Fragilidade política e violência policial
A situação política no RS virou tema de interesse nacional. A colunista Maria Inês Nassif, do jornal Valor Econômico, escreveu: “a ação articulada e rápida do MP estadual, da Justiça e da polícia gaúcha está cassando direitos civis e políticos de cidadãos brasileiros. Inclusive o direito ao voto”. Na revista Carta Capital, o cientista político Aldo Fornazieri afirmou: “Nem na ditadura militar proibiu-se que um movimento social negociasse com o poder público em torno de reivindicações. Nunca vi isso”. E Mauro Santayana escreveu, no Jornal do Brasil, a propósito da ação do MP: “O documento, em seu radicalismo, e em sua minuciosa construção de um fantasioso projeto revolucionário, em pouco difere do famoso Plano Cohen, redigido pelo então capitão Olímpio Mourão Filho, para uso dos integralistas, e que serviu de pretexto para o golpe do Estado Novo, em 1937”.
Em artigo publicado no jornal Zero Hora (29 de junho, 2008), o procurador da República, Flávio Santanna Xavier, criticou duramente a decisão do MP e a situação política no estado. “Repugna à consciência republicana que no limiar do terceiro milênio a questão agrária, em nosso estado, seja tratada como mero caso de polícia. É da democracia que segmentos sociais ou grupos políticos se contraponham à concretização da reforma agrária, que parcela da opinião pública mire seu descontentamento em determinado método de luta pela terra ou que advogue melhores resultados nos projetos de assentamentos então existentes”, escreveu. A raiz do problema no campo, acrescentou, é a total incapacidade estatal em promover a reforma agrária no estado, manietado – com o silêncio de todos, inclusive dos Ministérios Públicos – que está em promover esta importante política pública.
Retórica política obscurantista
Outro a se manifestar contra a escalada de autoritarismo no estado foi o sociólogo Zander Navarro, do Departamento de Sociologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, que escreveu um artigo manifestando solidariedade irrestrita ao MST e à reação ao “abuso de poder que vem tentando encurralar os trabalhadores rurais semterra de exercerem um direito constitucional de organização”. Ele também critica o Ministério Público estadual que fez graves acusações ao movimento, sugerindo o seu cerceamento, e condena a citação de seu nome na ação do Ministério Público de forma distorcida. Para Zander Navarro, a ação do MP revelou uma “surpreendente retórica politicamente obscurantista”: “Em sua essência, o MP desenvolve uma fantasiosa teoria sobre as formas de luta social que vêm sendo organizadas há tantos anos pelos trabalhadores rurais sem-terra no estado”.
Na mesma linha, o procurador do Estado aposentado, Jacques Alfonsin, afirmou que a ação do Ministério Público gaúcho ressuscita práticas da ditadura no Brasil. Para Alfonsin, há uma ação orquestrada no Rio Grande do Sul, baseada na perseguição ideológica. “Nós estamos enfrentando uma situação de violação flagrante dos direitos humanos, de uma infidelidade manifesta do MP às suas próprias finalidades. Quem lê a petição inicial vê que o MP vestiu a camisa dos latifundiários. Na Constituição Federal, a função do MP não é perseguir pobre, nem evitar pressão social de gente que está reivindicando reforma agrária”. Para Alfonsin, está em curso no RS um processo de abuso de poder e de autoridade. O relatório secreto do Conselho Superior do MP estava preparando essas ações desde dezembro de 2007, tendo como objetivo a dissolução do MST, denunciou.
Senado investiga violência no estado
A violência do estado contra os movimentos sociais foi tema da audiência pública da Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal, dia 24 de junho, na Assembléia Legislativa gaúcha. No encontro, foi exibido um vídeo com 13 atos de violência contra os movimentos sociais. Na audiência, também foi divulgada a ata do Conselho Superior do Ministério Público que deliberou a formulação de uma política de intervenção do MP pelo fim do MST, de suas escolas, pela investigação do Incra, da Conab e da Via Campesina. O documento de três páginas sugere o impedimento de marchas, de deslocamentos dos agricultores, assim como a desativação de acampamentos. Também sugere o cancelamento do alistamento eleitoral dos agricultores sem-terra nas regiões em conflito e a formulação de uma política oficial do MP com a finalidade de “proteção da legalidade no campo”.