OPINIÃO

Nosso espaço

Publicado em 18 de junho de 2007

Já somos 6 bilhões, não contando o milhão e pouco que nasceu desde o começo desta frase. Se fosse um planeta bem administrado, isto não assustaria tanto. Mas é, além de tudo, um lugar mal freqüentado. Temos a fertilidade de coelhos e o caráter de chacais, que, como se sabe, são animais sem qualquer espírito de solidariedade. As megacidades, que um dia foram símbolos da felicidade bem distribuída que a ciência e a técnica nos trariam – um helicóptero em cada garagem e caloria sintética para todos, segundo as projeções futuristas de anos atrás –, se transformaram em representações da injustiça sem remédio, cidadelas de privilégio cercadas de miséria, uma réplica exata do mundo feudal, só que com monóxido de carbono. Nosso futuro é a aglomeração urbana, e as sociedades se dividem entre as que se preparam – conscientemente ou não – para um mundo desigual e apertado e as que confiam que as cidadelas resistirão às hordas sem espaço. Os jornais ficaram mais estreitos para economizar papel, mas também porque diminui a área para expansão dos nossos cotovelos. Chegaremos ao tablóide radical, duas ou três colunas magras onde tudo terá que ser dito com concisão desesperada. Adeus advérbios de modo e frases longas, adeus frivolidades e divagações superficiais como esta.  A tendência de tudo feito pelo homem é para a diminuição – dos telefones e computadores portáteis aos assentos na classe econômica. O próprio ser humano trata de perder volume, não por razões estéticas ou de saúde, mas para poder caber no mundo.

No Japão, onde muita gente convive há anos com pouco lugar, o espaço é sagrado. Surpreende a extensão dos jardins do palácio imperial no centro de Tóquio, uma cidade onde nem milionário costuma ter mais de dois quartos, o que dirá um quintal. É que o espaço é a suprema deferência japonesa. O imperador sacralizado é ele e sua imensa circunstância. Já nos Estados Unidos, reverencia-se o espaço com o desperdício. Para entender os americanos você precisa entender a sua classificação de camas de acordo com o tamanho: queen size, tamanho rainha, king size, para reis, e, era inevitável, emperor size, do tamanho de jardins imperiais. É o espaço como suprema ostentação, pois – a não ser para orgias e piqueniques – nada é mais supérfluo do que espaço sobrando numa cama, exatamente o lugar onde não se vai a lugar algum.

Os americanos ainda não se deram conta de que, quando chegar o dia em que haverá chineses embaixo de todas as camas do mundo, quanto maior a cama, mais chineses.

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