O Professor Coruja é uma personagem histórica cuja riqueza a gente não consegue esgotar em apenas uma ou duas pequenas crônicas. Sua transferência de Porto Alegre para a Corte do Rio de Janeiro inclui um mundo de fatos marcantes. A fundação do Colégio Minerva. Sua condição de latinista emérito. Sua hospitalidade, realçada pelo cronista Aquiles Porto Alegre ao dizer que sua casa era um verdadeiro consulado abrigando os rio-grandenses que chegavam ao Rio. A fundação, em 1858, da Sociedade Riograndense Beneficiente e Humanitária.
Seu apego à querência, jamais esquecendo de brindar seus leitores do Sul com gostosas relembranças (“Antigualhas”) e com um curioso catecismo histórico-geográfico, publicado em 1886 pelo “Anuário” de Graciano Azambuja – num estilo pedagógico interessantíssimo, que ainda hoje seria válido.
Sua biografia contém facetas risonhas, a começar pela projeção nacional como educador e a proeza de ter enriquecido dando aulas e escrevendo livros. E a alegria de ter visto seu filho adotivo – Coruja Júnior – galardoado pelo Imperador com a Comenda da Ordem da Rosa.
Mas houve também as páginas tristonhas. Já velho, o baque financeiro resultante da fundação de uma Caixa Depositária que, por artimanhas de um sócio sem escrúpulos, o arrastou à falência. Pobre e viúvo, buscando arrimo na casa do próprio filho, o Comendador. A perda desse filho e o últimos anos num viver nômade em “repúblicas” de estudantes. O solitário fim, em agosto de 89.
Uma personalidade tão grata ao povo rio-grandense merecia ser homenageada, e em 1909 chegou essa oportunidade com a abertura de novas ruas no bairro Floresta, em Porto Alegre. Na “hora H”, porém, devem ter achado que um simples professor não estava à altura da honraria e transferiram para o pai o título que havia sido do filho. Suprema ironia: Rua Comendador Coruja.Mas foi dada a volta por cima e hoje se sabe que a homenagem é para o pai. Ainda bem…
Também é lembrado o nome do grande mestre numa escola do município de Taquari. Mas o grande louvor talvez esteja na sobrevivência daquele “consulado” carioca. A hoje Sociedade Sul-Riograndense, do Rio, conta com 139 anos e seu CTG Desgarrados do Pago continua recebendo os conterrâneos com aquele mesmo amor e vibração que animava o gaúcho Coruja nos tempos do Império.
*Luiz Carlos Barbosa Lessa é historiador, folclorista e escritor