OPINIÃO

Reforma Política e integração: alguns desafios do 2º governo Dilma

Publicado em 10 de novembro de 2014
Reeleição de Dilma coloca na ordem do dia a necessidade de fazer avançar os projetos de integração regional

Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil

Reeleição de Dilma coloca na ordem do dia a necessidade de fazer avançar os projetos de integração regional

Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil

O mundo inteiro acompanhou com atenção a eleição presidencial no Brasil. Essa atenção foi resultado direto do maior protagonismo internacional que o nosso país assumiu na última década, especialmente a partir do governo Lula. Mas foi resultado também da expectativa – e aberta torcida em alguns casos – de uma possível vitória da oposição no Brasil, que interromperia o ciclo de governos petistas e provocaria fortes mudanças no plano interno e também, muito provavelmente, na política externa brasileira. Não foi uma eleição presidencial qualquer. Ela definiu a continuidade da atual direção política do maior país da América Latina, com repercussões diretas e indiretas em todo o continente. E não só do continente. O futuro dos Brics (grupo que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), por exemplo, dependia fortemente de uma vitória de Dilma.

Durante sua campanha, o candidato do PSDB, Aécio Neves, chegou a defender o fim do Mercosul. Em uma palestra realizada no Fórum da Liberdade, em Porto Alegre, Aécio classificou o Mercosul como uma “coisa anacrônica” que não estaria “servindo a nenhum interesse dos brasileiros”. Para o candidato tucano, o Brasil deveria substituir o Mercosul por uma área de livre comércio que permitisse acordos bilaterais. Na campanha, o ex-governador de Minas Gerais também criticou investimentos que o Brasil está fazendo em outros países, como o porto de Mariel, em Cuba, objeto de discursos por parte do tucano que lembraram os anos da Guerra Fria. Projetos como o do Mercosul, União de Nações Sul-Americanas (Unasul) e Banco do Sul estariam seriamente ameaçados caso Dilma não vencesse as eleições.

A reeleição de Dilma, por outro lado, coloca na ordem do dia a necessidade de fazer avançar os projetos de integração regional. Em recente entrevista ao portal francês Mediapart (www.mediapart.fr), o assessor especial da Presidência da República para Assuntos internacionais, Marco Aurélio Garcia, apontou alguns desses desafios, em especial no caso da Unasul: “Os conselhos, que são equivalentes aos ministérios, não estão avançando de modo suficientemente rápido. A integração das infraestruturas segue pequena e a população da região ainda não se reconhece como parte de algo chamado Unasul. Além disso, é preciso fazer avançar um dos principais projetos, que é aquele de uma política de defesa comum. O Brasil teve, durante décadas, uma lógica de defesa nacional pensada em função de três inimigos: o comunismo internacional, a Argentina e a esquerda vista como inimigo interno. Hoje, o comunismo internacional desapareceu, a Argentina é o nosso principal parceiro e o inimigo interno está no poder”.

Além de esvaziar o Mercosul, a Unasul e os Brics, Aécio também pretendia alterar o modelo de exploração das reservas de petróleo do pré-sal, recolocando a Petrobras na esfera de influência dos Estados Unidos. Marco Aurélio Garcia respondeu assim às críticas feitas por tucanos a uma “politização excessiva” da política externa brasileira: “Essa é para rir. Uma política externa que não seja politizada é, em si mesmo, uma contradição. Nosso projeto nacional de desenvolvimento não é o mesmo de Fernando Henrique Cardoso nem de Aécio Neves, e isso implica escolhas diferentes. Quanto à utilização de empresas como a Petrobras como instrumentos de política externa, me parece que, salvo nova ordem, a Petrobras é uma empresa controlada pelo Estado brasileiro e não por acionistas privados”.

O modelo de desenvolvimento adotado a partir do governo Lula e que prossegue agora nos governos de Dilma Rousseff se expressa também nas diretrizes gerais da política externa brasileira que vem investindo na integração da América Latina e na construção de novas instâncias de articulação e governança internacional, saindo da tradicional esfera de influência dos Estados Unidos, sob a qual o Brasil permaneceu durante muitas décadas. “Duzentos anos após a Revolução Francesa”, assinalou ainda Marco Aurélio Garcia, “todos os modelos de transformação social se esfarelaram e nenhuma alternativa concreta apareceu. Ao mesmo tempo, vimos surgir outros caminhos como este que está sendo seguido pelo Brasil na luta pela justiça social”. Dilma terá a responsabildade de fazer esse modelo avançar. Para isso, terá que resolver alguns problemas internos. Um dos principais, senão o principal, é o da Reforma Política. Sem mexer no sistema político de representação brasileiro, o avanço dos projetos citados acima seguirá refém de um Congresso conservador e partidário da lógica de curto prazo dos balcões de negócios da política.

O avanço e qualificação dos processos de integração regional dependem de uma intervenção política mais qualificada internamente e de mais espaço de participação para a sociedade. Esse será um dos principais desafios que Dilma Rousseff enfrentará em seu segundo mandato, a partir de janeiro de 2015.

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