Política de cortes de Bolsonaro fragiliza a cidadania
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Um levantamento do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) com base em dados do Portal do Orçamento do Senado, publicado na terça-feira, 16, demonstra que os cortes de verbas promovidos por Jair Bolsonaro (PSL) nos seis primeiros meses de governo pouparam setores historicamente privilegiados como Legislativo e Judiciário e se concentraram em áreas relacionadas com a garantia de direitos humanos. Habitação, educação, defesa e direitos da cidadania são as áreas mais atingidas pela política de cortes de recursos que, de janeiro a junho de 2019 já somam R$ 31 bilhões.
Três decretos que determinam o contingenciamento de recursos foram emitidos pelo governo, nos meses de fevereiro, março e maio. “O problema é que esses decretos contêm informações somente referentes aos cortes por órgão, ou seja, por Ministério, o que torna a transparência “opaca”, na medida em que não é possível visualizar em quais políticas públicas os ajustes foram feitos”, esclarece o estudo, assinado pelas assessoras políticas do Inesc, Carmela Zigoni, Cleo Manhas, Leila Saraiva e Livi Gerbase.
Desde junho isso mudou. O Siga Brasil passou a divulgar os dados do contingenciamento a partir das classificações orçamentárias (programa, ação, plano orçamentário etc.), tornando possível maior controle social. Na nota do Inesc, todos os dados foram extraídos desse portal, no dia 12 de junho de 2019, com seus valores indexados pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
CORTES – O programa de Bolsa Permanência no Ensino Superior e o de Apoio à Infraestrutura da Educação Básica tiveram 100% de seus recursos congelados. O programa Minha Casa Minha Vida e as políticas de proteção aos direitos indígenas também estão entre os que mais sofreram com os cortes. “Os contingenciamentos pouparam áreas governamentais que historicamente possuem muitos privilégios, com o Legislativo e o Judiciário, e atingiram fortemente áreas relacionadas com a garantia de direitos humanos, que já vinham sofrendo com a diminuição de recursos nos últimos anos. Com as atuais prioridades do governo e o Teto de Gastos vigente, poucos serão os recursos para a garantia de direitos das minorias brasileiras”, alerta a nota.
Contingenciamentos por função
Foto: Canindé Soares/ Codern/ Divulgação
O contingenciamento afetou praticamente todas as áreas de atuação (funções) da União, exceto Legislativo, Judiciário, Saúde e Reserva de Contingência, mas alguns setores foram mais afetados do que outros. Ao analisar as funções que mais contribuíram para o total contingenciado, as autoras observaram que cerca de um terço foi direcionado a políticas sociais (educação, trabalho, assistência social, direitos da cidadania, segurança pública, habitação, saneamento e organização agrária, entre outras).
Entre essas, o maior corte foi na Educação, que sozinha representou 18% do total contingenciado, evidenciando o pouco caso desse governo em relação à realização dos direitos constitucionais.
Outra função atingida foi a de Encargos Especiais, que perdeu cerca de R$ 8,1 bilhões, equivalentes a 27% do total contingenciado. Os maiores cortes nessa função, que aglutina gastos governamentais não-finalísticos, ocorreram na participação acionária do governo em empresas. As empresas atingidas foram a Infraero, a Eletrobrás, a Emegepron, a Telebrás, a Pré-Sal Petróleo, as Companhias Docas do Rio Grande do Norte e de São Paulo e os Correios.
O maior contingenciamento de participação da União no capital de empresas foi o da Eletrobrás, contabilizando R$ 3,5 bilhões de reais, 11,27% do total contingenciado pelo governo em 2019 (O governo prepara um novo projeto de lei para enviar ao Congresso com o objetivo de viabilizar a privatização da Eletrobrás).
E, finalmente, a Defesa também viu seu orçamento encolher em R$ 5,8 bilhões, ou seja, 19% do total contingenciado. Essa área teve aumento de gastos governamentais entre 2014 e 2018, principalmente no que se refere a despesas com pessoal. O contingenciamento da Defesa Nacional, porém, não focou no gasto com pessoal, e sim em investimentos de material bélico.
Considerando a redução do orçamento em relação ao que havia sido inicialmente previsto, o estudo conclui que a função mais afetada pelos cortes foi a Habitação: o contingenciamento levou mais de 90% dos seus recursos. Na prática, o corte decretou o desaparecimento do Programa Minha Casa Minha Vida, política que está em revisão e só dispõe de recursos até julho.
A segunda área mais atingida é a dos Direitos da Cidadania, que viu seu orçamento encurtar em 27%. Neste setor estão as políticas relacionadas com defesa dos direitos de minorias e setores vulneráveis da sociedade, como mulheres, população indígena e negra, migrantes, consumidores e pessoas com deficiência. Os programas que mais sofreram com cortes nessa função foram “Justiça, Cidadania e Segurança Pública”, e “Proteção e Promoção dos Direitos dos Povos Indígenas”, que tiveram seus orçamentos contingenciados em 44,9% e 32,86%, respectivamente.
Confira a segunda parte desta matéria
Políticas para educação, mulheres e povos indígenas estão asfixiadas