Acabamentos e restaurações no barro da gente
Arte: Ricardo Machado
Arte: Ricardo Machado
É o verdureiro!
Aqui tem ele
vendendo almeirão, coentro, cebolinha,
taiobas, couvezinha fresca, alface
com gosto de horta e outras verdudes na porta da gente.
Pregão delicioso das manhãs.
Eu atravesso o lago dourado que aparece
no meio da travessia quente
como um oásis, um mimo das dunas,
uma delicadeza delas com os nossos pés,
tolerantes amorosos ao seu calor.
É um lava-pés na cerimônia do deserto.
Aqui passarinho me acorda e me nina
sem contar que tenho mais convívio com insetos
o que abranda minha frescura de cidade.
Reencontro formigas cabeçudas embora ainda não tenha revisto
as tenebrosas tanajuras que sucediam às chuvas de minha infância
Todo dia faço tudo de bicicleta
(Bicicleta aqui entendida como transporte
e passeio).
No caminho para riacho doce
passamos por uma casa-teia de aranha
que mais parecia uma mansão
tamanho era o seu tamanho e o rebuscado de sofisticado tear.
Os olhos divertidos do meu amor batizaram-na imediatamente,
“clã dos Mascaranhas”!
Eu ri.
Aqui o areado das panelas, espelho meu,
me comove.
No ultimo dia do ano
se pode até ganhar um jardim de presente do amor da gente,
um jardim reluzente de amarelas alamandras
e marias-sem-vergonha da cor lilás,
lilás a maria e não a vergonha.
Fora isso o que se dera comigo.
Aqui reencontro pitadas de minha infância,
pinceladas finais restaurações,
vizinhanças onde todos têm quintal e há sempre
uma dona Guiomar dona dos ovos que saem de suas galinhas,
para vendê-los a nós.
Aqui levo acabamentos no meu barro primeiro.
Recebo retoques necessariíssimos
nas camadas que se esfolam na urbanidade.
Não trago pra cá a cidade
nem é com ela que venho pra roça.
Mas, atualizada de roça
e remoçada,
levo comigo
pra cidade,
no meio do peito,
um novo jeito,
essa roça.
Elisa Lucinda é colunista do Extra Classe – elisalucinda@radnet.com.br