Medida Provisória flexibiliza regras para o trabalho em casa
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O governo federal editou no dia 28 de março a Medida Provisória nº. 1.108/22, em mais uma tentativa de aprofundar a desregulamentação das relações de trabalho existentes no país. O texto editado, trata de questões relacionadas ao trabalho híbrido, ou seja, aquele que se caracteriza pela realização de parte das tarefas nos domínios da empresa e parte no domicílio do trabalhador.
Conforme estabelece a nova norma, os trabalhadores poderão ser acionados em qualquer momento por meio eletrônico ou telemático como, por exemplo, pelo celular, por mensagens ou outras formas de comunicação, fora de sua jornada de trabalho e isso não será considerado como tempo à disposição, regime de prontidão ou sobreaviso.
A norma também alterou a legislação, passando a prever dois tipos de regime de jornada para o teletrabalho: o primeiro baseado em uma jornada limitada no tempo, que é caracterizado por controle de ponto e pagamento das horas extras e o segundo sem jornada de trabalho definida, sendo este último mensurado por produção ou tarefa.
Este descolamento do trabalho desempenhado de uma mensuração de tempo, evidentemente, permitirá aos empregadores, que, são aqueles que definem os prazos para a realização dos serviços, a possibilidade de exigirem dos trabalhadores a prestação de jornadas de trabalho maiores do que as definidas pela Lei e pela Constituição Federal, com sensível atenuação dos riscos trabalhistas.
Trata-se de verdadeiro repasse de parte do risco do empreendimento para os trabalhadores e de ameaça real ao direito de se desconectar do trabalho e das garantias da intimidade, do convívio familiar e comunitário.
Sem qualquer limitação da complexidade das tarefas a serem desenvolvidas, bem como, dos prazos para sua execução, a nova legislação configura-se como um grande estímulo para a exigência e realização de jornadas extenuantes.
Trata-se de efetivo retrocesso civilizatório, justificado pela existência das novas tecnologias, mas que ao final recupera uma realidade laboral que remonta ao século 19. Ao mesmo tempo que as novas tecnologias são festejadas como transformadoras e disruptivas, ou então como solucionadoras de problemas complexos, são completamente ignoradas quando sua utilização poderia garantir a efetividade do cumprimento dos direitos sociais básicos. Mais do que isso, são a justificativa para o aumento da exploração, do trabalho gratuito ou parcialmente remunerado.
Também cumpre destacar, que a MP refere que a transferência do modelo presencial para o modelo híbrido não depende mais da negociação coletiva com o sindicato, podendo ser acordada diretamente com o trabalhador através de negociação individual.
Outra inclusão, que num primeiro momento poderia se entender como benéfica, priorizaria o regime de teletrabalho aos empregados com deficiência ou com filhos até 4 anos. Ocorre, que não se trata de obrigação dos empregadores ou de exercício de opção do empregado, mas de mera prioridade, sem muitos efeitos práticos.
Professores
Em relação à categoria dos professores, que já acumula a realização de trabalho presencial e à domicílio, a nova legislação trata de aprofundar as possibilidades do trabalho gratuito, que originalmente limitava-se a preparação das aulas e correção das atividades e, atualmente, engloba uma permanente relação comunicacional como os pais, alunos e direção dos estabelecimentos de ensino.
Além disso, limita a possibilidade de cobrança de horas extras do trabalho realizado nos ambientes virtuais de aprendizagem e abrem caminho para se trabalhar mais e ganhar o mesmo.
Por fim, cumpre ressaltar que a nova legislação tem aplicação imediata, mas por tratar-se de uma Medida Provisória, seu prazo de vigência é de 60 dias, prorrogável uma vez por igual período. Se ela não for aprovada no prazo de 45 dias, contados da sua publicação, tranca a pauta de votações da Casa legislativa em que se encontrar (Câmara ou Senado) até que seja votada ou perca a validade.
Henrique Stefanello Teixeira é advogado trabalhista, assessor Jurídico da Federação dos Trabalhadores em Educação (FeteeSul), assessor jurídico do Sinpro Noroeste, Assessor Jurídico do Sinpro Caxias e Advogado Credenciado pelo Sinpro/RS pelo escritório Cainelli Advogados.