POLÍTICA

Governadores ignoram discurso de Bolsonaro e mantêm medidas de isolamento social

Estados confrontam presidente e ministro da Saúde e não recuam das ações emergenciais para conter a propagação do coronavírus – pandemia já causou 57 mortes no país
Por Flávio Ilha / Publicado em 25 de março de 2020
 Bolsonaro e ministros foram duramente criticados durante videoconferência com governadores

Foto: Marcos Corrêa/PR

Bolsonaro e ministros foram duramente criticados durante videoconferência com governadores

Foto: Marcos Corrêa/PR

Os 26 governadores de estados decidiram nesta quarta-feira, 25, manter as medidas de isolamento e de quarentena para conter a propagação do novo coronavírus, que já contaminou oficialmente 2.433 pessoas no país e causou 57 mortes – uma delas no Rio Grande do Sul. A decisão confronta a sugestão do presidente Jair Bolsonaro e do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, de flexibilização das medidas, como forma de preservar empregos. O governador do Distrito Federal não participou do encontro, realizado por videoconferência.

Na terça-feira, 24, em pronunciamento por cadeia de rádio e TV e contrariando as recomendações científicas, Bolsonaro criticou as medidas de contenção e sugeriu que os governadores retomem as aulas nos seus estados e mantenham medidas restritivas apenas para grupos de risco – pessoas acima de 60 anos ou que tenham comorbidades, como asma, hipertensão e diabetes. Na tarde desta quarta-feira, Mandetta reforçou a fala do presidente e sugeriu inclusive que as igrejas voltem a realizar cultos, desde que evitem aglomerações.

Demandas dos governadores são vitais no enfrentamento dos desafios sanitários e econômicos, alertou o governador gaúcho

Foto: Felipe Dalla Valle/Palácio Piratini

Demandas dos governadores são vitais no enfrentamento dos desafios sanitários e econômicos, alertou o governador gaúcho

Foto: Felipe Dalla Valle/Palácio Piratini

Os governadores reforçaram, em uma carta redigida durante a reunião, que as ações sanitárias convergem com as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS). “O fórum [dos governadores] é importante para que demonstremos unidade no enfrentamento ao coronavírus e a outros temas de interesse comum. As demandas apontadas pelos governadores em relação ao governo federal são vitais para que possamos encarar os desafios sanitários e econômicos que se apresentam”, disse o governador gaúcho Eduardo Leite (PSDB).

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, participou do encontro. Maia recomendou que os governadores ignorem a polêmica levantada por Bolsonaro que, segundo ele, é resultado da pressão de investidores para reduzir perdas na Bolsa de Valores. “Está acontecendo [a pressão] há uns quatro, cinco dias. São milhares de investidores que olham só para as estatísticas, não para as vidas em risco. Temos que sair desse enfrentamento”, recomendou.

Vários governadores se manifestaram, antes da reunião, para criticar duramente a fala do presidente. Ronaldo Caiado, governador de Goiás e aliado incondicional de Bolsonaro, anunciou seu rompimento com o governo. “Não tem mais diálogo com esse homem. As coisas têm que ter um ponto final”, disse. “As decisões do presidente no que diz respeito à saúde e ao coronavírus não alcançam o estado de Goiás”, completou.

O governador de São Paulo, João Dória, também foi incisivo. Numa entrevista coletiva, parabenizou Caiado “pela postura correta em defesa da vida” e se disse “decepcionado” com o discurso de Bolsonaro. “O conteúdo foi equivocado e em oposição ao próprio Ministério da Saúde. Não se trata de uma gripezinha, é um assunto sério, difícil, grave. Lamento que ele prefira escutar o gabinete do ódio a levar em conta o bom-senso e a serenidade que se exigem de um líder”, afirmou.

O governador Leite também confirmou que manterá a quarentena e as recomendações de isolamento social. “O discurso do presidente gerou muita confusão. Não houve, por parte dele, a apresentação de um a alternativa [ao isolamento] com base em dados científicos e confiáveis”, disse em mensagem de vídeo postada nas redes sociais. “Seria tudo mais fácil e efetivo se houvesse a disposição do presidente para colaborar nesse processo. Infelizmente não é o que está se observando”, completou.

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