ICL: educação e informação que dão lucro

Padre Júlio Lancellotti, Leonardo Boff e Eduardo Moreira na sede do ICL, em São Paulo
Foto: Rafael Donatiello/DivulgaçãoEm uma época em que discursos de ódio e desinformação rendem muito dinheiro para canais de extrema direita via monetização de sites da internet, uma instituição privada com princípios humanistas e progressistas, o Instituto Conhecimento Liberta (ICL), completou três anos de existência desafiando a nova lógica das redes.
Aulas abertas com renomados pensadores, registrando entre 25 mil e 45 mil acessos simultâneos e que já foram assistidas por mais de 5 milhões de pessoas; 40 mil alunos pagantes e 25 mil bolsistas integrais oriundos de movimentos populares; mais de 210 cursos disponíveis aos assinantes.
Só esses números já dariam para impressionar, mas a plataforma de cursos livres do Instituto Conhecimento Liberta, o ICL, não para, nem pretende parar por aí. Depois de um ousado investimento em noticiosos via streaming lançado em maio de 2022 e que já bate recordes de audiência, deixando para trás Band News, CNN Brasil, Jovem Pan, Record e UOL, já há espaço para sonhar em voos maiores, como um curso de nível superior em Ciências Sociais para abrir as portas de uma série de pós-graduações na área.
“Nosso sonho também, além de expandir nossa plataforma para fora do Brasil e ainda mais os nossos projetos solidários com salas de estudo, é ter um espaço, uma concessão, uma TV aberta”, diz Rafael Donatiello, cofundador do ICL, ao lado do economista Eduardo Moreira.
Engenheiro de formação, com larga experiência em Marketing Digital, Donatiello é o responsável pela administração do dia a dia da empresa que – não esconde – tem fins lucrativos e um faturamento estimado em R$ 35 milhões por ano.
Se a posição dele na organização equivale a, na linguagem corporativa, um CEO (diretor executivo), seu sócio, Moreira, faz a função de chairman, presidente do Conselho de Administração.
Só que, no caso do ICL, o Conselho de Administração foge à regra de outras empresas privadas.

Para a distribuição das bolsas, há uma rede de parceiros afinada com os seus propósitos. São mais de 60 instituições, como Educafro, UNE, CUT, MST, Instituto Padre Jósimo e Rede da Maré
Foto: Beatriz Fávaro/DivulgaçãoNo lugar de experientes, frios e bem remunerados homens de negócios, entusiasmados intelectuais e ativistas de pensamento progressista se dedicam, de forma voluntária, para ajudar nos rumos da iniciativa.
A possível exceção, João Paulo Pacífico, não foge à regra do Conselho que foge à regra. Após ter feito fortuna no mercado financeiro, ao dizer que já teria acumulado muito patrimônio em sua vida e chegado a um momento em que não faz sentido ter mais dinheiro, ele decidiu doar sua empresa para transformá-la em uma ONG de impacto social.
O teólogo e filósofo Leonardo Boff, que tem assento ao lado de Pacífico no conselho do ICL, não mede elogios à plataforma.
“Eu apoio a iniciativa porque ela é libertadora, porque é revolucionária. Ela realiza aquilo que é o ideal dos iluministas: colocar todo o conhecimento possível na enciclopédia para todo o povo”, reflete, ao destacar o que considera valores irrisórios.
Boff ainda lembra a abertura que a plataforma dá aos diversos níveis de saber que existem hoje.
“Cobre todos os campos da realidade sobre a qual há diferentes ciências de uma forma extraordinária, cuidadosa, sempre escolhendo as melhores cabeças para fornecer as aulas”, afirma.
Além de Pacífico e Boff, o conselho do ICL conta com a diretora da Oxfam Brasil, Katia Maia, o coordenador da Educafro, Frei David dos Santos, o escritor, professor e ativista indígena Daniel Munduruku, a jornalista Heloísa Villela, o professor de História Contemporânea na PUC-Campinas Lindener Pareto e o sociólogo e pesquisador Jessé Souza.
Formada em 2020, resultado de uma espécie de fusão da agência R2 Marketing Digital, de Donatiello, com a Insight Trading Tips Consultoria Empresarial, de Moreira, a empresa já estava indo muito bem com o Investidor Mestre, seu único curso até então, criado pelo banqueiro, antes mesmo do surgimento do ICL para educação financeira.
Foi aí que, na metade do ano, os empreendedores, com o objetivo de fazer um projeto que fosse ainda mais acessível, que democratizasse o ensino e que desenvolvesse as pessoas em outros campos, iniciaram conversas com Jessé Souza e outras personalidades do mundo acadêmico, como o ex-ministro da Educação Renato Janine Ribeiro, a jurista Gisele Cittadino e Leonardo Boff.
Donatiello recorda que, com a decisão tomada de implementar a plataforma, Souza cravou: “Vamos desenvolver então um projeto que vai ser responsável pelo desenvolvimento integral humano, que tem três pilares: o Cultural, o Espiritual e o Profissional”.
Assim, no âmbito cultural, a proposição do ICL é conhecer e compreender a jornada da humanidade como sociedade para transformá-la; no espiritual, fortalecer aquilo que sustenta essa caminhada e, por final, no profissional, oferecer o aprendizado das ferramentas mais importantes do mercado de trabalho para aumentar a empregabilidade, a remuneração e acelerar a evolução nas carreiras.

