OPINIÃO

A reação conservadora contra a participação

Por Marco Weissheimer / Publicado em 14 de julho de 2014
Movimento Copa pra Quem?, na Rodoviária do Plano Piloto, em Brasília, incorpora luta por direitos das mulheres e população LGBT

Foto: Antônio Cruz/ Agência Brasil

Movimento Copa pra Quem?, na Rodoviária do Plano Piloto, em Brasília, incorpora luta por direitos das mulheres e população LGBT

Foto: Antônio Cruz/ Agência Brasil

No final de maio, a presidenta Dilma Rousseff anunciou a proposta de criação da Política Nacional de Participação Social (PNPS), com o objetivo de fortalecer e articular os mecanismos e as instâncias democráticas de diálogo e a atuação conjunta entre o governo federal e sociedade civil. A ideia é estimular conselhos, conferências, ouvidorias, mesas de diálogo, consultas públicas, audiências públicas e ambientes virtuais de participação social.

Entre 2003 e 2012, mais de 7 milhões de pessoas participaram de 87 conferências nacionais, em 40 áreas setoriais. No âmbito do governo federal, existem hoje mais de 120 conselhos, dos quais cerca de 40 têm na sua composição expressiva presença de representantes da sociedade civil. Além disso, hoje, estão ativas cerca de 270 ouvidorias públicas federais que auxiliam o cidadão em suas relações com o governo.

O projeto provocou a reação de setores conservadores e editoriais irados em alguns meios de comunicação. O jornal O Estado de São Paulo, por exemplo, afirmou que a “instituição de conselhos populares abriria o risco de criação de um poder político paralelo no país”. As críticas do jornal chegaram ao extremo de sugerir que o objetivo de Dilma Rousseff seria criar uma espécie de “soviets” (os conselhos de trabalhadores dos revolucionários bolcheviques russos) para acabar com o Parlamento.

Os críticos da iniciativa retomaram um debate que já foi superado inclusive no âmbito de organismos internacionais como o Banco Mundial e a própria Organização das Nações Unidas (ONU). A Unesco, por exemplo, sustenta que é necessário reforçar práticas democráticas de construção coletiva como condição para construção de uma nova ordem social mundial.

O organismo da ONU defende, há anos, propostas como: o fortalecimento da participação de movimentos sociais e outras organizações da sociedade civil no processo de tomada de decisões em nível de Estado e de governos; a criação de novas instâncias de regulação em nível nacional e internacional para fortalecer o controle e a participação da sociedade no Estado; abertura de espaços para atores não estatais como forma de criar uma governança do sistema mundial baseada em princípios democráticos.

Um manifesto em defesa da participação
Diante da reação conservadora, um grupo de juristas, acadêmicos, intelectuais e lideranças de movimentos sociais lançou um manifesto em defesa da Política Nacional de Participação Social. Os primeiros signatários do manifesto foram os juristas Fabio Konder Comparato, Celso de Mello e Dalmo Dallari, José Antônio Moroni (do Inesc, Instituto de Estudos Socioeconômicos) e João Pedro Stédile (do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra).

O manifesto defende o decreto afirmando que ele “contribui para a ampliação da cidadania de todos os atores sociais, sem restrição ou privilégios de qualquer ordem, reconhecendo, inclusive, novas formas de participação social em rede”. Além disso, sustenta que a proposta não possui nenhuma inspiração antidemocrática, “pois não submete as instâncias de participação, os movimentos sociais ou o cidadão a qualquer forma de controle por parte do Estado Brasileiro; ao contrário, aprofunda as práticas democráticas e amplia as possibilidades de fiscalização do Estado pelo povo”.

Não parece ser um acaso que as mesmas vozes e os mesmos argumentos que se erguem agora contra a proposta de uma Política Nacional de Participação tenham se manifestado contra a proposta de realização de um plebiscito e de uma Assembleia Nacional Constituinte Exclusiva para fazer a Reforma Política. Não deixa de ser surpreendente que isso ocorra no momento em que o sistema partidário brasileiro é pressionado a aceitar mudanças mais profundas que alterem o quadro atual de influência do poder econômico na definição e eleição de candidaturas, e de domínio de burocracias partidárias que tem como objetivo prioritário a manutenção do seu poder e a garantia de sua reprodução. A agenda da Reforma Política e da participação popular está no centro deste debate.

Movimentos sociais e organizações sindicais estão organizando um plebiscito que será realizado entre 1º e 7 de setembro em todo o país. Embora não tenha força legal, a iniciativa espera desencadear uma forte mobilização política e social em defesa da convocação de uma Constituinte Exclusiva para fazer a reforma política. Após os protestos de junho de 2013, as eleições deste ano e a participação nesse plebiscito dirão até que ponto a população brasileira está mesmo disposta a reformar o sistema partidário e de representação política do país.

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