MST só deixará sede do Incra mediante novos assentamentos
Foto: César Fraga
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Desde o começo de dezembro, cerca de 260 famílias de agricultores sem-terra estão acampados na sede do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), em Porto Alegre, à espera de uma Medida Provisória (MP) que conceda terras a pelo menos uma parte dessas famílias.
Sob o lema “Natal com terra”, agricultores provenientes de todas as regiões do estado só sairão do pátio e de parte das dependências da sede do Incra, quando novos assentamentos forem autorizados. “Estamos aguardando a votação de uma MP que libera recursos para pelo menos uma das três áreas que estão em vias de se transformarem em assentamentos. A área que acreditamos será liberada primeiro fica na região das missões, mais especificamente Itacorubi. Mas também tem uma área aqui na região metropolitana e outras na região central e Sul. Em todas essas regiões já temos pessoas acampadas aguardando assentamento”, explica João Onofre Sziminski, da direção estadual do MST.
Conforme Sziminski, atualmente há 1.600 acampados no RS e a expectativa seria contemplar de imediato uma área ou duas, sendo necessário pelos menos que haja terras para 160 famílias, para que os manifestantes deixem as dependências do Incra. A expectativa é que novas terras sejam concedidas até março e mais uma parte em agosto.
Foto: César Fraga
De acordo com Onofre, desde dia 3 de dezembro, início da vigília do MST no Incra, as direções nacional e regional da autarquia tiveram várias audiências com os manifestantes do Movimento de Trabalhadores Sem Terra (MST) que estão acampados no pátio da autarquia. As tratativas ocorrem no gabinete do Incra/RS, com direção nacional participando on-line.
Outra reivindicação dos manifestantes é maior agilidade na obtenção de novas áreas para a reforma agrária no Rio Grande do Sul, visando tanto o assentamento de famílias acampadas, quanto a realocação de famílias de áreas de reforma agrária inundadas nas enchentes.
As vistorias para aferição de produtividade estão suspensas no estado, em razão das situações de emergência decretadas com a estiagem, no ano passado, e com as enchentes, este ano.
Desta forma, a busca de áreas no Rio Grande do Sul voltou-se para a aquisição por compra e venda e na busca por imóveis de devedores da União e do Banco do Brasil, modalidades contempladas no Programa Terra da Gente, lançado pelo Incra em abril deste ano.
De acordo com o Incra, a autarquia tem recebido ofertas e avaliado áreas para negociação. O Incra nacional incluiu, em novo pedido de recursos extraordinários para o RS em razão da emergência climática, o valor já acordado com proprietário de área a ser adquirida pela autarquia. Além disso, estão em fase de decretação de desapropriação duas áreas da antiga Companhia Estadual de Silos e Armazéns (CESA), que são reivindicações antigas do Movimento, já com famílias nos imóveis – uma em Cruz Alta e outra em Vitória das Missões.
Outras áreas que avançarem em negociações com proprietários para aquisição por compra e venda só devem entrar no orçamento de 2025. Para além disto, o Incra finaliza os procedimentos que permitirão a transferência de imóveis do Banco do Brasil para a Autarquia – os trâmites estão sendo ajustados com o Ministério da Fazenda, Banco do Brasil e Tribunal de Contas da União (TCU). Há pelo menos uma área no RS na listagem inicial de imóveis a serem destinados à reforma agrária por esta via.
Problemas com as enchentes
Além da obtenção de terras Incra e MST ainda negociam ações em curso em razão dos impactos das enchentes de maio deste ano. A autarquia recebeu dois grandes aportes em créditos extraordinários autorizados pelo governo federal: R$13,4 milhões pela Medida Provisória nº 1.244, publicada em 18 de julho, e R$ 159,5 milhões pela Medida Provisória n° 1.260, publicada em 30 de setembro. Todos os recursos foram destinados a ações em andamento pela autarquia.
