POLÍTICA

Diálogos entre juiz e promotores são “triviais”, diz Moro

Ministro da Justiça foi questionado em audiência na Câmara dos Deputados sobre trocas de mensagens com procuradores no âmbito da Lava Jato
Por Gilson Camargo / Publicado em 2 de julho de 2019
Ministro afirma que “invasão” de celulares de autoridades para obter mensagens faz parte de uma “tentativa criminosa de invalidar condenações” da Lava Jato, ao mesmo tempo em que admite que diálogos entre juiz e promotores são rotina nos tribunais

Foto: Pablo Valadares/ Agência Câmara

Ministro afirma que “invasão” de celulares de autoridades para obter mensagens faz parte de uma “tentativa criminosa de invalidar condenações” da Lava Jato, ao mesmo tempo em que admite que diálogos entre juiz e promotores são rotina nos tribunais

Foto: Pablo Valadares/ Agência Câmara

Três comissões da Câmara dos Deputados (de Constituição e Justiça e de Cidadania; de Trabalho, Administração e Serviço Público; de Direitos Humanos e Minorias) realizam audiência pública com o ministro da Justiça, Sérgio Moro, nesta terça-feira, 2. Moro é questionado sobre o conteúdo revelado pelo site de notícias The Intercept Brasil, que vem publicando mensagens trocadas por Moro no âmbito da operação Lava Jato, com o coordenador da força-tarefa em Curitiba, o procurador Deltan Dallagnol, e com outros procuradores membros da força-tarefa.

Em sua manifestação inicial, de 20 minutos, Moro voltou a questionar a legitimidade das mensagens divulgadas pelo Intercept e replicados pela Folha de S. Paulo e revista Veja, mas reafirmou que conversas entre juiz, advogados e procuradores, seriam uma prática “trivial” no judiciário brasileiro. Ele defendeu o trabalho da Lava Jato, disse que nunca agiu de forma ilegal e reiterou que não reconhece a autenticidade das mensagens divulgadas pelo site The Intercept Brasil. O ministro alega que a “invasão” de celulares de autoridades para obter mensagens faz parte de uma “tentativa criminosa de invalidar condenações” da Operação Lava Jato. “Alguém com muitos recursos está atrás dessas invasões. O objetivo é atacar a operação Lava Jato e invalidar condenações”, acusou. “O que existe é uma invasão criminosa de hackers”, repetiu. A linha de defesa do ministro consiste em afirmar que não está demonstrada autenticidade das mensagens, que ele não reconhece, afirma que “pode ter algumas mensagens que eu possa ter mandado”, e argumenta que “sempre agi com base na lei” e que “minha preocupação é que o objetivo principal seja evitar o prosseguimento das investigações”.

Moro: “pode ter algumas mensagens que eu possa ter mandado”

Foto: TV Câmara/ Reprodução

Moro: “pode ter algumas mensagens que eu possa ter mandado”

Foto: TV Câmara/ Reprodução

Mais de 130 deputados se inscreveram para questionar Moro. Ao invés de perguntas, ele ouviu elogios dos deputados governistas, que exaltaram o “heroísmo” e a “figura mítica” do ex-juiz. Parlamentares de oposição bateram na tese de que o atual ministro fez conluio com o ministério Público e condenou Lula politicamente.

Rogério Corrêa (PT-MG) leu trechos da reportagem do The Intercept Brasil sobre a orientação dada por Moro ao procurador Dallagnol, a quem o deputado adjetivou como “cretino”. Houve tumulto na audiência e protestos de parlamentares governistas. O presidente da CCJ, Felipe Francischini (PSL) ameaçou encerrar a sessão. Para apaziguar os ânimos, Corrêa disse que retirava o termo “cretino”. Ele foi um dos parlamentares que afirmaram que iriam protocolar pedido de abertura de CPI da Lava Jato.

Na abertura da audiência, Francischini tentou minimizar a gravidade da convocação ao dizer que o ministro estava na Câmara a convite. A presidente da Comissão de Trabalho, Professora Marcivânia (PCdoB) corrigiu: “O requerimento era de convocação, mas um acordo entre a oposição e o Governo o alterou para convite”. “Em que país democrático um jornalista é obrigado a entregar sua fonte?”, indagou. Segundo a parlamentar, se comprovada a autenticidade das mensagens de Moro, o ministro teria violado 18 dos 37 artigos do Código de Conduta dos Magistrados.

Em seu pronunciamento, Helder Salomão (PT) presidente da Comissão de Direitos Humanos, lembrou o vazamento de um áudio entre Lula e Dilma, que acabou resultando no impedimento do petista de se tornar ministro da Casa Civil da então presidente da República, em abril de 2016.

O deputado Coronel Armando (PSL-SC) exaltou a “figura mítica” de Moro na Lava Jato e ao contextualizar o que ele chama de “ditaduras” resultantes da “democracia que o PT defende” disse que os cubanos fogem de carro para Miami para escapar da ditadura, ignorando que o acesso ou a fuga desta ilha do Caribe só são possíveis de barco ou avião.

O líder do PSL, Delegado Waldir, pediu que fossem proibidos pela Mesa os questionamentos que tratassem de temas fora dos vazamentos do The Intercept Brasil. O deputado, que já protagonizou diversos tumultos na Câmara ao desfilar armado entre seus pares, reclamou das citações à condenação de Lula. Francischini negou o pedido.

Moro foi questionado sobre uma fotografia da época em que ele era juiz na qual aparece sorrindo na companhia “de um político”. Ao responder, o ministro defendeu-se, afirmando que o deputado estava sendo investigado. Ao ser confrontado, desconversou, dizendo que não entraria em detalhes. Na foto, Moro aparece ao lado do então senador Aécio Neves (PSDB).

José Medeiros (PODE) contra-atacou: “Essa narrativa começou dizendo que o mundo ia cair, seria uma verdadeira hecatombe…, mas a montanha pariu um rato”, ironizou.

Paulo Pimenta (PT-RS) pediu que Moro apresentasse cinco advogados com quem ele tivesse mantido conversa pelo Telegram ou que apresentasse ao menos uma conversa cordial mantida com o advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins. Eduardo Bolsonaro, filho do presidente, levantara uma placa na qual estava escrita a palavra “Montanha”, apelido atribuído a Pimenta na lista da Odebrecht, na qual um grupo de políticos supostamente teria recebido propina da empreiteira. Novo tumulto interrompeu o pronunciamento. Ao microfone, Pimenta provocou: “Não respondo a criminosos. Onde está o Queiroz?”.

Ao responder aos questionamentos, Moro voltou a pedir que o Intercept Brasil apresente as mensagens vazadas. “Se as minhas mensagens não foram adulteradas, não haverá nada. É um balão vazio cheio de nada”, desafiou.

Acompanhe a audiência, que se estendeu até o início da noite.

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