Após tumulto, Moro abandonou sessão da CCJ
Foto: Marcelo Camargo/ ABr
Depois de mais de sete horas de sessão, a audiência com o ex-juiz e atual ministro da Justiça, Sergio Moro, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara foi encerrada na noite de terça-feira, 2, com tumulto generalizado após pronunciamento do deputado Glauber Braga (PSol-RJ), que afirmara “o senhor será conhecido como “o juiz mais corrupto da história do Brasil” e o chamara de “juiz ladrão”. “A população brasileira não vai aceitar como fato consumado um juiz ladrão e corrompido que ganhou uma recompensa para fazer com que a democracia brasileira fosse atingida. É o que o senhor é: um juiz que se corrompeu e, apesar dos gritos, um juiz ladrão”, completou Braga.
Em meio a protestos de parlamentares governistas, que interpelaram o deputado do PSol, Moro deixou a sessão cercado por seguranças e saiu por uma porta lateral. “Acho que prestei informações, respondi, houve até alguns ataques, acho que a gente respondeu tudo. No final um deputado absolutamente despreparado, que não guarda o decoro parlamentar, fez uma agressão, umas ofensas que são inaceitáveis. E infelizmente se teve de encerrar a sessão e a culpa é desse deputado absolutamente despreparado, Clauber, acho, Glauber alguma coisa, sabe Deus lá de onde veio isso aí”, disse em coletiva em uma das galerias da Câmara. Glauber ironizou: “O Moro me chamar de desqualificado é um elogio. Porque alguém como ele que se vendeu, que se corrompeu e que, depois, recebeu um cargo no ministério de Jair Bolsonaro exatamente por ter se vendido, o nome disso é corrupção. Ele mente quando diz combater a corrupção, ele tem um projeto de poder próprio”, disparou.
Foto: Agência Câmara
Moro fora convocado a prestar esclarecimentos sobre mensagens trocadas com procuradores no âmbito da Operação Lava Jato, que vêm sendo divulgadas pelo site The Intercept Brasil. Desde a manhã, o depoimento do ministro a parlamentares de três comissões, CCJ, de Trabalho, Administração e Serviço Público, e de Direitos Humanos e Minorias, foi marcada pelo enfrentamento entre os deputados de oposição e da base do governo.
Ao contrário do que ocorrera no Senado, em junho, quando foi blindado pela bancada governista, Moro foi confrontado sem trégua pela oposição. Sem esconder a irritação com algumas perguntas, argumentou que “não há inocentes” e se colocou como vítima e não acusado das investigações da Polícia Federal sobre a troca de mensagens divulgadas pela imprensa. “Qual foi a mensagem que revela que tem inocente condenado? Que inocentes?”, desabafou. O ex-juiz da Lava Jato adotou uma posição dúbia em relação ao conteúdo dos diálogos, cuja legitimidade ele ora questiona, ora admite como verídicas.
Depois de dizer que “o que existe é uma invasão criminosa de hackers” e “não está demonstrada autenticidade das mensagens”, ora afirmando não reconhecer a autenticidade, ora admitindo que “pode ter algumas mensagens que eu possa ter mandado”, Moro qualificou o material como “escândalo fake já afundado ou afundando”, “um balão vazio”. Sobre o Intercept, disse ter ficado com a impressão de que o objetivo do site era provocar uma busca e apreensão. “Talvez para aparentar uma espécie de vítima, um mártir da imprensa ou coisa parecida”, ironizou. O ministro também voltou a criticar a OAB, que havia sugerido que ele deixasse o cargo para que as investigações pudessem ser conduzidas de forma isenta: “embarcou no sensacionalismo barato dos primeiros dias”.
Foto: TV Câmara/ Reprodução
LIBERDADE DE IMPRENSA – Para parlamentares de oposição, Moro foi incapaz de apresentar respostas às acusações de que fraudou o processo judicial contra o ex-presidente Lula e, por consequência, a eleição presidencial de 2018. A líder da Minoria na Câmara dos Deputados, Jandira Feghali (PCdoB-RJ), diz que as conversas reveladas pelo The Intercept Brasil entre o então juiz Sergio Moro e o procurador Deltan Dallagnol ferem o Estado Democrático de Direito e a Constituição Federal. “A palavra que eu menos ouvi aqui foi democracia. O cidadão comum quer a garantia do seu direito de defesa, a garantia de um tribunal imparcial. Sinceramente, para mim, é a questão democrática que está em jogo. O senhor se comporta como sócio da acusação”, afirmou a parlamentar.
Moro também foi duramente criticado depois que circulou a notícia de que a Polícia Federal, sob seu comando como ministro da Justiça, está investigando o jornalista Gleen Greenwald, do site The Intercept Brasil, que detém os arquivos originais das trocas de mensagens de textos e vídeos entre o então juiz e procuradores da Lava Jato. A reação do ministro contra a liberdade de imprensa repercutiu na imprensa internacional. Interpelado por deputados que formularam diversas questões, ele respondeu em bloco. A uma pergunta sobre sua decisão de investigar Greenwald ter se configurado crime contra a liberdade de imprensa prevista na Constituição, Moro respondeu de forma lacônica: “Enfim, liberdade de imprensa, paciência”.
O site americano HuffPost destaca que Moro agora “encara seu próprio escândalo” e afirma que ele peca “por excesso de ambição e de vaidade”. O jornal francês Le Monde qualificou “o agora ministro do presidente de extrema-direita” como um “herói caído da anticorrupção”. “E foi Moro, uma figura partidária de direita com ilusões messiânicas, disposta a acabar com o Estado de Direito em busca de seus objetivos, que desempenhou o papel principal de colocá-lo lá”, disse o britânico The Independent.