Parte dos valores da primeira autorização foi utilizado para a qualificar as demandas, permitindo a contratação de profissional para realização de laudos das casas atingidas, deslocamento de engenheiros da autarquia para elaborar projetos de estradas, entre outros. O maior volume da primeira Medida Provisória, R$ 12 milhões, foi destinado a um Termo de Execução Descentralizada (TED) com a Universidade Federal de Santa Maria. A cooperação está elaborando Chamada Pública para a contratação de assistência técnica para assentamentos da Região Metropolitana e também vai realizar diagnósticos e cadastros de famílias quilombolas.
Ainda com os recursos da MP nº 1.244, o Incra está viabilizando a contratação de obras de recuperação em 10 barragens afetadas (R$ 960 mil). A ação é executada através de outra parceria com a Universidade Federal de Santa Maria, desta vez com o Núcleo de Estudos em Gestão de Riscos e Infraestrutura (Laboratório GRIN) do Campus Cachoeira do Sul.
Em relação à segunda MP (1.260), os maiores valores estão destinados à liberação de crédito (R$ 84,8 milhões), em duas modalidades: Habitacional e Fomento. Para a primeira, são R$ 7,2 milhões para 96 famílias da Região Metropolitana e Vale do Taquari que perderam ou tiveram suas casas severamente danificadas (R$ 75 mil por família). O Incra está finalizando alterações normativas e no Sistema Nacional de Concessão do Crédito Instalação (SNCCI) para emitir os contratos. Paralelamente, já está em andamento o fluxo de credenciamento de entidades para a construção das mesmas.
Já o Crédito Instalação na modalidade Fomento destina-se à produção. Estão empenhados R$ 77,6 milhões para atender 4.848 famílias assentadas (R$ 16 mil por família). A liberação de mais uma operação desta modalidade foi autorizada pelo Decreto 12.224 em 23 de outubro. As normas internas e o SNCCI foram adequados, e a direção nacional avisou, durante a reunião de hoje, que os contratos já poderão começar a serem emitidos na próxima semana. Isto também só será possível porque desde julho equipes do Incra/RS e da Emater têm percorrido o estado para elaborar projetos produtivos – exigência para a operacionalização do Fomento.
Eldorado do Sul, Taquari, São Jerônimo, Arambaré, Nova Santa Rita e Pelotas
O segundo maior montante da MP 1.260 é destinado a infraestrutura (R$ 74,7 milhões). Em relação a estradas, o Incra/RS fez uma dispensa de licitação para obras de recuperação em assentamentos de municípios que decretaram calamidade pública: Eldorado do Sul, Taquari, São Jerônimo, Arambaré, Nova Santa Rita e Pelotas. Os contratos com as empresas que apresentaram as melhores propostas para os quatro primeiros municípios estão em fase de assinatura. Para Nova Santa Rita e Pelotas, a dispensa não teve sucesso, e as obras serão viabilizadas através de convênios com os municípios – propostas já estão inseridas no TransfereGOV.
Emergência climática
O Incra/RS também está formalizando convênios com municípios que decretaram emergência e estão com projetos de obras de estradas prontos: Santana do Livramento, São Gabriel, Pontão, Candiota, Canguçu, Tapes, Camaquã, Piratini e Hulha Negra.
Em outra frente, convênios com os municípios de Eldorado do Sul e Nova Santa Rita irão garantir a reconstrução dos sistemas de irrigação nas áreas de arroz orgânico, prevendo oito conjuntos de motobombas e limpeza de canais de drenagem e irrigação. Estão direcionados R$ 5,5 milhões para esta ação.
Incra alega estar se esforçando
“Temos total alinhamento da Sede com as ações que a regional está executando, em todas as questões que vivemos juntos a partir da enchente”, destacou o presidente do Incra, César Aldrighi. Ele lembrou que novas solicitações de recursos para complementar as ações estão sendo encaminhadas junto ao Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar e à Casa Civil.
O superintendente do Incra/RS, Nelson Grasselli, ressaltou o esforço conjunto entre a regional e a Sede. “Agradecemos todo o trabalho para fechar tudo isto, é uma construção conjunta. A ansiedade de quem está debaixo da lona é muito grande, eu sei porque já passei por isso, mas não podemos perder de vista todo este esforço já realizado”.