Só o futebol permite que você sinta aos 60 anos exatamente o que sentia aos seis. Todas as outras paixões infantis ou ficam sérias, ou desaparecem, mas não há uma maneira adulta de ser apaixonado por futebol. Adulto seria largar a paixão e deixar para trás essas criancices: a devoção a um clube e às suas cores como se fosse a nossa outra nação, o desconsolo ou a fúria assassina quando o time perde, a exultação guerreira com a vitória. Você pode racionalizar a paixão, e fazer teses sobre a bola, e observações sociológicas sobre a massa ou poesia sobre o passe, mas é sempre fingimento. É só camuflagem. Dentro do mais teórico e distante analista e do mais engravatado cartola aproveitador existe um guri pulando na arquibancada. E esta nossa infantilidade compartilhada, de certa forma, redime tudo. Até o Eurico Miranda.
E também é a culpada pelo futebol profissional no Brasil ter vivido, até hoje, nesta doce irresponsabilidade sem cobrança e sem castigo. Nenhum clube de futebol precisa ser regido de uma forma legal e contábil porque nenhum existe no mundo real, adulto e fiscalizável. Todos contam com a tolerância carinhosa dedicada a crianças brincando de gente grande, ou de gente grande sendo crianças. E a brincadeira fica cada vez maior e mais longe do controle. Nos últimos anos, o comércio de jogadores de futebol, incluindo a repartição da propriedade dos passes entre clubes e empresários e investidores, transformou-se num dos mais rentáveis negócios clandestinos do mundo, envolvendo trampas e tramóias que só podem ser imaginadas, já que muito pouco se torna público.
É muito saudável, portanto, que finalmente se investigue seriamente os negócios do futebol e se exija comportamento adulto dos seus responsáveis e correção fiscal e transparência dos clubes.
Desde, claro, que seja dos outros e não do Internacional ou do Botafogo.