OPINIÃO

Concerto para um novo mundo

Por Elisa Lucinda / Publicado em 4 de abril de 2001

O concerto do mundo

Arte: Ricardo Machado

Arte: Ricardo Machado

Quando minha mãe morreu em 1993, minha sogra falou: “podia encher um trem de gente que não presta pra ir no lugar dela”. Ela prestava.

Tinha gosto pela humanidade e eu pensei em seguida na lista desse trem: “podia começar com o Collor!”, logo depois pedi perdão a Deus que não é bonito desejar a morte dos outros.

Fui falar com Ele que nem me deixou começar: “Ah não, perdão de novo por maus pensamentos! Muda o disco, nega.”

– Mas Deus, nem sou a favor da pena de morte, é que o homem roubou de um país inteiro, o cara não ama ninguém; já a minha mãe…

E Deus: “Hum, continue.”

– Ah, Deus, adeus, deixa pra lá, você me entendeu!

Saí correndo do céu e continuei no meu ataque de “Américo, o reformador do mundo”. Esse é um personagem de Monteiro Lobato que me intriga desde menina e eu gosto da ideia de ele querer mudar o mundo.

Na verdade acho que gente alegre não devia morrer nunca, nem criança, nem jovem, nem ninguém que presta; queria que durasse mais e principalmente a pessoa que vive do dom, que desenvolve ele.

O dom quando não desenvolvido, quando rejeitado pelo seu portador, vira inimigo. Pode até fazer a pessoa se tornar violenta porque lutar contra a própria natureza é uma luta inglória.

De modo que eu estou sempre sonhando com um país assim: um presidente Darcy Ribeiro, um delegado Gilberto Gil, um prefeito Luís Melodia, um juiz Mário Lago, uma médica Fernanda Montenegro, um psiquiatra Manuel de Barros, um Ministro da Educação Mario Quintana, um dentista Chico Buarque, um taxista Miguel Falabella, uma motorista de ônibus Zezé Polessa, um gerente de banco Mauro Salles, uma cozinheira Zilka Salaberry, uma mãe-de-santo Bethânia, um professor Caetano, um avô Tom Jobim e um jardineiro Tom Zé.

Pois é, na minha reforma todos eles fariam de seus cargos a belezura amorosa que fazem em suas canções, sua poesias, sua arte, e sua vida.

Pois é, é isso que eu ía explicar pra Deus naquele dia em que minha mãe morreu.

Agora vou confessar uma coisa: desde o dia em que Herbert Viana, meu “parente” querido, parente amado do Brasil, caiu, só me vem uma ideia na cabeça: “ já que gosta tanto de dar volta, por que o juiz Lalau não anda de ultraleve?”

Elisa Lucinda é colunista do Extra Classeelisalucinda@radnet.com.br

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