Foto: Warner Bros/Divulgação
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O macho brasileiro inseguro vê tutorial para ser macho, frequenta curso para se dar bem com mulheres e tem até representante na tribuna da Câmara dos Deputados.
Nunca antes o macho brasileiro de direita, com vocação para o machismo explícito, foi tão preocupado com a própria fragilidade. Sempre foi assim, mas piorou.
O macho está inseguro e agressivo. Os homens jovens e maduros do século 21 não se sentem à vontade diante da ascensão do poder feminino.
Esse macho também está abatido diante da imposição do direito de cada um de exercer na plenitude sua condição de diferente em relação aos modelos considerados consagrados e superados de gênero e de sexo.
O macho inseguro teme gays, lésbicas, trans. Pessoas LGBTQI+ são uma ameaça real ao macho que não consegue conquistar mulheres e precisa de um mestre esperto para orientar suas decisões.
Por isso ele recorre aos tutoriais online do coach e youtuber Thiago Schutz, que ficou famoso por aconselhar os homens a não se submeterem às escolhas das mulheres numa mesa de bar.
Schutz deu um exemplo em podcast recente. Viralizou nas redes ao contar que recusou uma cerveja oferecida por uma mulher. Ele estava bebendo Campari e queria só beber Campari.
Ao rejeitar a sugestão da moça, evitou que ela o subjugasse. “A mulher tem muito essa coisa de tentar moldar o cara, colocar o cara debaixo dela”, disse Schutz.
O coach tem milhares de seguidores. São 300 mil no Instagram. Todos querem ver seus ensinamentos no perfil chamado “Manual Red Pill”.
Red pills seriam os homens que, entre outras virtudes, não se submetem ao poder das mulheres. Eles precisam se impor. Porque assim se consideram machões. E por isso tomam Campari quando bem entendem.
Red pill tem referências do filme Matrix. Em determinado momento, o protagonista tem de escolher uma pílula vermelha, que vai levá-lo à verdade, ou uma pílula azul, que vai fazê-lo submergir na ignorância (foto).
O macho que agora desconfia das mulheres seria o sábio da pílula vermelha. É uma apropriação grosseira de uma alegoria da ficção.
É por isso que o deputado federal Nikolas Ferreira, do PL de Minas, tenta convencer que pessoas trans são apenas homens que desejam se passar por mulher.
No seu raciocínio torto, o que aparece como bravura é na verdade o temor de ser confrontado com o poder do diferente, e nesse caso o diferente representa, na verdade, o poder do que lhe é estranho.
Nikolas, como o homem do Campari, vestiu uma peruca e se apresentou na tribuna da Câmara como Nicole. Tentou fazer humor com o próprio medo de ser confrontado com a sua impotência de macho hétero.
Uma impotência total, e não só sexual. Uma incapacidade de enfrentar quem desafia suas fraquezas de homem de moral molenga, mas que se considera, como seu guru Bolsonaro, um ser imbrochável.
As pessoas trans, os gays e todos os que o macho inseguro não consegue decifrar e aceitar perturbam suas fragilidades.
O macho do Campari já não segura as pontas com as mulheres. E pessoas trans apenas complicam ainda mais a situação deste homem bobão e babão.
Mulheres são um problema sempre a resolver. É preciso receber orientação de especialistas em conquistas para entendê-las.
E aí chegamos ao terceiro exemplo da insegurança do machão. Muitos deles, todos com dinheiro, todos jovens, participaram em fevereiro de uma festa em São Paulo, num casarão do Morumbi.
Dois americanos, que se anunciavam como choaches, iriam treinar os brasileiros a conquistar mulheres.
Os alunos pagaram de R$ 60 mil a, acreditem, até R$ 260 mil por um pacote de viagens e atividades diversas.
O pacote mais caro incluía viagens com aulas em seis países. Por isso a etapa brasileira tinha estrangeiros.
Os americanos lotaram a casa de homens e mulheres e ministraram aulas práticas. Um curso intensivo para rapagões bem de vida. Como ‘pegar’ mulheres.
O macho inseguro precisa até de um kit, fornecido pelos americanos, com perfumes com feromônios, que exalariam odores irresistíveis mesmo para mulheres consideradas difíceis.
Os ensinadores foram denunciados à polícia e ao Ministério Público. Moças que participaram do evento, sem saber que se tratava de uma armadilha para a prostituição, procuraram ajuda.
Os machos que usam peruca para dizer que não temem pessoas trans, que continuam bebendo Campari para dizer que são fortes e que frequentam cursos para virarem homens, todos esses machos são parte de um contexto mais amplo.
O pretexto dos movimentos dos machos inseguros (são várias ramificações) é o de que os homens devem defender seus direitos, porque se sentem ameaçados pelo avanço das mulheres em todas as áreas.
Tudo isso em meio ao aumento da violência cotidiana contra a mulher no mundo todo, principalmente contra as mulheres pobres.
O que se trata é de misoginia e sexismo de classe média e de homens ricos, num contexto de crueldades e feminicídios.
E assim se combinam machismo e fascismo como manifestações inseparáveis de um mundo de extremismos com forte militância no Brasil.
Os homens da nova direita odeiam gays, trans, lésbicas, negros, índios. E temem as mulheres. O macho fascista parece ser uma criança carente, mas é um adulto cruel, violento e covarde.