POLÍTICA

Dono das lojas Riachuelo lança pré-candidatura em meio a denúncias

Grupo Guararapes acumula mais de 70 ações do MPT e pedido de indenização no valor de R$ 37,7 milhões por danos coletivos aos trabalhadores
Por Thiago Coppetti / Publicado em 19 de março de 2018

Foto: Reprodução Youtube

Rocha integra o movimento liberal Brasil 200, lançado por empresários

Foto: Reprodução Youtube

Caso o empresário Flávio Rocha, presidente das Lojas Riachuelo, realmente venha a entrar na corrida presidencial nas Eleições 2018, a candidatura poderá se configurar em uma nova aberração política no cenário brasileiro. A exemplo da desgastada figura da deputada federal Cristiane Brasil (PTB-RJ), filha de Roberto Jefferson, que quase assumiu o Ministério do Trabalho mesmo já tendo sido condenada em ações trabalhistas, o executivo não é afeito a respeitar direitos dos trabalhadores, segundo o Ministério Público do Trabalho (MPT). Mas, no caso de Rocha, a zombaria sobre o tema é ainda pior: a empresa foi financiada, inclusive, com dinheiro público, via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (Bndes).

Nos últimos 15 anos, o grupo Guararapes Confecções, de propriedade da família Rocha e dono das Lojas Riachuelo, acumula mais de 70 ações do MPT, apenas no Rio Grande do Norte, sede da empresa – entre casos ativos, arquivados e com Termos de Ajustamento de Conduta. Nesse mesmo período, o grupo assinou contratos de financiamento com o Bndes, ou seus agentes, em um valor total próximo de R$ 4 bilhões. Apenas em 2014 o banco autorizou a liberação de R$ 2,4 bilhões em linhas de crédito ao grupo. Procurada, a assessoria do Bndes não se posicionou sobre o fato de, apesar de acumular tantas ações do MPT, a empresa estar habilitada a receber dinheiro público. Basicamente, o Ministério Público aponta que a Lojas Riachuelo vem precarizando e desrespeitando as relações e diretos trabalhistas há anos.

As mais recentes ações se referem à contratação de pequenas confecções no interior do Rio Grande do Norte como se fossem independentes, mas que, na verdade, estão subordinadas diretamente ao grupo em suas decisões administrativas e operacionais. Em recente inspeção em mais de 50 confecções, em 12 municípios, o MPT ouviu trabalhadores e faccionistas, que relataram as dificuldades financeiras pelas quais vêm passando para pagar salários, 13º e férias. O preço da costura das peças, fixado pela Guararapes (atualmente R$ 0,35 o minuto), não é suficiente para cobrir os custos operacionais, dizem os procuradores do MPT. O desequilibro de contratos, valores e regras estão deixando pequenos proprietários de confecções endividados e centenas de trabalhadores sem a mínima segurança de renda e de futuro. Um grupo de trabalho, coordenado pelo procurador Marcio Amazonas, foi especialmente criado para acompanhar o caso.

Expansão com dinheiro público e precarização do trabalho

Riachuelo_Divulgação

Loja conceito da Riachuelo em São Paulo

Riachuelo_Divulgação

“Por meio de um programa do governo do Rio Grande do Norte, chamado Pró-Sertão, o grupo Guararapes montou confecções levando pequenos empresários a obter empréstimos para compra de máquinas que eles mesmos determinaram, montando equipes de 25 a 30 costureiras cada, também por orientação do grupo, sem qualquer autonomia, com menor remuneração e menos direitos do que os empregados contratados da Guararapes. A empresa, na verdade, expandiu suas linhas de produção com financiamento público ao mesmo tempo que reduziu e precarizou as relações trabalhistas no Estado”, destaca o procurador Márcio Amazonas. Em ação ainda em curso, o MPT entrou com pedido de indenização por danos morais coletivos, no valor de R$ 37,7 milhões, que corresponde à parte do lucro obtido pela Lojas Riachuelo com o trabalho das confecções.

