 os benefícios foram estendidos a outras categorias profissionais, mas somente em 1966 foi criado o então Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) que unificava o sistema previdenciário de todas as categorias e empresas. Em 1990, o INPS passou a ser chamado de Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). O Instituto é responsável também por outros direitos como o auxílio-doença para casos em que o trabalhador precisa se afastar de suas funções, o auxílio-acidente para trabalhadores que sofreram acidentes em decorrência do trabalho e as pensões a cônjuges e famílias de trabalhadores falecidos.
9 – Estabilidade de trabalhadores – A CLT prevê que não podem ser demitidos por um determinado período de tempo, os trabalhadores que se enquadram em alguns casos como gestantes, que têm estabilidade de cinco meses após a licença maternidade e os trabalhadores acidentados pelo trabalho, que não podem ser demitidos sem justa causa por 12 meses. Como conquistas em acordos coletivos de trabalho negociados pelo movimento sindical, em casos como dos metalúrgicos, o trabalhador acidentado tem estabilidade acidentária vitalícia. Sindicatos organizados e combativos, aliás, são responsáveis por inúmeras conquistas da classe trabalhadora e, por isso, sofrem perseguição por parte do governo Bolsonaro.
10 – Normas regulamentadoras sobre saúde e segurança nos locais de trabalho – A garantia de condições de segurança no trabalho também é lei. Existem várias normas na legislação atual que foram criadas e aprovadas ao longo dos anos. A Norma Regulamentadora 17 (NR-17), que dispõe sobre a ergonomia é um bom exemplo de norma aplicada a diversas categorias. Em um panorama geral, as NRs são discutidas no modelo tripartite (trabalhadores, empresas e governo), a partir das demandas observadas pelos sindicatos para defender os trabalhadores.
Outras ameaças
Conforme a CUT, há muitos outros direitos dos trabalhadores garantidos pela CLT, que são alvo de manobras parlamentares, mas que ainda podem ser modificadas, retiradas ou contratadas de forma precária: carteira de trabalho assinada desde o primeiro dia de serviço; exames médicos de admissão e demissão; repouso semanal remunerado (1 folga por semana); salário pago até o 5º dia útil do mês; primeira parcela do 13º salário paga até 30 de novembro e segunda parcela até 20 de dezembro; férias de 30 dias com acréscimos de 1/3 do salário; vale-transporte com desconto máximo de 6% do salário; licença Maternidade de 120 dias, com garantia de emprego até 5 meses depois do parto; licença paternidade de 5 dias corridos; horas-extras pagas com acréscimo de 50% do valor da hora normal; garantia de 12 meses em casos de acidente; adicional noturno de 20% para quem trabalha das 22h às 5 horas; faltas ao trabalho nos casos de casamento (3 dias), doação de sangue (1 dia/ano), alistamento eleitoral (2 dias), morte de parente próximo (2 dias), testemunho na Justiça do Trabalho (no dia), doença comprovada por atestado médico; aviso prévio de 30 dias, em caso de demissão.
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