Desenho: Ricardo Machado
Desenho: Ricardo Machado
– Perdona-me.
– Sorry.
– Es por aqui?
– Não sei. Também acabei de chegar.
– Borges. Argentina.
– Goodman. Estados Unidos.
– Goodman… Goodman…
– O Rei do Swing.
– Ah!
– E você?
– Bem, eu inventei este labirinto. Modestamente.
– Como, inventou, se eu estou nele?
– É difícil explicar. Escrevi vários livros não explicando exatamente isto. Minha idéia da morte era esta: o último labirinto. Por alguma razão, encontro você aqui. Tem certeza de que eu não o inventei também?
– Pouco provável. Judeu? Brooklyn? Tocava clarinete?
– É, acho que não. Às vezes penso que eu inventei tudo. Que a vida foi só uma coisa que eu imaginei. As estrelas, o universo, eu mesmo. Tudo imaginação minha.
– Se você inventou este labirinto, como é que não sabe o caminho?
– Se fosse um caminho, não seria um labirinto. Você tem pouca imaginação, para um rei.
– Pouca imaginação? O que você me diz disto: spiriapau-bupi-pidau-cacapidau-bop!
– O que foi isso?
– Uma frase musical. Inventei na hora. Se eu tivesse o meu clarinete aqui você ia ver imaginação.
– A música sempre me pareceu a forma mais árida de retórica. A literatura é um labirinto sem saída. A música não tem nem entrada. É uma geometria inútil.
– E o tango?
– O tango não é nem literatura nem música. É o contrário.
– A música é um caminho, com começo, meio e fim. E o jazz é um atalho secreto.
– Sempre desconfiei da espontaneidade. Nossas vidas seriam mais suportáveis se as pudéssemos viver só depois da terceira revisão.
– Olha, é melhor ir cada um para um lado. Um de nós encontrará o caminho. Ou você inventará um e eu improvisarei outro.
– Mas você não vê? Não há caminhos. Este é o último labirinto, o que leva sempre ao lugar em que a gente já está. É o que eu chamo de “eternidade”.
– E eu vim cair logo na sua idéia de morte…
– Qual era a sua?
– Sei lá. Algo com o chão vitrificado, cortinas, bem anos 30. Uma banda, algumas garotas…
– Jesus.
– Onde?!
– Não, foi um comentário. Acho que só há uma saída.
– Qual?
– Eu estar imaginando tudo isto.