POLÍTICA

Inércia e falta de seriedade colocam Bolsonaro e teto de gastos em xeque

Protestos de janelas, críticas de economistas e de setores políticos até mesmo da base governista obrigam manifestação conjunta de ministérios e do presidente para anunciar medidas para atenuar crise
Por Marcelo Menna Barreto / Publicado em 18 de março de 2020
Coletiva de imprensa do presidente Bolsonaro e ministros para anunciar medidas contra o coronavíirus

Foto: Reprodução/TV Brasil

Coletiva de imprensa do presidente Bolsonaro e ministros para anunciar medidas contra o coronavíirus

Foto: Reprodução/TV Brasil

Inércia e as idas e vindas do presidente Jair Bolsonaro na crise do novo Coronavírus (Covid-19) no Brasil é, na opinião de analistas políticos, a principal fonte da insatisfação da população. Ontem, 17, antecipando em um dia a grande convocação nacional para o ato “Vozes da janela contra Bolsonaro” chamado nas redes sociais para as 20h30 dessa quarta-feira, importantes cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Belo Horizonte e Porto Alegre realizaram espontaneamente panelaços e gritos de “fora Bolsonaro”. Hoje, os editoriais dos principais jornais do país cobram uma postura do presidente. O Globo, por exemplo, diz “Bolsonaro tem de cumprir seu papel contra o coronavírus”. A Folha de São Paulo é mais direta em seu título: “Evitar uma tragédia”.

Chefe de gabinete de um importante parlamentar vinculado à base de sustentação do governo disse ao Extra Classe acreditar que “a gota d’água” foi Bolsonaro ter solicitado ao Congresso a decretação de Estado de Calamidade Pública. Até então, menos de 12 horas antes, o mandatário passou boa parte do seu tempo minimizando os efeitos da pandemia e afirmando em diversas ocasiões no meio de piadas que existia uma “histeria”.

No fogo cruzado entre a crescente pressão para que verbas do Tesouro sejam usados para amenizar a crise e a resistência do ministro da Economia que sugere recursos de outras fontes, o  presidente chegou a criticar medidas tomadas por governadores por causa do vírus pelo prejuízo à economia.

Com Paulo Guedes amenizando seu discurso e dizendo que vai injetar R$ 147 bilhões na economia para combater a enfermidade, Bolsonaro passou a defender um voucher para trabalhadores em situação de vulnerabilidade.

Teto dos gastos sob questionamento

Como antecipou o Extra Classe, a crise do Covit-19 está colocando no debate “uma semente para o debate sobre a vulnerabilidade dos cidadãos”.

Na última semana, por exemplo, ex-ministros da Saúde das mais variadas matizes ideológicas defenderam a revogação do teto de gastos. Ao cobrar maiores recursos para a saúde, em meio à pandemia, os ex-titulares disseram que apesar do atual ministro estar agindo com critérios técnicos, as intervenções estão sendo prejudicadas com a restrição de recursos imposta em 2016 pelo governo Temer na Emenda Constitucional do Teto dos Gastos Públicos que ficou conhecida na época como a PEC da Morte.

Engana-se, no entanto quem considera que o combate à política que limita os investimentos públicos por 20 anos aos valores gastos no ano anterior é uma pauta limitada à esquerda e centro-esquerda.

Pesquisadora sênior do Peterson Institute for International Economics (PIIE), a economista Monica de Bolle, disse em recente entrevista à agência Pública ser a favor de uma revisão do teto de gastos aprovado no governo Temer. “Quem diz que não pode mexer no teto de gastos fala isso sem embasamento econômico algum, mas essencialmente, com embasamento ideológico. Quem diz que o governo não pode gastar, fala isso puramente com o embasamento ideológico. De novo, não estou falando de gastar loucamente. Vamos olhar nossas restrições e ver o que podemos fazer”, disse.

Principal artífice da vitória da proposição de Temer, Rodrigo Maia (DEM-RJ) também parece acusar o golpe. Ao rebater críticas que Bolsonaro fez às “medidas duras” que governadores adotaram no combate à Covid-19, o presidente da Câmara dos Deputados disse: “Precisamos priorizar as vidas”. Maia ainda foi mais longe ao dar entender que os quase R$ 150 bilhões prometidos por Guedes para o atenuar a pandemia são um pequeno passo. “Não adianta achar que, mantendo a meta fiscal deste ano, manter os gastos limitados deste ano, com pouco recurso de despesa de investimento, é uma sinalização correta. Os investidores sabem que a solução de qualquer país nessa crise passa pela colocação de recursos públicos. Não tem outra saída”, argumenta.

Maia tem dado mostras da sua preocupação e recebeu os presidentes da CUT, Sérgio Nobre, e da Força Sindical, Miguel Torres. Os dirigentes sindicais foram propor a criação de um fundo emergencial de R$ 75 bilhões para ser destinado trabalhadores mais vulneráveis, sobretudo os informais, ao longo de três meses, tempo estimado para a crise do coronavírus.

Na última segunda-feira, 16, o PT encaminhou ao STF um pedido de suspensão dos efeitos de parte da emenda do teto dos gastos. O motivo é exatamente a rápida propagação do coronavírus. O partido registrou que, apenas em 2019, o valor aplicado para política de saúde pública foi cerca de R$ 9 bilhões menor do que seria sem a limitação definida pela emenda.

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