O sociólogo e pesquisador Jessé Souza é o reitor do ICL
Foto: Cláudia Araújo/DivulgaçãoAgora, Jessé está no papel de reitor do ICL. Ele recorda que tudo ainda retroage ao ano de 2018, quando conheceu Eduardo Moreira. “A gente conversou bastante sobre os desafios para o país”, diz.
Uma indagação, portanto, já pairava no ar e está na frase do sociólogo que sintetizou os encontros com o economista: “Como é que a gente vai restituir a inteligência roubada do povo brasileiro?”.
Três anos após o lançamento da plataforma, mais um passo é dado. Já está no Ministério da Educação (MEC) uma solicitação para que o ICL instaure um curso de graduação híbrido de Ciências Sociais.
A partir disso, explica Souza, “nossa ideia é construir uma gama de especializações que possam habilitar as pessoas a entender mudança climática, racismo, como se cria a desigualdade, como se ganha, como se é menos penalizado pelo mercado financeiro, como é que você pode gerir melhor sua vida, enfim, uma série de temas que têm a ver com um dos aspectos do tripé do ICL, que é um conceito de construir uma concepção crítica para uma sociedade progressista, avançada, igualitária”, completa.
Modelo solidário de negócio

Equipe do ICL Notícias no Estúdio de São Paulo
Foto: Beatriz Fávaro/DivulgaçãoAlém dos pilares, três premissas também foram elencadas para o sucesso da plataforma, de acordo com Donatiello.
“A premissa número um é que ela deveria custar menos de R$ 50. Ou seja, menos de 1% do que custa uma universidade de ponta, com o mesmo nível de professores. A segunda, é que o professor deve ganhar até dez vezes mais. Então, naquele momento, os professores, por hora-aula, estavam ganhando R$ 50, R$ 70 e nós decidimos pagar de R$ 500 a R$ 700 a hora-aula”, informa.
Uma coisa é óbvia. Não são só os valores que atraem, entre outros, docentes como Miguel Nicolelis, Marilena Chauí, a filosofa norte-americana Nancy Fraser, o sociólogo alemão Wolfgang Schluchter e Noam Chomsky, considerado pelo The New York Times o mais importante intelectual vivo no mundo.
A terceira premissa previa pelo menos 2 mil alunos para o projeto funcionar e foi batida no segundo dia após o lançamento.
“Foram 3 mil alunos. No primeiro mês, mais de 5 mil alunos. Então, deu certo, né?” , comemora.
Hoje, entre os 65 mil alunos inscritos na plataforma, a iniciativa do ICL conta com assinantes em 61 países aptos a acessar seus cursos, que vão do ensino de Idiomas (inglês, chinês, francês, espanhol, italiano, alemão e japonês), Excel, História, Filosofia, Educação Financeira, Negócios, entre outros.
Os valores, conforme uma brincadeira interna no ICL, custam menos do que um sanduíche. São mensalidades de R$ 47 no Plano Essencial e R$ 62 no Solidário, que leva esse nome porque garante bolsas integrais para alunos sem condições financeiras, os quais hoje somam 25 mil.
Para a distribuição das bolsas, há uma rede de parceiros afinada com os seus propósitos. São mais de 60 instituições, como Educafro, UNE, CUT, MST, Instituto Padre Jósimo e Rede da Maré.
Todas estão entusiasmadas com o sucesso alcançado; com as ações sociais como a instalação de salas de aula para populares, como o projeto-piloto iniciado com o padre Júlio Lancellotti, que trabalha com a população de rua de São Paulo, entre outras.
Notícia sem rabo preso

O jornalista Chico Pinheiro é um dos nomes de peso do ICL Notícias
Foto: Beatriz Fávaro/DivulgaçãoOutra ação, em especial, tem se destacado ultimamente: os investimentos feitos em noticiosos via streaming.
Inserido na lógica de intervenção no espaço público, está o ICL Notícias, que começou com uma edição das segundas às sextas-feiras, no período da manhã em maio de 2022, já conta com uma segunda edição, das 19 às 20 horas, e o Desperta ICL, das 7 às 8 nas manhãs.
A independência da programação, sem propagandas e patrocinador, trouxe outro seleto grupo de profissionais para gravitar em torno do ICL.
São profissionais da imprensa como Xico Sá, Cristina Serra, Juca Kfouri, Jamil Chade, Chico Pinheiro e Leandro Demori.
A audiência da programação do ICL já ultrapassa 20 milhões de visualizações por mês no Youtube e sem o mecanismo de monetização ativado. Isso, destaca o CEO do ICL, é para que haja total independência e que não seja permitida a promoção de empresas e produtos que não estejam dentro dos princípios da organização.
“Com isso, somos o maior canal de notícias em audiência do mundo sem patrocínio, sem monetização, sem investidores e sem rabo preso. Lembrando que, com monetização ativa, sem dúvida, nossos vídeos seriam mais sugeridos ao público e isso aumentaria a visualização”, completa Donatiello.