O paradoxo chinês – o maior sucesso capitalista do mundo acontecendo no último país comunista do mundo – pode ser visto como um exemplo apoteótico da irrelevância da política nos dias de hoje ou como apenas outro mistério do inescrutável Oriente. Seja como for, o paradoxo se aprofunda. Li há pouco que se discute agora na China a adoção de leis para proteger o trabalhador do capital predatório, que explora a mão-de-obra barata e inesgotável do país e é o responsável pelo bum das exportações e a disparada econômica. As empresas estrangeiras que atuam na China são contra as novas leis que darão força ao sindicato oficial chinês, o único com permissão de existir, e estabelecerão regras sobre contratação, demissão, direitos trabalhistas, etc., que não havia antes. Quer dizer: fica sem sentido a questão sobre o que realmente venceu na China, a experiência comunista, que sacrificou algumas gerações para que a atual se beneficiasse da economia globalizada, ou o livre mercado e a livre empresa, que dão seu show à revelia de velhos dogmas socialistas e dariam de qualquer jeito. Não vale mais discutir se a lição da China é que o coletivismo forçado foi a condição para o progresso atual ou só atrasou a História, já que o que se vê lá é o pior do capitalismo desregularizado, que combate e faz lóbi contra direitos básicos para os trabalhadores por serem desestimulantes para o investimento, e a surpreendente evidência de que depois de quase 60 anos de regime comunista só agora se pensa em direitos de trabalhadores na China. Se as novas regras forem adotadas, isto significará que foi o capitalismo que levou uma legislação social para a China comunista – contra a sua própria vontade. Mais uma daquela velha senhora irônica, a História.
Empresas de pesquisa de opinião pública são um pouco como videntes profissionais, cujas previsões erradas nunca impedem que mantenham sua reputação e sejam consultadas de novo no princípio de cada ano. Mas um engano muito grande nas previsões para esta eleição talvez acabasse para sempre com sua credibilidade. Estou escrevendo de longe – no espaço e no tempo – da votação, mas acho que posso prever, sem risco, ou uma vitória folgada do Lula, ou um vexame histórico dos pesquisadores. Duas hipóteses, para mim, comemoráveis, a primeira porque voto no Lula e a segunda porque diminuiria o poder das pesquisas, que quase transformam votar num ato supérfluo. De qualquer maneira, está tudo acabado, o som, a fúria e as especulações. Chegou o tempo da ponderação. De a oposição pensar no que é melhor para o país além dos seus ressentimentos, de a grande imprensa pensar nos seus excessos e, acima de tudo, de o PT pensar nos seus pecados. O tempo de baixar a bola. Ou pelo menos o volume.