A trajetória das Ciências demonstra que certos fenômenos constituem-se apenas sintomas aparentes de outros fenômenos essenciais, amplos e decisivos para a humanidade. Hábitos rotineiros, banais e desconexos, possuem implicações e raízes complexas e estão diretamente vinculados à noções e paradigmas, isto é, a horizontes culturais e ideológicos determinados no processo histórico. As necessidades objetivas de preservação e reprodução da espécie e os interesses políticos numa esfera ainda rudimentar provocaram a transição da vida gregária para a vida sedentária. Essa passagem de expressões culturais tão facilmente subssumidas encerram uma infinidade de fenômenos que nem sempre nos damos conta. A idéia e o fato lixo surgiram nesta passagem em que certos objetos ou subprodutos da vida rotineira tornaram-se dispensáveis à sobrevivência do grupo em um determinado lugar ou contraditório com os interesses de quem dominava o grupo. Este refugo adquiriu uma sofisticação proporcional a da sociedade contemporânea. Só que o lixo se transformou em um grande problema para a humanidade. Convenhamos, a civilização produz lixo demais. Ou melhor, o modelo econômico e o seu padrão de desenvolvimento chegou no limiar da produção de resíduos. Chegou o momento não apenas de discutir, protestar ou executar projetos modestos de reciclagem. É preciso urgentemente romper com um modelo e uma mentalidade estreita e perversa. Espera-se que os agentes responsáveis pela revolução tecnológica assumam também o compromisso com essa transição que é política, cultural e científica, como se discute na reportagem de capa desta edição.
Eleições
As eleições também encerram um fenômeno bem mais profundo do que o fato em si. A votação de representantes executivos e legislativos, muitas vezes reduzida a um espetáculo de mídia e demonstração de poder econômico, é um recurso que a humanidade inventou para evitar a barbárie. Ou seja, o domínio puro e simples de quem tem a força ou o poder sobre o resto. Ou ainda, o domínio absoluto da maioria sobre a minoria. Sem dúvida, a democracia direta seria mais eficiente e transparente. Até porque evita mediações manipulatórias, mas exige da organização política e de seus agentes mais trabalho e consciência coletivos. Talvez o ideal fosse uma combinação das duas formas de democracia: o sufrágio universal e a participação direta dos cidadãos no controle do Estado.
Jornalismo
Neste período, Extra Classe acompanha simultaneamente dois processos democráticos: as eleições para governador, presidente, senadores e deputados federais e estaduais; e as eleições para a direção do Sinpro/RS, a entidade que chancela este veículo de comunicação. Os atores sociais em disputa são a notícia e um jornal ético deve reservar-lhes tratamento equânime. Por isso, cada um dos candidatos a governador, Olívio Dutra e Antônio Britto, ocupam uma página nesta edição. Por isso, na edição anterior, as duas chapas que concorreram à direção do Sinpro/RS puderam se expressar em igual condição.
Reitera-se o que se afirmou no editorial da primeira edição de Extra Classe, que circulou em março de 1996. É um projeto editorial que pretende radicalizar a idéia de sindicato cidadão, através de um trabalho compromissado com os princípios éticos do jornalismo, oferecendo ao seu principal público alvo, o professor, um material jornalístico aprofundado, plural e não simplesmente corporativo. Não se pode reduzir um cidadão à sua profissão. Antes de mais nada, o professor é um cidadão.
Seguidamente alguém indaga se é possível realizar este projeto. Responde-se que ele está se realizando em 24 edições. Talvez como uma ilha no contexto da imprensa sindical e nos quadros da chamada grande imprensa que, sejamos razoáveis, jamais poderá efetivar os princípios do jornalismo exatamente porque representa o poder, mas apresenta-se com uma entidade acima, além e aquém dele. Ao contrário, Extra Classe apresenta-se como um jornal posicionado, que tem perspectiva política e desta forma busca a revelação e não a manipulação, expondo as versões dos fatos desde o seu ponto de vista claramente explicitado.
O que alguns não sabem é que o repórter tem a obrigação ética de confrontar as fontes contraditórias, antagonizando as versões, agregando o que precedeu e o que pode suceder ao fato em questão para que o leitor possa concluir. Com esta postura editorial, Extra Classe tem se afirmado com respeito, inclusive sendo agraciado com os dois maiores prêmios do jornalismo gaúcho, o ARI e o de Direitos Humanos. É assim que um jornal conquista credibilidade e capacidade de influenciar e formar opinião.
Por tudo isso, não poderíamos deixar de refutar afirmações e atitudes intimidatórias, suscetíveis de processo judicial, por parte de integrantes da chapa 2, que disputaram a direção do Sinpro/RS, de que Extra Classe teria favorecido a chapa da situação na reportagem da edição anterior, a 23. Tal procedimento seria de uma ingenuidade primária se não fosse sórdido. Editores com experiência profissional e comprometidos politicamente com a emancipação da maioria da população não apenas no discurso, mas na práxis diária e no método de análise e intervenção, não sucumbem à sedução mesquinha daquilo que alguns enchergam como um poder extraordinário. Extra Classe é um projeto editorial corajoso, chancelado por uma categoria que sabe pensar e sabe que um fenômeno aparente é apenas a feição de um fenômeno principal.