OPINIÃO

Um século que se vai

O Editor / Publicado em 23 de dezembro de 1999

Olhando de longe, esses parecem ter sido os últimos cem anos mais intensos da humanidade. Mas sabemos que não foram, todos os anos passam com a mesma velocidade, o mundo gira no mesmo ritmo e a ciência, a história, as relações humanas evoluem como sempre evoluíram e como sempre há de evoluir. Mas, então, qual a diferença deste final de século? Apenas uma, na opinião deste jornal: os últimos cem anos foram intensos, excessivos, condensados, cheios de uma dinâmica particular, toda própria.

Senão, vejamos: este foi o século do cinema, dos aviões, da energia nuclear, da física quântica, da televisão, da psicanálise, da medicina, da arte moderna. Foi um século de conflitos armados em excesso, embora tenha havido conflitos armados em todos os séculos. Foi um período de mergulho na individualidade humana, ainda que tenhamos ficado menos solidários com isso. Foram os cem anos das revoltas populares, das grandes revoluções e das grandes decepções. E das grandes guerras, também.

Não é tarefa fácil para um jornal contar alguma coisa desses cem anos, ainda mais se considerarmos a diversidade de fontes, de fatos, de Histórias (com agá maiúsculo) que temos à disposição. Optamos por apresentar um painel – sem dúvida parcial – de alguns fatos que foram marcantes nos últimos cem anos, sempre sob o enfoque do excesso. Esperamos, com isso, dar ao leitor uma alternativa para interpretar esse período, e não apenas conhecê-lo. O esforço dos repórteres Renato Dalto e César Fraga está nais oito páginas que compõem a matéria de capa desta edição, já a partir da página 9.

Mas não é só isso que acontece nesse período pré-virada de século. O mundo não pára. A reforma agrária do estado sai do papel e ganha os primeiros assentados, mais precisamente 57 famílias de sem terra que agora poderão plantar num espaço próprio. Além disso, não param também as manifestações de descontentamento com o atual governo federal, que joga o país numa delicada situação econômica sem perspectiva de mudança em curto prazo. No dia 10 de novembro, 200 mil trabalhadores cruzaram os braços no estado para protestar contra isso.

E temos, também, o registro da memória viva dos últimos cem anos nos olhos e sentidos do jornalista Barbosa Lima Sobrinho, que completou 102 anos lúcido e produtivo como poucos. Nascido no mesmo ano de fundação da Academia Brasileira de Letras, na qual ingressou em 1937, ele conta um pouco do jornalismo, da política e da vida brasileira nesse período intenso e conturbado. E revela sua predileção em termos jornalísticos.

No mais, é festejar a virada do século e esperar que 2000 marque o início de um período de humanização das relações políticas, econômicas e sociais deste planeta. Esperar, não: fazer com que isso aconteça.

 

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