OPINIÃO

Desilusão

Por Luis Fernando Verissimo / Publicado em 19 de dezembro de 2018

Ilustração: Ricardo Machado

Ilustração: Ricardo Machado

“Desilusão, desilusão…” O samba Dança da solidão, do grande Paulinho da Viola, cantado pela grande Marisa Monte, seria um fundo musical perfeito para estes estranhos tempos.

Poderíamos chamá-lo de leitmotiv da nossa desesperança, se quiséssemos ser bestas. A desilusão começou quando? Dá para escolher. No fim da ditadura que o Bolsonaro diz que nunca existiu, quando Tancredo ia tomar posse como o primeiro presidente civil em 20 anos, mas os germes hospitalares de Brasília tinham outros planos? Depois viria o entusiasmo seguido de grande frustração com Collor, o Breve, tão bonito, tão moderno, tão raso, a desilusão com o PT e a desilusão com os políticos em geral, agravada com as revelações de que até grão senhores da República levavam bola. E a desilusão com o 7 a 1, e a desilusão com a seleção do Tite, e a desilusão com a votação maciça para presidente de um homem notoriamente despreparado para o cargo por eleitores desiludidos e iludidos. Agora, os que claramente anseiam por heróis veem o Sergio Moro aceitar o Ministério da Justiça do novo governo, como recompensa (se não é, parece) por ter despachado o Lula para a cadeia ligeirinho e publicado a delação do Palocci contra o Lula dias antes da eleição. Até os mitos desiludem.

Por falar em escândalos… O samba do Paulinho também tem um verso que, ligeiramente adaptado, nos diz respeito: “Quando eu penso no futuro, não esqueço o passado”. Se esta eleição presidencial por grande maioria provou alguma coisa, é que nosso passado não tem mais nenhuma relevância política. A ditadura foi esquecida, até os generais estão voltando. Bolsonaro pode ter razão, a ditadura pode nunca ter acontecido, o golpe de 64 pode ter sido apenas um movimento de tropas, como disse o Toffoli. Foi tudo um delírio, vamos esquecê-lo. Rubens Paiva, Stuart Angel, Vladimir Herzog, Manuel Fiel Filho e as centenas de supostos desaparecidos, podem voltar. Acabou a farsa. E façam suas apostas: o que vai ser esclarecido primeiro, o caso da bomba no Riocentro, do qual nunca se ouviu mais nada, ou o caso da Marielle, que também não?

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