Quem segura a mão de Anielle Franco e quem segura a mão de Silvio Almeida
Foto: Duda Rodrigues/MDHC
O ex-ministro dos Direitos Humanos Silvio Almeida foi demitido após acusações de assédio sexual, tornando-se a quinta baixa no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Esse governo tem se mostrado relativamente estável nesse aspecto, especialmente em comparação com a administração anterior de Jair Bolsonaro. Antes de Silvio Almeida, os ministros Gonçalves Dias (Segurança Institucional), Daniela Carneiro (Turismo) e Ana Moser (Esporte) foram exonerados, todos no primeiro ano de governo, 2023.
Em 2024, outro ministro, Flávio Dino, deixou seu cargo no Ministério da Justiça para assumir uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF), uma escolha de Lula após intensos apelos para que a posição fosse ocupada por uma mulher negra. Essa pressão já havia ocorrido em outra ocasião, mas Lula optou por nomear seu ex-advogado, um homem branco e heterossexual, até onde sabemos, conservador do sudeste do país.
A exoneração de Silvio Almeida começou a ser discutida na última quinta-feira, 5 , quando o site Metrópoles revelou denúncias de assédio sexual envolvendo o ex-ministro, incluindo alegações feitas pela Ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco.
Se você estava fora do Brasil, deixa eu te contar o que aconteceu nas últimas horas. Silvio Almeida foi denunciado ao Me Too Brasil, uma organização que apoia vítimas de violência sexual. A confirmação das denúncias pelo Me Too Brasil levou à demissão de Almeida em 24 horas, na sexta-feira, 6, por decisão do presidente Lula.
É crucial abordar essa situação com cautela, especialmente considerando questões de raça, gênero e poder político. O Me Too Brasil, envolvido em disputas sobre editais milionários, já havia solicitado mudanças na licitação do MDHC, o que levanta preocupações sobre conflitos de interesse.
Silvio Almeida, renomado jurista e autor de Racismo Estrutural, desempenha um papel significativo na discussão sobre o racismo no Brasil. Suas análises demonstram como o racismo é um fenômeno enraizado nas estruturas sociais e institucionais. Almeida argumenta que o racismo vai além de atitudes individuais, sendo um problema que afeta profundamente diversas áreas da sociedade.
Curiosamente, Almeida não era filiado ao Partido dos Trabalhadores (PT) e entrou para o governo devido ao seu trabalho acadêmico e ativismo. Por outro lado, Anielle Franco, também uma figura importante na luta contra o racismo e fundadora do Instituto Marielle Franco, é filiada ao PT e ocupa um cargo relevante para a comunidade negra no Brasil. Exatamente por isso defendo que ela faça um certo esforço e fale mais sobre tudo isso. A situação de Anielle e de Silvio, que enfrentam essa crise em um momento crucial da nossa história, gera um ambiente de desolação na comunidade negra, a mais afetada pelo racismo estrutural junto com os povos indígenas.
É fundamental não reforçar estereótipos negativos, pois o assédio pode ocorrer em qualquer contexto social e é uma questão que transcende classe, escolaridade e etnia. A análise interseccional das lutas de raça, classe e gênero pode proporcionar um entendimento mais profundo e ajudar a enfrentar esses desafios, apesar do sentimento de retrocesso que muitos, incluindo eu, podem sentir diante desses acontecimentos. A sociedade brasileira frequentemente tem dificuldade em lidar com a ascensão de negros em posições de destaque, e esses eventos e a velocidade com que tudo acontece podem refletir essa resistência.
Agora o jeito é ninguém soltar a mão de ninguém e deixar que as instituições trabalhem de maneira célere, e que a contribuição de seus trabalhos para uma sociedade mais igualitária, contribuição essa de cada um dos envolvidos neste triste caso de mais um possível assédio sexual, não seja descartada. Pois muitos do que foi feito por estes dois constitui verdadeiro pilar civilizatório para a comunidade negra, para os povos indígenas e para o Brasil como um todo.
Ritchele Luís Vergara da Fontoura é servidor municipal e graduado em Direito pela Ufrgs