Ainda de acordo com o MPT, a proposta de gerar trabalho no sertão via programa de incentivos estaduais foi burlado pela empresa. Em nota, o Ministério Público divulga que a própria Guararapes informou que transferiu 17% da sua produção, no município de Extremoz, para as confecções do Pró-Sertão, mas o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho demonstra que não houve criação de novos empregos. Em dezembro de 2013 (ano de criação do Programa Pró Sertão) a Guararapes contratava 10.034 empregados, e em abril de 2017, o seu quadro de pessoal era de 7.539 empregados. “A conclusão é que a Guararapes não gerou novos empregos no Rio Grande do Norte, mas transferiu empregos diretos da sua fábrica para as pequenas confecções, as quais passaram a arcar com todo o risco da atividade econômica”, diz o MPT. Procuradas para comentar o caso, as assessorias de comunicação do governo do Rio Grande do Norte e da secretaria de Desenvolvimento do Estado não se pronunciaram.

Também procurada pelo jornal Extra Classe, a Guararapes Confecções nega a precarização do trabalho e diz que a “teoria de subordinação estrutural não se aplica às oficinas cadastradas pelo programa Pró-Sertão, que prestam serviços para a Riachuelo, já que estas têm total poder de decisão para quais marcas vão produzir” e que os contratos cumprem as normas do programa criado pelo governo do Estado e parceiros. Curiosamente, também em resposta enviada ao jornal Extra Classe, a empresa ressalta que “o MPT/RN não acionou as demais empresas participantes do Pró-Sertão, que também mantêm contratos com as oficinas de costura”, como se o fato de ser a única autuada demonstrasse perseguição, e não erros da empresa.

Menos que o salário mínimo e jornadas exaustivas

Foto: MST

Mulheres do MST ocupam e paralisam a produção do Grupo Guararapes, ligado à Riachuelo

Foto: MST

Para o presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria da Fiação e Tecelagem do Rio Grande do Norte, José Nogueira Filho, com os baixos valores repassados às costureiras das pequenas confecções, a remuneração em alguns meses mal alcança meio salário mínimo. E, internamente, diz Nogueira, a situação dos empregados também enfrenta problemas. “E não vemos muitas perspectivas de mudança. Internamente, os trabalhadores também vivem sob grande pressão e jornadas exaustivas”, critica o sindicalista.

No início de março, cerca de 800 mulheres do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ocuparam uma das fábricas do grupo e paralisaram a produção da empresa em Extremoz, Rio Grande do Norte, em protesto contra o sistema de trabalho da indústria e contra os incentivos fiscais estaduais concedidos à empresa.

Os recorrentes problemas da Lojas Riachuelo e da Guararapes confecções com o MPT, porém, não inibem e nem impedem que o empresário Flavio Rocha percorra o país com um discurso moralizante sob a bandeira do Movimento Brasil 200, criado por ele e um grupo de empresários. Na capital gaúcha, em fevereiro, por exemplo, após criticar a política como fonte de toda a corrupção, questionado sobre a participação de grandes empresários nos esquemas, se posicionou como um empresário diferenciado. “Existem empresários de conchavo e empresários de mercado. Somos empresários de mercado”, disse.

Em eventos no Rio Grande do Norte, Rocha confirmou sua pré-candidatura à presidência da República em 2018. Integrantes do Movimento Brasil Livre (MBL) anunciaram apoio à sua candidatura.

O empresário foi deputado federal pelo PFL (hoje DEM), nos anos 1980, e também foi pré-candidato a presidente da República, em 1994. Abandou a disputa depois de denúncias de superfaturamento envolvendo sua equipe e a venda de chamados “bônus eleitorais”. Nada, porém, que impeça o empresário de desfilar suas propostas de Norte a Sul. No início deste mês, na cidade gaúcha de Não-Me-Toque, Rocha (ainda sem partido) esteve na Expodireto, já em pose de campanha, acompanhado pelo deputado federal Jerônimo Goergen (PP).

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