As complexas e profundas transformações tecnológicas que a humanidade vivencia e sua repercussão direta nos processos produtivos das indústrias e na vida do trabalhador recolocam na pauta política e educacional a discussão (ou rediscussão) da Formação Profissional.
O Governo Estadual encaminhou à Assembléia Legislativa um Projeto de Lei dispondo “… sobre a Educação Profissional e cria a Superintendência da Educação Profissional do Estado do Rio Grande do Sul – SUEPRO/RS e dá outras providências”. Este projeto é resultado do trabalho desenvolvido por uma Comissão de Reestruturação do Ensino Profissionalizante criada pelo governo estadual há cerca de dois anos.
As características fundamentais deste projeto são: desvinculação do ensino técnico de 2º grau; ensino técnico voltado exclusivamente para o trabalho, ciência, tecnologia e qualificação para o mercado de trabalho; possibilita a transferência de bens do estado para a iniciativa privada; cria uma Superintendência de Educação Profissional desvinculada do sistema de ensino e da Secretaria de Educação, com autonomia técnica, pedagógica, financeira e administrativa, inclusive para rever habilitações; possibilita a terceirização das instituições públicas e do ensino técnico.
Historicamente, tivemos uma “educação popular” para o povo e uma “educação para as elites dirigentes”. Posteriormente, educação acadêmica para o rico e ensino profissional para o pobre trabalhador. Esta evolução histórica reflete duas concepções de Formação Profissional que ainda hoje permeiam os projetos e propostas colocadas e recolocadas em pauta. Um concepção produtivista e outra civil democrática.
A concepção produtivista atrelou e continua propondo uma subordinação da Formação Profissional ao mercado, ao resultado, à produção, ao “Capital Humano”. Para tanto, são necessários cursos rápidos, qualificação, preparação e adestramento de mão-de-obra. A Formação geral desvincula-se da formação técnica; a teoria desvincula-se da prática e a técnica não tem relação com a teoria e política.
A concepção civil democrática, ao contrário, resgata uma formação integral, universal, democrática e pública; onde formam-se, sim, técnicos competentes para enfrentar as transformações tecnológicas, mas forma-se também para a vida, para o exercício pleno da cidadania, para a participação enquanto sujeito das relações sociais e dos processos produtivos.
A proposta do Governo vincula-se à primeira perspectiva, à perspectiva produtivista, pois desvincula a formação geral da específica, a teoria da prática, a técnica da teoria e da política, o ensino técnico de 2º grau. Trata-se de um retrocesso teórico, pedagógico, epistemológico e ético-político.
No plano teórico, a contradição é absurda, visto que as mudanças no campo do trabalho, na produção e nas tecnologias exigem um 2º grau mais radical na universalidade das ciências da natureza e nas ciências sociais. Pedagogicamente e epistemologicamente, separa a formação geral e específica, teórica e prática, técnica e política. Contrapõem-se à construção dos últimos anos de um 2º grau unitário, que rompa com nossa subserviência científica e tecnológica.
No plano ético político, em consonância com o PCN (Parâmetros Curriculares Nacionais), realça o estilo dedutivo e autocrático, ou seja, antidemocrático na forma, conteúdo e método. É um projeto para atender uma demanda conjuntural da economia – globalização -, proposta pelos países centrais para os países em desenvolvimento, portanto, a serviço dos interesses externos.
Contrapondo-se a todas as enumerações de fatos políticos, sociais, econômicos, epistemológicos temos no estado do Rio Grande do Sul um formato diferente no pensar e no fazer ensino técnico profissionalizante. Temos uma escola que está atenta aos problemas das empresas, do mercado, da produtividade pessoal e social, mas ao mesmo tempo que propõe estruturar uma sólida formação técnica, tem a pretensão de estruturar consciências atentas e críticas que visualizem seu trabalho, sua posição societária, seu local de trabalho e suas relações de modo crítico. Com este perfil e implementando um currículo voltado para estas habilidades e atividades em Porto Alegre, a Escola José César de Mesquita, mantida pelo Sindicato dos Metalúrgicos, está voltada para a formação de técnicos competentes e dinâmicos, compreensivos e solidários, críticos e politicamente inseridos em seu contexto, possibilitando o suprimento das necessidades próprias do mercado de trabalho.
* Gabriel Grabowski é professor, diretor da Escola José César de Mesquita