Foto: Reprodução TV
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Descobriram que os dirigentes do futebol espanhol são fascistas. São assumidamente racistas e fascistas. O presidente da Liga de futebol, Javier Tebas Medrano, é ativista do partido de extrema direita Vox.
Os brasileiros vão fazendo essas descobertas agora, porque o mais recente caso de racismo contra Vinicius Júnior ganhou repercussão mundial.
E assim os brasileiros descobrem também que há nazistas na Ucrânia. São personagens que estão longe de todos nós.
Porque um racista espanhol e um nazista ucraniano nos incomodam menos. E a palavra indignação, quando usada contra um fascista estrangeiro, parece ficar mais forte.
Mas os brasileiros têm aqui mesmo, e há muito tempo, dirigentes de futebol, técnicos e jogadores identificados com o fascismo e o racismo.
Já tivemos técnicos adoradores de Pinochet. Temos dirigentes e técnicos adoradores de Bolsonaro, que adora o torturador Ustra e já fez declarações racistas.
Todos são assumidamente adoradores de adoradores de líderes fascistas, racistas e torturadores.
Temos jogadores assumidamente engajados ao discurso da extrema direita. E temos torcedores racistas, que se manifestam quase todos os fins de semana nos estádios.
Temos torcedores declaradamente racistas, que não são acintosos como os espanhóis, mas temos.
No mesmo domingo em que Vinicius enfrentava os racistas no Estádio Mestalla, em Valência, o goleiro Caíque, do Ypiranga de Erechim, era ofendido e enfrentava um torcedor racista do time do Altos Piauí, no Estádio Lindolfo Monteiro, em Teresina.
O torcedor preso, Francisco das Chagas, é negro. Caíque disputa a série C. Vinicius é ídolo de um dos maiores times do mundo.
O racista de Teresina estava sozinho., era um racista avulso. Os racistas espanhóis agem em grupos. E são mais espalhafatosos.
O confronto é desigual em muitos aspectos, principalmente no tamanho da repercussão dos racistas e das condenações ao racismo.
O racista brasileiro pode ser nosso vizinho, nosso parente, colega de trabalho. Ele nunca será condenado em notas no Twitter do humorista Fábio Porchat.
Porchat, que emitiu um manifesto de apoio ao humorista Leo Lins, autor de piadas racistas, agora apoia Vinicius. E nem deve saber quem é Caíque.
Quando do apoio a Lins, investigado por piadas preconceituosas (eu li as piadas e me nego a publicar aqui), Porchat escreveu:
“Quem não gostou das piadas são os que não foram. Pronto, assim que tem que ser. Ah, mas faz piada com minorias… E qual o problema legal? Nenhum. Dentro da lei pode-se fazer piada com tudo tudo tudo”.
Tudo pode render piada, segundo o humorista passador de pano. Assim como os torcedores entendem que tudo é possível num clube de futebol, incluindo dirigentes e técnicos adoradores de fascistas. Na linha do deixem assim, não mexam com isso.
É a nossa realidade. Fazem média com Vinicius e atacam os grandes racistas espanhóis, mas passam pano para os racistas nacionais.
Aqui, a palavra indignação é muitas vezes apenas uma manifestação de cinismo. É uma palavra num texto ou numa fala, sem qualquer significado substantivo.
E isso acontece porque parte das esquerdas tomadas pela idolatria futebolística também passa pano. E passa muito pano para o racismo.
Dizem, esses ‘progressistas’, que o futebol está cima dessas questões. Não se deve misturar esporte e política, como se um adorador do fascismo, exposto como figura pública, pudesse ser tratado com neutralidade.
A relação do brasileiro com figuras identificadas como fascistas foi normalizada. Todos continuam indo aos estádios e gritando nomes de gente identificada com racistas.
Como consolo, como uma tentativa de aplicar culpas, o passador de pano ataca os racistas espanhóis e os nazistas ucranianos.
Na sua cabeça, esse conflito pode ser simplificado e as coisas se resolvem da melhor maneira possível com o dedo na cara do racista espanhol e o tratamento frouxo a racistas e nazistas vestidos de verde-amarelo.
Moisés Mendes é jornalista e escreve quinzenalmente para o Extra Classe.