Ilustração: Ricardo Machado
Ilustração: Ricardo Machado
Ironia. Os pais da pátria americana inventaram o colégio eleitoral para evitar que algum demagogo ou incapaz chegasse à Presidência da nova República pelo voto popular.
Isto é, imitaram o modelo político greco-romano de governo por uma casta, que pode ser chamado de democracia mas não demais, confiando que isto impediria a eleição de algum Trump.
E foi o colégio eleitoral que elegeu o demagogo e, sabe-se agora, incapaz Trump, com menos votos populares do que a Hillary.
Discute-se agora, nos Estados Unidos, o fim do colégio eleitoral para tornar as eleições mais democráticas.
Mas uma discussão sobre democracia mais consequente, pois é uma questão mundial, é a dos limites da liberdade de expressão em sociedades ameaçadas por manifestações fascistas cada vez mais frequentes.
Jovens carregando tochas e gritando slogans antissemitas, como em Charlottesville, estão exercendo a liberdade de reunião e opinião asseguradas numa democracia, por mais repelente que ela seja, ou nenhuma democracia pode tolerar a pregação aberta de ideias tóxicas sem combatê-las como se combate qualquer outro tipo de epidemia mortal?
Manifestações fascistas não nascem de patologias individuais ou do nada. O fascismo tem uma história, um prontuário de crimes, um catálogo de horrores.
A juventude dos que participam de marchas neonazistas não os desculpa, eles optaram conscientemente por um movimento que não esconde sua truculência e tem um passado notório.
Pior do que os jovens encenando seus rituais macabros são os políticos que os apoiam velada ou abertamente, como Trump, e os teóricos da superioridade racial que não saem à rua.
Resta a questão dos limites da liberdade de expressão em países em que a onda fascista sobe e testa a tolerância democrática.
Talvez o debate deva ser entre, de um lado, a tese de que as democracias se fortalecem quanto maior a tolerância exigida delas, e, de outro, a tese de que a democracia deve ser tolerante, sim, mas até o limite do suicídio.