Por que odeiam tanto os direitos humanos
Foto: Unicef/ Reprodução
Todos os anos, celebramos, no dia 10 de dezembro, o aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH). Embora não seja propriamente um tratado formalmente assinado pelos países membros da Organização das Nações Unidas (ONU), essa norma é balizadora de pressões internacionais contra países ou indivíduos que violem quaisquer dos seus dispositivos, constituindo, portanto, um referencial moral de conduta para governantes de todas as nações.
Passadas tantas décadas daquele longínquo ano de 1948, nos vemos chegando ao final do primeiro quarto do século 21 sem alcançar alguns dos preceitos básicos trazidos pela DUDH, e o pior, acompanhando ataques ferrenhos advindos de movimentos conservadores, que na tentativa de deturpar sua essência, lhe coloca a pecha de preconizar a defesa de criminosos. Podemos concluir, sem hesitar, que seus detratores ignoram por completo o teor humanista impresso em seus artigos, cabendo a nós, militantes do campo progressista, jogar luz sobre tais debates.
Ao longo de seu texto, a declaração menciona que todos nascem livres e iguais em direitos e que devemos agir com fraternidade (Art. 1º), e que podemos invocar tais direitos e liberdade, sem qualquer tipo de distinção (Art. 2º). Ainda podemos ler que os indivíduos têm direito à vida, à liberdade e à segurança (Art. 3º) e que é proibida a escravidão e a servidão (Art. 4º). Seriam esses os dispositivos que fazem o autointitulado “cidadão de bem” perder a compostura?
Quem sabe o ponto nevrálgico seja o artigo 5º, que diz que “ninguém será submetido à tortura, à pena ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes”, ou então o artigo 9º, que afirma que “ninguém poderá ser preso, detido ou exilado arbitrariamente”.
Ou será a menção de presunção da inocência até ser provada a culpa em um processo que assegure ao acusado o direito de defesa, como proposto no artigo 11? É possível que o monstro abjeto do sadismo residente nessas pessoas se contorça de raiva ao ler tais linhas, mesmo estando elas incorporadas à nossa Carta Magna.
Me recuso a crer que tais indivíduos rechacem os direitos das pessoas a ter um registro civil e seu reconhecimento (Art. 6º) ou que todos sejam tratados igualmente perante a lei, sem discriminação (Art. 7º) ou ainda a garantia de apresentarem recursos contra atos que violem seus direitos fundamentais (Art. 8º).
Somam-se a esses, os também direitos humanos contra intromissões em suas vidas privadas, domicílio, correspondência e aos ataques à honra e reputação, conforme versa o artigo 12, bem como o de ter uma nacionalidade (Art. 15), o da livre circulação em seu país (Art. 13) ou de pedir asilo em outra pátria nos casos de perseguição (Art. 14).
Também merecem destaque o direito de casar e constituir uma família (Art. 16), de ter propriedade (Art 17) e as garantias de liberdade: de pensamento, consciência e religião (Art. 18), de opinião e expressão (Art. 19) e de reunião e associação (Art. 20) e de escolha de seus governantes através de eleições limpas (Art. 21).
Porém, em meio a retrocessos na legislação trabalhista, ataques à previdência social e o levante popular buscando melhor qualidade de vida e menor exploração da classe trabalhadora, como o fim da escala 6×1, compreende-se o ódio da elite dominante brasileira à Declaração Universal dos Direitos Humanos.
O pano de fundo para esse ódio talvez nem seja o suposto protecionismo à bandidagem, mas os dispositivos que resguardam o direito à seguridade social (Art. 22), ao trabalho com salário digno e livre associação sindical (Art. 23), ao repouso, lazer e férias periódicas (Art. 24); e a garantia aos trabalhadores e trabalhadoras que tenham um nível de vida que promova saúde, bem-estar, alimentação, vestuário, moradia para suas famílias, assim como aos doentes, deficientes, viúvos e idosos (Art.25).
Os inimigos da educação, que frequentemente atacam profissionais de escolas, taxando-os de doutrinadores, por certo destilam seu veneno ao ouvir as premissas do artigo 26, que define a obrigatoriedade do ensino fundamental gratuito e universal, cujo intuito deve ser a expansão da personalidade humana para formar cidadãos defensores dos direitos humanos, das liberdades fundamentais e da tolerância entre as nações em busca da paz.
Em um país onde quase tudo é transformado em lucro para poucos, proteger a propriedade intelectual, cultural, artística e científica, como definido no artigo 27, atrapalha a mercantilização da criatividade e inventividade humana.
Muitos têm lutado arduamente para desestabilizar as estruturas de governo, tanto em âmbito nacional quanto internacional, utilizando-se do poderio econômico, manipulação de redes sociais, patrocínios de veículos de comunicação, ou mais enfaticamente, através de tentativas de golpes de Estado ou guerras, criando impeditivos para o pleno gozo dos direitos e liberdades constantes no artigo 28.
Como poderíamos elucidar aos herdeiros do capital – cujos rostos sequer verteram uma gota de suor para a construção dessa nação – que todos temos deveres para com a comunidade, conforme redação do artigo 29?
E que a opulência de suas posses é a razão da penúria da maior parte da população, nexo causal da inacessibilidade aos desvalidos, dos direitos mais básicos constantes nesse documento.
Nessa data emblemática, faz-se necessário recordar o passado, valorizando o esforço e sacrifício daqueles que nos deixaram esse importante legado; analisar o presente, mapeando todas as possíveis ameaças de retrocessos, e projetar o futuro, visando planejar nossas mobilizações em busca do avanço em prol de uma sociedade plenamente igualitária, fraterna e anti-exploratória.
Alex Fraga é professor de Biologia e vereador do PSol.