Arte: Rafael Sica
Arte: Rafael Sica
O raciocínio deles – me perdoem a suposição da existência disso lá neles – tem um jeito amalgamado de ser, algo entre o caprichoso e o capcioso, escorado no ganancioso. Nessa sua maneira labiríntica de pensar (labirintando mais ainda o jogo desorientado das palavras), a covid estaria indo muito devagar para chegar à contaminação de rebanho – seja ele qual for.
Na cachola deles, ali onde nos outros existe um cérebro, quanto mais favorecida a contaminação, mais cedo o vírus irá embora. Nesse caso, iria mesmo: por falta de quem matar. Porém, no enviesado entendimento desse grupo cientificamente sui generis, ao encontrar ambiente favorável à propagação, o vírus se sentiria inibido de seguir contaminando, tal qual um sádico quando pega nojo dum masoquista.
Ao mesmo tempo visionários e ceguetas, esses puxa-sacos do vírus acreditam piamente (eles poriam até pias sujas num altar) que, se bem escancarada a lendária hospitalidade gaúcha, o vírus há de nos poupar. Calma, eles explicam: ao tentar cooptar a covid para um convívio meigo e receptivo entre saudáveis, logo o vírus, cansado de não encontrar desafio ou vacina pela frente, se bandearia pra outras plagas, onde sabe que encontrará resistência, onde a batalha pra contaminar compensaria melhor seu ego virótico.
Foi com essa estratégia às avessas que nossos prefeitos e empresários covidianistas elaboraram o conceito incongruente, de pioneirismo reconhecido até pela OMS, da bandeira preta com restrições de bandeira vermelha. E não vão descansar enquanto não embandeirarem o estado nessa mescla insanitária. A demora de implantar se deve a mero detalhe: estariam indecisos quanto à bandeira híbrida: quadriculada como a da chegada da F1 ou listrada como a do orgulho gay? Vermelho maragato ou pink? Em organza ou brim coringa?
O que importa é que o plano geral está pronto, só aguardam adesões de mais e mais autoridades sacripantas e empresários mentecaptos, ou vice-versa. A ideia básica é transformar todo comércio e serviços numa eficiente rede de disseminação do vírus, cada loja e cada estabelecimento não essencial num posto certificado de contaminação. Entrou, covidou-se.
Para Melo e outros melados, apesar de ilógica a tática é elementar: como a covid só ataca as pessoas e não a economia, basta salvar a economia para poupar os bilhões que seriam gastos com vacinas e máscaras, aumento de leitos e medicamentos pra intubação, hospitais de campanha e equipes médicas.
Afinal, indagam os mentores: o que é o preço de imensos cemitérios novos comparado a um PIB são e salvo?