OPINIÃO

Desencantamento com a profissão

Por Márcia Aparecida Vitorello* / Publicado em 29 de abril de 2013

Proponho tecer algumas considerações sobre as falas dos professores da rede privada no momento de suas rescisões, a partir das escutas realizadas no Núcleo de Apoio ao Professor Contra a Violência (NAP), serviço ofertado pelo Sindicato. Trata-se de um espaço de acolhimento da palavra do professor e desta escuta emergem questões sobre a vivência profissional no universo da educação, da educação infantil até o doutorado, cada uma com suas especificidades. Destaca-se no último período (2012-2013) o desencantamento pela profissão como uma questão presente em todos estes níveis. Também chama a atenção o grande número de demissões fora do período habitual, o que torna problemática a recolocação destes professores em outros estabelecimentos de ensino.

Em síntese, na atualidade, parece estar se consolidando entre os docentes a percepção de uma cultura de descartabilidade dentro do segmento educacional, e que este descarte pode ocorrer a qualquer momento. O professor, hoje, é, portanto, um sujeito avisado, e diferente de anos anteriores, já não se mostra tão surpreso com a demissão. Se por um lado ele está psiquicamente melhor preparado para lidar com esta situação, por outro, ele passa a investir menos afetivamente na profissão, sendo precisamente a sua implicação no trabalho o motor para um bom desempenho. Este contexto produz como consequência o apagamento do desejo do professor no processo de ensino, com danos à educação como um todo.

No trabalho realizado, também chamou a atenção o grande número de pedidos de demissão dos professores. Tais pedidos são motivados por diversos fatores, dentre os quais, os concursos públicos e a desistência da carreira apareceram como causas frequentes. Encontrei educadores jovens e outros mais experientes desencantados, que desistiram do seu projeto profissional, como afirma um deles: “Eu tinha um ideal de fazer algo pela sociedade e perdi”! Talvez este dano na imagem ideal do ofício possa ser pontualmente sintetizado com a fala de outra professora: “Perdeu o brilho”! Cabe interrogar, então, o que poderia fazer o brilho da profissão cintilar outra vez?

Para além de um caráter legalista e anterior a um apelo à legislação, entende-se, sobretudo, que o que é próprio destas matérias tem lugar indispensável na formação do ser humano, e que a propriedade de construção destes conhecimentos é de quem se licenciou neles. Nesta perspectiva, a frieza da lei tem sentido, bem como seu cumprimento.

* Psicóloga do NAP, doutora em Educação e professora universitária.

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